Título: O risco é perenizarem-se as políticas de proteção
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 25/06/2007, Opinião, p. A12

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, em entrevista ao Valor: "Eu sou defensor de que o Estado tem que ter uma política industrial, diferentemente do que se pensou durante muito tempo no Brasil. Sou defensor da idéia de que precisamos detectar quais os setores em que precisamos investir mais". E citou como parte dos planos do governo "ter uma política especial para incentivar a criação de siderúrgicas", assim como manifestou o desejo de elaborar uma política especial para a indústria de papel e celulose. "O Brasil será imbatível no setor de papel e celulose", disse.

Sobre a siderurgia, informou que está conversando com os empresários porque não se conforma com o fato de o país ser um exportador de minérios. "Há 20 anos não inauguramos um alto-forno no país e ficamos só olhando a China crescer. Então, tenho conversado com os empresários, para que a gente volte a fazer siderúrgica, porque não é possível que o Brasil seja apenas exportador de minério.

Lula mostrou, na mesma entrevista, ter plena consciência de que o uso de instrumentos de política industrial - como a concessão de benefícios fiscais, crédito a juros subsidiados pelo Tesouro Nacional ou proteção contra a competição internacional - precisa obedecer a uma avaliação muito criteriosa e transparente. A iniciativa do governo nessa área não deve ser confundida com a instalação de um " pronto-socorro" que produza uma sangria de recursos públicos para salvar empresas obsoletas; nem deve ser uma proteção ao empresário, em detrimento do consumidor .

O presidente rejeita a linha de pensamento que aconselha a concentração de recursos e esforços na especialização da economia, baseada nos segmentos onde o país é naturalmente competitivo. "Nós temos que competir em tudo. Posso até perder competitividade, mas tenho que disputar." E os setores que foram beneficiados com as últimas medidas de seu governo, como o de calçados, têxtil e o moveleiro, segundo ele, já provaram que são competitivos. "Agora, para competir, nós temos que ter regras claras. Por isso nós aumentamos a tarifa de importação para 35%, que é o máximo permitido pela Organização Mundial do Comércio, e, se não resolver, nós vamos ter que pensar em outras coisas para ajudar".

Estes são os três segmentos da indústria que estão se ressentindo mais da valorização da taxa de câmbio, e as medidas de incentivo foram adotadas como mecanismo de compensação, até que passem por uma modernização tecnológica suficiente para reestabelecer a competitividade. "Obviamente, o governo não vai ficar colocando dinheiro para a empresa continuar do mesmo jeito. Ou ela compatibiliza esse financiamento com a inovação tecnológica, ou, aí, sim, você comete o erro de investir em coisas obsoletas", explicou. "Não vamos financiar a improdutividade", sublinhou, corretamente.

Mas ao governo cabe, ainda, estar atento aos incentivos ou mecanismos de proteção à concorrência internacional, que, lançados para corrigir distorções de mercado em momento específico, acabam por se perpetuar. A razão de sua permanência acaba sendo tão somente a força do lobby setorial.

Exemplo disso é o imposto de importação com a alíquota máxima de 35% (teto permitido pela OMC) que incide sobre as importações de veículos automotores. Em 1990, quando presidente da República, Fernando Collor estabeleceu um cronograma gradual de redução da tarifa de importação de automóveis, que cairia de 80%, à época, para 20%. No meio do caminho, a vigência da alíquota mínima foi antecipada para, com as importações, suprir-se uma demanda que estava muito aquecida. Em seguida, a tarifa foi elevada a 70%, porque o país passou a exibir déficits comerciais crescentes. Em 1996, o então presidente Fernando Henrique Cardoso fixou um novo cronograma de redução, pelo qual a alíquota chegaria a 35%, em 1999. Hoje, as condições de mercado são totalmente distintas do passado. Já há filas de clientes nas concessionárias, mas não se cogita da possibilidade de redução da alíquota de importação.