Título: STJ julga que 'calote' deve ser tributado
Autor: Baeta, Zínia
Fonte: Valor Econômico, 18/06/2007, Legislação & Tributos, p. E1

Em uma das primeiras decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o tema, a primeira turma da corte decidiu que mesmo em caso de inadimplência as empresas são obrigadas a recolher PIS e Cofins sobre as mercadorias vendidas. A ação julgada é da Companhia Hering, que efetuou vendas para três empresas falidas e das quais não há mais como recuperar os créditos. A decisão é um balde de água fria para diversas empresas, pois muitas têm recorrido ao Judiciário e obtido decisões em primeira instância e segunda instância favoráveis à tese do não-recolhimento.

O advogado da empresa, Celso Meira Junior, sócio e responsável pela área de contencioso tributário do escritório Martinelli Advogados, afirma que já recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) e que o recurso foi admitido. Portanto, caberá ao Supremo dar a palavra final sobre a questão. A tese da empresa é a de ofensa à capacidade contributiva. De acordo com Meira Júnior, ao deixar de receber o valor da mercadoria vendida, não há riqueza auferida e ingresso do valor no patrimônio da empresa. Por este motivo, não poderia ocorrer tributação. Ele explica que grande parte das empresas está no regime tributário de competência, ou seja, se a a venda ocorre em junho, ela deve faturar a mercadoria mesmo que receba somente no mês seguinte. Já no regime de caixa, o recolhimento das contribuições só ocorre no pagamento da venda.

Segundo o advogado, há situações que permitem a exclusão do calote da base de cálculo. É o caso do Imposto de Renda para empresas que estão no regime de lucro real. Meira Júnior afirma que a cobrança do imposto sobre o valor inadimplido só ocorre quando há a recuperação do valor em débito. Mas a empresa deve comprovar o calote por meio das medidas de cobrança que tomou.

O STJ, dentre outros pontos, entendeu que a inadimplência do comprador não equivale ao cancelamento da compra e venda, na qual há o desmanche do negócio jurídico, "denotando a ausência de receita e, conseqüente, intributabilidade da operação".

A Águas do Amazonas, empresa de água e esgoto de Manaus, é uma das que foi beneficiada por uma liminar do Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região. A empresa obteve o direito de deixar de recolher mensalmente as contribuições em relação às perdas ocorridas pela inadimplência dos consumidores - que no ano passado somaram R$ 76 milhões. O advogado que representa a empresa, Marcelo Annunziata, do Demarest e Almeida, afirma que a tese defendida pela empresa é diversa da discutida no processo da Hering. De acordo com ele, naquele processo o tribunal debateu a equiparação de venda inadimplida ao cancelamento de vendas. Discutindo-se também o conceito de faturamento da Lei nº 9.718, de 1998. "Não queremos equiparar essas situações", diz.

Segundo ele, na ação da Águas do Amazonas, debate-se o conceito de receita previsto na Constituição Federal. O advogado afirma que a Constituição estabelece que a União poderá criar contribuições sobre receita ou faturamento. Como, diz, não há receita quando ocorre inadimplência, portanto, o valor não pago pelo comprador não poderia ser tributado. Para o advogado Luiz Rogério Sawaya, do Nunes e Sawaya Advogados, a discussão é reflexo do sistema tributário brasileiro. De acordo com ele, as empresas devem recolher os tributos muito antes do recebimento dos créditos a que tem direito.