Título: Microsoft reage a piratas com Xbox
Autor: Rosa, João Luiz
Fonte: Valor Econômico, 10/11/2006, Empresas, p. B1

Imagine se nenhuma distribuidora de Hollywood estivesse no Brasil e os únicos filmes disponíveis fossem os trazidos diretamente pelo dono da sala de exibição ou, pior, as cópias piratas dos títulos de maior sucesso. É esta, praticamente, a situação vivida no país por uma indústria que mundialmente já movimenta mais dinheiro que o cinema: os videogames.

Existem pelo menos 1,2 milhão de consoles em funcionamento no Brasil, mas nenhum deles foi trazido pelo dono da marca. Toda a base foi importada por intermediários, nem sempre dentro da lei. Agora, no entanto, a Microsoft quer mudar esse quadro. Em 1º de dezembro, chega às lojas o Xbox 360, o video game de última geração da companhia. Trata-se da primeira entre as três grandes do setor a trazer o aparelho ao país. A Nintendo já chegou a produzir consoles no Brasil, numa parceria com a Gradiente, mas rompeu a aliança e partiu há quase quatro anos. A Sony nunca vendeu seus equipamentos no país.

"O que dificulta o modelo de negócio é a pirataria e a concorrência desleal de quem não paga todos os impostos", diz Milton Beck, diretor da divisão de jogos e entretenimento da Microsoft no Brasil.

A pirataria é uma velha conhecida do mercado de software. No ano passado, de cada 100 programas vendidos no mundo, 34 eram ilegais, o que ocasionou à indústria um prejuízo de US$ 34 bilhões, segundo pesquisa da Business Software Alliance (BSA), uma associação da indústria, e da consultoria IDC. O Brasil aparece em oitavo lugar entre os mercados com maiores perdas - US$ 766 milhões. Aqui, a pirataria respondeu por 64 em cada 100 programas.

O contrabando é o outro vilão. Sem a supervisão dos fabricantes, o varejo compra os produtos diretamente de distribuidores no exterior, com "várias tonalidades entre o legal e o ilegal", diz Beck. "Para fazer com que os produtos cheguem a preços mais acessíveis, existe desde a subavaliação da mercadoria até o contrabando puro."

O pano de fundo dessa história é a carga tributária. Juntando o IPI, o ICMS, o Imposto sobre Importação e o PIS/Cofins, os videogames desembarcam com um peso extra de 114%. Os preços ficam proibitivos para a maioria da população.

Na Microsoft, a orientação é superar essa barreira sem choramingar. "Imposto não se discute, paga-se", diz Beck. Na indústria, porém, as reclamações sobre a carga tributária são comuns e sua redução, uma reivindicação básica. É uma situação parecida com a do setor de computadores, que durante anos defendeu a redução de impostos, sem sucesso. Nos últimos 12 meses, com a isenção de tributos como PIS e Cofins e o dólar estável, o preço médio dos PCs caiu 17% e as vendas explodiram: foram 3,6 milhões de máquinas vendidas no primeiro semestre, 43% acima do movimento em 2005, segundo a consultoria IT Data.

Sem esse benefício nos videogames, a Microsoft está lançando o Xbox 360 a R$ 2.999 em um pacote que inclui o console e três jogos. Os games avulsos sairão por R$ 159. "Foi o máximo que conseguimos", diz Beck. Mesmo assim, a empresa sabe que o preço é alto e, por isso, está direcionando as vendas ao consumidor mais abastado. Para comparar, na Amazon o público americano pode comprar o aparelho por preços entre R$ 642 e R$ 856, em valores convertidos pelo dólar de ontem.

Não será fácil para a Microsoft convencer o usuário de que vale a pena pagar mais para obter vantagens como manual em português, garantia e assistência técnica. O que está em jogo é a cultura, já cristalizada, de que a propriedade intelectual vale pouco e não precisa ser remunerada, o que fere uma das bases da indústria de jogos.

Enquanto o custo de produção dos consoles cai, o de desenvolvimento dos softwares dá saltos sucessivos. "A produção dos games mais sofisticados já chegam a US$ 50 milhões", diz Beck.

É um negócio arriscado, mas potencialmente lucrativo. Em 2005, no lançamento do jogo Halo 2 para Xbox foram vendidas 2,9 milhões de unidades do game, o equivalente a US$ 150 milhões em um único dia. E isso só nos Estados Unidos e no Canadá.

No Brasil, o cenário é mais modesto, mas a Microsoft está confiante: mesmo sem vender oficialmente um único console no país até agora, o Brasil já é o oitavo do mundo entre os que mais acessam o site do Xbox.