Título: BRA fecha contrato de US$ 1,4 bi com Embraer para ter jatos 195
Autor: Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 20/06/2007, Empresas, p. B1

Em uma jogada que deverá causar frisson no mercado brasileiro de aviação, a BRA Transportes Aéreos pretende anunciar, nas próximas horas, durante a feira internacional de Le Bourget, em Paris, um acordo com a Embraer para a aquisição de 40 aeronaves do modelo 195, no valor de US$ 728 milhões. Há outras 20 opções de compra que, se efetivadas como normalmente ocorre nesse tipo de transação, elevarão o valor do contrato para US$ 1,45 bilhão. Os jatos serão configurados para 118 passageiros e têm entrega prevista para começar no segundo semestre de 2008.

O Valor apurou que a operação deverá contar com financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). As aeronaves serão fabricadas na unidade de São José dos Campos. Antes mesmo da entrega dos primeiros jatos, a BRA poderá voar com dois aviões do modelo 195, o maior da Embraer, que serão contratados via leasing junto à GE Capital Services (Gecas). Esses aviões, também com 118 assentos, deverão chegar na primeira metade de 2008.

As encomendas da BRA têm potencial para causar forte impacto no mercado brasileiro de aviação, por três motivos. Primeiro, porque rompem o paradoxo de que a terceira maior fabricante mundial de aeronaves não tinha um jato sequer voando por uma companhia aérea de seu país de origem. Os únicos aviões da Embraer a voar atualmente nos céus brasileiros são os modelos 190 da panamenha Copa Airlines, utilizados na rota Cidade do Panamá-Manaus-São Paulo.

A Rio-Sul, uma das bandeiras operadas pela antiga Varig, tinha seis jatos ERJ-145, com capacidade para 50 passageiros, que foram devolvidos no fim de 2004, em meio ao agravamento da crise financeira da empresa. Eram usados em rotas regionais, sobretudo no Norte e Nordeste, e esporadicamente durante os fins de semana, na ponte aérea Congonhas-Santos Dumont. Deixados de lado, acabaram na Força Aérea Brasileira e na Polícia Federal.

No ano passado, a Embraer esteve perto de fechar negócio com a TAM, que sondava também a Airbus para substituir sua frota de Fokker-100. Esses aviões serão devolvidos até 2008, mas a fabricante européia prevaleceu na concorrência e fornecerá à TAM aviões dos modelos A319, A320 e A321. A venda de aeronaves da Embraer no país só foi viabilizada com a isenção de ICMS - que valia para as exportações da fabricante, mas incidia sobre eventuais encomendas de companhias aéreas nacionais - e uma nova linha de crédito do BNDES.

O segundo aspecto relevante da operação é que tudo indica que, com a encomenda a ser anunciada pela BRA, o mercado brasileiro realmente ganhará uma "terceira força" para competir com as líderes TAM e Gol. Juntas, elas detêm mais de 95% do mercado doméstico, se contabilizada a participação da Varig, cujo controle a Gol comprou em março. Esse desfecho para a crise da Varig foi só parcialmente comemorado pelo governo. O Palácio do Planalto, ao mesmo tempo em que tomou a compra pela Gol como uma solução definitiva para a crise da Varig, vê com ressalvas tamanha concentração do mercado em apenas duas aéreas.

Com a entrada de um grupo de investidores no capital da companhia aérea, em dezembro do ano passado, a BRA passou a ser vista como mais um concorrente de peso. A Brazil Air Partners - fundo constituído pelo Bank of America, Gávea Investimentos (do ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga), Development Capital, Goldman Sachs, HBK Investment e Millenium Americas - compraram 72% das ações preferenciais da BRA por R$ 180 milhões. A participação no controle da companhia ficou em 20% das ações com direito a voto, limite fixado pela legislação nacional.

Apesar da promessa, a companhia não se viabilizou como terceira força no setor e, em maio, detinha apenas 2,16% do mercado doméstico. Para robustecer-se, inaugurou nesta semana um acordo operacional com a OceanAir (com 0,88% de participação no mercado) que prevê uma malha integrada de vôos, com foco no atendimento de cidades médias.

A encomenda deverá assegurar à BRA uma imagem e tamanho de frota suficientes para atingir a condição de "grande" no setor. E traz ainda um terceiro aspecto relevante. Com jatos de 118 assentos - menores, portanto, que os aviões com capacidade para mais de 150 passageiros usados por TAM e Gol -, a BRA poderá oferecer ligações diretas entre cidades médias e grandes, dispensando as escalas e conexões hoje necessárias para viabilizar os vôos das concorrentes.

Rotas como Rio-Goiânia ou Belo Horizonte-Curitiba, por exemplo, dificilmente têm demanda suficiente para lotar aeronaves maiores. Por isso, para tornar-se viáveis economicamente, incluem escalas ou conexões nos chamados "hubs" (pontos de distribuição de vôos).

A intenção da BRA, até mesmo pela dificuldade em obter autorizações para pousar e decolar em aeroportos como Congonhas e Brasília, é reforçar seu projeto de interligar cidades médias para grandes - filosofia que começou no acordo com a OceanAir. Para isso, poderá contar agora com o marketing de oferecer um vôo em aeronave genuinamente nacional.