Título: Indústria argentina quer corte de energia para as residências
Autor: Rocha, Janes
Fonte: Valor Econômico, 27/06/2007, Internacional, p. A11

A indústria argentina protesta contra os cortes no fornecimento de energia elétrica e gás impostos pelo governo e quer que consumidores residenciais e órgãos públicos também reduzam seu consumo, o que aliviaria a situação da produção. Mas já há sinais de que cortes estão atingindo residências, o que o governo vinha evitando.

Segundo relatou ontem o jornal "La Nación", estão ocorrendo apagões quase todos os dias em favelas e em condomínios nas cercanias da capital, Buenos Aires. Amalia Aima, presidente da comunidade da Villa 31, uma das mil favelas da periferia da cidade, contou ao jornal que todos os dias, tanto pela manhã quanto à noite, falta energia. Nâo se sabe se os cortes são programados ou incidentais.

Além do escuro, os moradores não conseguem ligar aparelhos de calefação elétricos. A situação é dramática pois, por viverem em áreas ocupadas irregularmente, ele não fazem parte da rede de gás encanado usado para aquecer água e a maioria das casas, edifícios públicos e privados da cidade. Com o frio rigoroso, os favelados dependem de aquecedores elétricos. A conta da energia é paga pelo governo, via programas sociais.

"Há cortes todos os dias, às vezes duram o dia inteiro porque um cabo ficou avariado, ou dois a três dias quando explode um transformador", relatou Amalia Aima. "Este ano está pior que nunca, porque há mais casas e mais estufas elétricas", contou Irma Alvarez, líder da comunidade da favela de Cidade Oculta, uma das maiores.

Também a classe mais abastada está sofrendo os efeitos da crise energética. Os cortes de luz que estão atingindo os que aqui se chamam "countries", condomínios fechados afastados do centro da cidade. No condomínio Los Cardales Country Club, os administradores relataram ao "La Nación" que na semana passada a distribuidora de energia da área limitou seu consumo máximo a 303 KW, metade do que usam normalmente e, como não foi atendida, começaram os cortes nas instalações comuns.

Os condomínios fechados, assim como as empresas, são considerados grandes usuários, sobre os quais recaiu todo o esforço de economia de energia. A Argentina sofre as consequências do pouco investimento na produção das várias fontes de energia (gás, eletricidade, diesel) ao mesmo tempo em que ocorreu enorme crescimento da demanda devido à expansão da atividade econômica do país nos últimos cinco anos. Neste início de inverno rigoroso e seco, a situação está agravada pela falta de chuvas nas regiões das hidrelétricas.

Com o restrito fornecimento de eletricidade, indústrias dos setores automotivo, siderúrgico, autopeças, plástico e alumínio já ameaçam demitir devido à queda forçada da produção. O fornecimento de gás estaria se normalizando esta semana, mas o de energia elétrica está racionado pelo Comitê de Emergência montado pelo governo, do qual fazem parte a Cammesa, administradora do mercado atacadista de energia, a Secretaria de Energia ligada ao Ministério do Planejamento e os operadores (geradores e distribuidores).

O Comitê encarregou as distribuidoras de fiscalizar se os grandes usuários estão cumprindo a meta de economia de energia determinada pelo governo, que atinge 1,2 mil MW no total. Diariamente, esses usuários têm de reduzir o uso de energia elétrica, entre as 16h e meia-noite, ao nível médio de demanda em igual período de 2005. O que passar do limite é multado com até 40 vezes o valor normal da energia. Mas nem os usuários que pagam mais para não terem o fornecimento interrompido estão escaparam dos cortes.

"O governo tem de transmitir à sociedade que há um problema e, como todo mundo consome energia, que os sacrifícios não recaiam só sobre nós", disse Carlos Bertone, da União Industrial de Santa Fé.