Título: Agricultor quer subsídio por produto nos EUA
Autor: Landim, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 18/06/2007, Brasil, p. A7

O setor agrícola brasileiro fez as contas e está demandando que os Estados Unidos estabeleçam um teto máximo para o apoio que concedem por produto durante as negociações da Rodada Doha, da Organização Mundial de Comércio (OMC). A sugestão do Brasil é que o limite seja de 10% do valor da produção. Os exportadores agrícolas nacionais acreditam que esse teto evitará que os subsídios americanos distorçam os preços internacionais e reduzirá o número de contenciosos na OMC.

Conforme cálculos do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone), os EUA deveriam limitar os subsídios anuais concedidos aos agricultores a US$ 2,08 bilhões para o milho, US$ 1,52 bilhão para a soja, US$ 640 milhões para o trigo, US$ 510 milhões para o algodão e US$ 130 milhões para o arroz.

Caso fossem aceitos como parâmetros na Rodada Doha, esses valores significariam cortes profundos nos subsídios que os americanos já chegaram a oferecer aos seus produtores. Em comparação com períodos de queda dos preços das commodities, quando o montante de subsídios agrícolas aumenta, esses limites representam cortes entre 49% e 88% no apoio doméstico dos Estados Unidos por produto.

Os produtores de arroz e algodão americanos seriam os mais prejudicados pela proposta brasileira. Entre 2000 e 2002, época de preços ruins para essas commodities, os Estados Unidos deram por ano US$ 2,67 bilhões e US$ 1,1 bilhão, respectivamente, aos seus agricultores para compensar a perda de renda.

Cinthia Cabral da Costa, pesquisadora-sênior do Icone e autora do estudo, explica que o subsídio do governo americano evita que os agricultores do país reduzam a área plantada em tempos de preços baixos. Sem uma queda na oferta dos Estados Unidos, que é um importante produtor agrícola, o mercado mundial tem dificuldades para se ajustar e os preços caem ainda mais, prejudicando os demais exportadores, como o Brasil.

É com base nesse argumento que os países em desenvolvimento reunidos no G-20 e liderados por Brasil e Índia pedem aos Estados Unidos que reduzam o apoio doméstico aos agricultores. O G-20 propõe que os Estados Unidos limitem seus subsídios a US$ 12 bilhões, enquanto a maior potência do planeta admite um corte para US$ 17 bilhões apenas em conversas informais.

Para o Brasil, porém, não basta um corte geral do apoio doméstico americano. É preciso limitar o montante para cada produto, porque os subsídios dos Estados Unidos são muito concentrados. Cerca de 75% dos gastos do país vão para apenas cinco commodities: algodão, soja, milho, trigo e arroz. A proposta do Icone representaria uma mudança significativa na situação, pois os EUA poderiam aplicar apenas US$ 6 bilhões nesses produtos - metade do volume total de subsídios proposto pelo G-20 para o país. Os US$ 6 bilhões restantes poderiam ser utilizados com a condição de serem destinados a outras commodities.

Pelo tamanho da produção, o milho é o produto agrícola que arremata o maior volume de recursos dos cofres americanos: 31% do total. É seguido pelo algodão, com 18%, a soja e o trigo com 10% cada e, por último, o arroz, com 6%. Apesar de receber o menor volume de recursos, o arroz, cuja safra é pequena, é de longe o produto mais protegido. Os subsídios correspondem a 87% do valor da produção de arroz dos EUA. Essa relação está em 63% no caso do algodão. Para o milho e para a soja, os subsídios correspondem a 26% e 11% do valor da produção, respectivamente.

Para fazer esses cálculos, o Icone, que é financiado por associações agrícolas, baseou-se nas conclusões do painel do algodão, processo vencido pelo Brasil na OMC que condenou os subsídios dos EUA exatamente por distorcerem os preços internacionais. "Se for estabelecido um teto por produto nos valores que propomos, os painéis contra os subsídios americanos deixarão de acontecer, porque o problema estará resolvido", diz Cinthia. Depois do sucesso do Brasil, o Canadá estuda a abertura de um painel contra os EUA por conta dos subsídios do milho, enquanto os países do Mercosul pensam um processo no arroz.

Com a aproximação de um desfecho para a Rodada Doha - o prazo factível para avançar termina em 30 de julho - as discussões se tornam cada vez mais técnicas. Inicialmente, os EUA não concordavam em limitar os subsídios por produto e argumentavam que se tratava de uma interferência indevida em sua política interna. Hoje, os americanos já aceitam a idéia, mas dificilmente concordarão com os rígidos limites propostos pelo Brasil.