Título: Presidente do Conselho de Ética devolve ação ao comando de Renan
Autor: Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 03/07/2007, Política, p. A9

O processo por quebra de decoro contra o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), voltou ontem à estaca zero e poderá ser arquivado pela Mesa Diretora da Casa sem sequer ter um relatório votado pelo Conselho de Ética. Apoiado em parecer da consultoria jurídica do Senado, que apontou erros no processo contra Renan, o presidente do Conselho, senador Leomar Quintanilha (PMDB-TO), devolveu ontem à Mesa a representação feita pelo PSOL. A decisão, agora, está nas mãos da cúpula dirigente do Senado, com Renan à frente, que decidirá pela manutenção ou não do próprio processo de cassação.

Foi mais um capítulo da controvérsia jurídica em que se transformou a suspeita de envolvimento do senador Renan Calheiros com a construtora Mendes Júnior. O parecer da consultoria jurídica do Senado, solicitado por Quintanilha na última quinta feira, apontou dois supostos vícios no processo. O primeiro deles é que a Mesa deveria ter examinado a representação feita pelo PSOL antes de ela ser encaminhada diretamente ao Conselho de Ética. Na época, para passar uma imagem de celeridade e transparência, Renan resolveu despachar pessoalmente o pedido de investigação ao Conselho, sem a análise dos demais integrantes da Mesa.

O segundo vício que teria sido cometido foi um pedido de perícia à Polícia Federal das notas fiscais apresentadas por Renan para justificar os recursos obtidos com a venda de gado. Segundo a assessoria jurídica do Senado, o Conselho não tem poderes para solicitar perícias externas - isso só poderia ter sido feito pela Mesa Diretora ou por uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI).

Quintanilha divulgou nota no início da noite de ontem justificando a devolução da representação à Mesa do Senado. Alegou que o intuito foi "preservar a imagem do Senado e a correção dos procedimentos do seu Conselho de Ética". Segundo o pemedebista, era importante "levar em conta as manifestações sobre a existência de vícios processuais na representação , o que tornaria passível de nulidade qualquer decisão a seu respeito".

O líder do governo na Casa, senador Romero Jucá (PMDB-RR), estava na presidência junto com Renan quando chegou o documento de Quintanilha. Ambos, contudo, já sabiam o seu teor desde sexta, quando o parecer havia sido entregue ao presidente do Conselho de Ética.

Renan afirmou que não se pronunciaria sobre o caso, deixando para Jucá a defesa da decisão. "É uma questão de legalidade. Se existem de fato erros no processo, eles precisam ser saneados. Não podemos compactuar com erros regimentais", justificou o líder governista. Para Jucá, o Senado não está diante de uma medida protelatória. "Protelações são atos praticados sem justificativa. O que estamos querendo é corrigir erros existentes no processo".

A oposição foi dura com a decisão. Antes cauteloso nas palavras, o líder do Democratas no Senado, José Agripino (RN), classificou a decisão de Quintanilha de monocrática e truculenta e de armadilha jurídica para salvar Renan. Para ele, não existem justificativas para que o Conselho de Ética não se pronuncie sobre o caso. Pior: "Entregou nas mãos do investigado a decisão se o processo continua ou não", completou.

Agripino desmontou os dois argumentos apontados como vícios processuais. Lembrou que a decisão de despachar diretamente o processo ao Conselho de Ética, sem análise prévia pela Mesa, foi tomada pelo próprio Renan e elogiada pelos aliados governistas em plenário. "Me recordo da líder do PT no Senado, Ideli Salvatti (SC) enaltecendo a coragem de Renan ao dar celeridade ao processo". O segundo argumento, de que o Conselho não poderia ter pedido perícia à PF, também é contraposto pelo Democrata. "O Conselho solicitou a perícia. Aliás, foi o próprio Renan, que por intermédio de Jucá, avisou que preferia uma perícia isenta da PF para provar sua inocência", completou Agripino.

A reunião da Mesa Diretora do Senado para analisar o caso Renan não estava marcada até as 20 horas da noite de ontem. Vários caminhos podem ser trilhados pelo processo . O mais radical seria o arquivamento. Nesse caso, o PSOL poderia protocolar uma nova representação e tudo reiniciar do ponto zero. Em uma hipótese mais remota, a Mesa pode "convalidar os erros apresentados" e remeter novamente o processo ao Conselho de Ética. Entre um extremo e outro, um leque de opções: pode ser nomeado um relator dentre os integrantes da Mesa ou algum senador pedir vistas, atrasando a conclusão do inquérito. "Uma coisa é erro, outra é estratégia. O jogo está reaberto", confirmou um assessor.