Título: Cana avança, e esmagadoras encaram falta de soja em GO
Autor: Bouças, Cibelle e Scaramuzzo, Mônica
Fonte: Valor Econômico, 27/11/2006, Agronegócios, p. B14

A instalação de usinas sucroalcooleiras e de biodiesel em Goiás trouxe ânimo novo aos produtores e começa a gerar uma corrida por terras no Estado. Endividados pela crise das safras anteriores, sojicultores reduzem progressivamente a área com a oleaginosa para apostar no plantio de cana, em uma corrida que também reúne produtores de algodão e pecuaristas.

Mas a "febre" preocupa indústrias e governo local. No lado privado, são as esmagadoras de soja que reclamam, porque estão sendo obrigadas a "importar" o grão de outros Estados; na frente pública, o temor está relacionado à diversificação de culturas.

Neste ano, a crescente demanda de soja para biodiesel e a redução de área plantada obrigaram indústrias a buscar o grão de Estados como Bahia, Mato Grosso e Tocantins. Antônio Carlos Chavaglia, presidente da Cooperativa Mista dos Produtores Rurais do Sudoeste Goiano (Comigo), diz que normalmente as esmagadoras trazem soja de outros Estados apenas no fim do ano.

"Mas, como os produtores estão muito endividados, houve um interesse em exportar boa parte da safra e vender o restante nos leilões de Pesoja [promovidos pela Conab]. Aí a oferta ficou menor", afirma.

A Granol, com uma usina de biodiesel em Itumbiara com capacidade para esmagar 3 mil toneladas de grãos por dia, opera com 50% da sua capacidade por falta de matéria-prima e, ainda assim, tem de recorrer a outros Estados. Goiás tem mais três projetos de usinas em fase de instalação - da Caramuru no município de São Simão, da Biocamp em Campos Verdes e da Binatural em Formosa.

A Caramuru informou que um terço dos grãos usados em suas processadoras de soja em São Simão e Itumbiara foram comprados em outros Estados em 2006. "Os leilões do governo deram suporte aos preços da soja no Estado, o que dificultou a compra pelas indústrias. Com os novos projetos de biodiesel, há empresas não tradicionais em óleos vegetais comprando o grão para suprir sua demanda, o que também ajudou a enxugar a oferta", diz Cesar Borges, vice-presidente da Caramuru.

Segundo a Secretaria de Agricultura de Goiás, a produção local de soja caiu 7,94% em 2005/06, para 6,018 milhões de toneladas. Do total, 2,7 milhões foram exportadas até outubro. Pedro Arantes, assessor de economia da Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg), estima que a área com soja deve cair mais 15% em 2006/07, o que equivale a 300 mil hectares.

"A cana toma parte dessa área, no sul e sudoeste de Goiás. O que preocupa é que nos municípios onde a cana entra, ela se torna monocultura", diz. Ele observa que neste ano a cana ocupou 200 mil hectares, e que a área deve saltar para 400 mil em 2007. A lavoura vem sendo plantada no sul e no sudoeste, substituindo áreas de algodão, pastagem e soja. Para Arantes, a cana empurra o algodão para a região norte do Estado, o que indiretamente também afeta a soja.

Em tradicionais cidades de soja, como Rio Verde, o temor com o avanço da cana é maior. Tanto que a prefeitura do município assinou um decreto limitando o cultivo da cana em 10% da área agricultável (ou 50 mil hectares) para evitar um rolo compressor sobre os grãos.

Para Igor Montenegro, presidente do Sindicato da Indústria de Fabricação de Álcool no Estado (Sifaeg), isso não é uma preocupação - até porque, para ele, a medida é inconstitucional, ainda que, no momento, a entidade não planeje entrar na Justiça contra a decisão da prefeitura.

Goiás está entre os Estados do Centro-Oeste que mais projetos têm para novas usinas sucroalcooleiras. Até o momento, são 12 projetos para entrar em operação até 2009, em um investimento total de quase R$ 1,5 bilhão. Goiás já conta com 15 usinas e produz quase 17 milhões de toneladas de cana.

Nesse cenário, Odilon Claro de Lima, secretário de Agricultura do Estado, está apreensivo porém confiante. "Temos que definir políticas de estímulo a todas as culturas, sem impedir o avanço da cana, que trará riqueza para o Estado".