Título: Megafusão pode criar gigante do álcool
Autor: Scaramuzzo, Mônica
Fonte: Valor Econômico, 24/11/2006, Agronegócios, p. B10

A trading Crystalsev, cujo foco está na comercialização da produção de açúcar e álcool de nove usinas paulistas e suas associadas, orquestra uma megafusão entre os oito grupos sucroalcooleiros que compõem seu bloco de acionistas. Se concretizada, a união resultará na criação de uma companhia praticamente do mesmo porte do Grupo Cosan - a maior do país no segmento, com faturamento anual da ordem de R$ 2,5 bilhões.

Os entendimentos para a fusão estão em fase de análise de estudos de viabilidade econômica. Mas o planejamento contempla, nesta primeira fase, a aliança de quatro das oito tradicionais usinas que controlam a Crystalsev: Cia. Energética Santa Elisa, de Sertãozinho (SP), Cia. Vale do Rosário, de Morro Agudo (SP), Jardest, de Jardinópolis (SP), e MB, de Morro Agudo (MB). "A operação faz todo sentido, uma vez que essas usinas estão geograficamente próximas. [A fusão] também amplia a sinergia entre essas empresas", disse ao Valor João Carlos de Figueiredo Ferraz, presidente da Crystalsev.

O executivo destacou que a união trará ganhos administrativos e financeiros. E adiantou que as outras quatro usinas - Mandu, de Maracaí (SP), Pioneiros, de Sud Mennucci (SP), Moema, de Orindiuva (SP), e Paraíso, de Brotas (SP) - seriam abraçadas em um segundo momento. Figueiredo Ferraz ressalvou que essas usinas, menores, terão autonomia para aderir ou não.

As quatro usinas já em conversações para a fusão processam, juntas, entre 14,5 milhões e 15 milhões de toneladas de cana, e têm faturamento total próximo a R$ 1,5 bilhão. Com as outras quatro, a capacidade saltaria para quase 26 milhões de toneladas, e a receita atingiria cerca de R$ 2,5 bilhões, o patamar do Cosan na temporada 2005/06. As oito sócias da Crystalsev produzem atualmente 1,7 milhão de toneladas de açúcar e cerca de 1 bilhão de litros de álcool.

Os entendimentos para a fusão caminham para a criação de uma nova empresa, de capital aberto. Mas, como explicou Figueiredo Ferraz, a Crystalsev continuaria de pé como trading. O modelo prevê que os atuais acionistas das usinas façam parte do conselho administrativo da gigante em gestação.

Parte das usinas que controlam a Crystalsev já tem acionistas comuns. A Santa Elisa, por exemplo, tem participação na MB, na Vertente e na São Geraldo (desativada). A Vale do Rosário também é acionista da MB e tem 53% de participação na Jardest. O histórico pode, portanto, agilizar o andamento das negociações. Mas laços antigos também podem emperrar o processo.

No ano passado, o empresário Maurílio Biagi Filho desvinculou-se da Cia. Energética Santa Elisa após um acerto com seus sete irmãos. Biagi vendeu sua participação acionária na Santa Elisa, que passou a ser presidida por seu irmão, André Biagi. Com o acerto fechado, Biagi Filho assumiu a presidência da Moema. O empresário também mantém participação na MB e, neste ano, vendeu sua parte acionária da usina Cevasa, de Patrocínio Paulista (SP), para a multinacional americana Cargill.

Com as negociações para a fusão em andamento, Biagi Filho e sua família voltariam a se aproximar profissionalmente, já que Santa Elisa e MB estão entre as quatro já em negociações avançada. Se tudo correr como Figueredo Ferraz espera, Maurílio e André poderão sentar lado a lado no conselho de administração da nova empresa.

Segundo Biagi Filho, a idéia de fundir as usinas sócias da Crystalsev é antiga. "Essa idéia começou a ser cogitada há muito tempo. Toda fusão é fruto da conveniência", disse Biagi, um dos fundadores da trading. O empresário diz que a usina Moema não está negociando sua adesão à nova gigante na atual fase do processo, mas não descarta essa possibilidade no futuro. "O sapo não pula por boniteza, mas por necessidade", diz. Para ele, a fusão, se concretizada, "irá somar".

Os controladores da Crystalsev estão construindo seis novas unidades produtoras na região centro-sul do país atualmente, o que também é considerado um estímulo à fusão. Fundada em 1978, a trading fatura cerca de US$ 100 milhões e, além de comercializar açúcar e álcool no exterior, já investe em uma usina de açúcar e álcool, que será construída em Santa Vitória, em Minas Gerais, com aporte de R$ 110 milhões (somente na parte industrial). Esse investimento marcará sua entrada na produção direta sucroalcooleira. A nova unidade terá capacidade para processar cerca de 2 milhões de toneladas de cana e começa a operar a partir de 2008.

Se concretizada a aliança, a Crystalsev também ganhará mais escala para negociar no mercado externo, segundo Figueiredo Ferraz. A trading é parceira da Cargill desde 1998, e está construindo com a multinacional americana uma refinaria de açúcar na Síria - também em sociedade com produtores locais. As parceiras já contam, ainda, com uma usina de desidratação de álcool em operação em El Salvador, por meio da qual exportam etanol para os EUA.

Pulverizado e com quase 350 usinas sucroalcooleiras espalhadas pelo país, o segmento sucroalcooleiro assiste a um gradual processo de concentração desde 2000, puxado justamente pelo apetite do Cosan por aquisições. Hoje com 17 usinas, o grupo tornou-se referência no mercado. Com capital aberto desde novembro de 2005, suas ações se valorizaram 139,38% desde a estréia na Bovespa. Presidido pelo empresário Rubens Ometto Silveira Mello, o Cosan foi criado em 1986 a partir das usinas Costa Pinto e Santa Bárbara, que juntas moíam aproximadamente 4,3 milhões de toneladas. Atualmente a gigante tem capacidade para 40 milhões de toneladas.