Título: Atuação da PF divide juristas e intelectuais
Autor: Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 28/05/2007, Política, p. A9

Alvo de críticas contundentes após as operações Navalha e Furacão - ataques foram proferidos por magistrados, advogados, parlamentares e até o presidente Luiz Inácio Lula da Silva admitiu a existência de excessos - a ação da Polícia Federal divide as opiniões de juristas e cientistas políticos. Há consenso sobre a necessidade de se dar combate à corrupção, mas uns acham que houve, em ambas as operações, exageros que colocaram em risco o 'Estado de Direito' e outros, que há medo daqueles 'que se achavam imunes às leis do país'.

Para o jurista Dalmo Dallari, todas as ações da PF, nos dois casos, transcorreram dentro da legalidade. "Não houve prisões arbitrárias. Em todos os mandados, ou existiam provas ou fortes indícios de irresponsabilidades e ilícitos cometidos", defendeu o jurista. Dallari lembra que os mandados foram autorizados por uma ministra do STJ, Eliana Calmon, a quem cabe conduzir as investigações.

Para ele, o Brasil está diante de pessoas "que se sentiam privilegiadas, integrantes de uma aristocracia imune à lei". Acrescenta que em todas as esferas policiais, é comum prisões com base apenas em indícios, sem provas concretas. "Quando fazem isso com pessoas pobres, não vemos vozes afirmando que são atos ilegais", reforçou o jurista. Dallari disse que esses "privilegiados" - políticos e magistrados - aproveitam-se da proximidade com a imprensa para desqualificar o trabalho da PF.

O jurista Celso Antônio Bandeira de Melo discorda e acha que, além de excessos, houve intenção deliberada da PF ao vazar informações, pré-julgando pessoas contra as quais havia apenas indícios. "Não há ninguém no país que não queira punição para aqueles que agem mal. Não é essa a questão. Mas não podemos colocar em risco o Estado de Direito", reclama.

Para Bandeira de Melo, o presidente jamais colocaria em dúvida uma ação da PF, instituição que está sob o comando de um ministro de seu governo, se não tivesse a certeza de que houve abusos. "Deve haver mais informações, repassadas ao presidente, que não chegaram a nós", diz. Melo tem o cuidado de afirmar que não acompanha de perto o caso, baseando-se com mais precisão nas informações de jornais.

O jurista não acredita, contudo, que esteja havendo partidarização da PF. Tarso Genro, tanto quanto Marcio Thomaz Bastos, na visão de Bandeira de Melo, são advogados renomados com ampla bagagem intelectual. "É natural que os adversários do governo queiram envolver o ministro nessas acusações. Não esqueçamos que o próprio Marcio Thomaz, diversas vezes, foi acusado de ser "advogado do presidente".

O assunto é controverso não apenas entre os juristas, mas também dentre os estudiosos do cenário político nacional. O cientista político e historiador da Universidade de Brasília (UnB), Octaciano Nogueira, não tem dúvidas ao criticar a PF. "Seu papel é investigar e, se tiver indícios ou provas, prender as pessoas. Eles não podem vazar informações antes que estas cheguem ao Judiciário".

Nogueira compara a PF a outras polícias internacionais, como, por exemplo, a Scotland Yard. "Você não vê o vazamento de informações sigilosas à imprensa na Inglaterra ou nos EUA", compara. Ele considerou um absurdo a "insinuação" de que o vice-presidente do STF, Gilmar Mendes, tenha recebido presentes da Gautama, sem a análise prévia quanto à possibilidade de ser um homônimo. "O ministro foi criticado por conceder habeas corpus para quatro detidos na operação. Ele examinou 17 processos, o que significa que indeferiu 13", afirma Nogueira.

Seu colega de UnB, David Fleischer, enxerga nos ataques à PF o medo daqueles "que temem que a navalha possa cortar mais fundo do que já cortou até o momento". Fleischer desafia aqueles que acusam a PF de exorbitar a lei: "A ministra Eliana Calmon autorizou todas as prisões. Àquela que achou desnecessária (do governador Jackson Lago) ela negou o mandado", reforça o analista. "O grande temor é o desconhecimento se existe ou não uma Navalha 2".