Título: Acordo de exclusividade gera polêmica
Autor: Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 12/07/2007, Brasil, p. A3

A disputa para construção das usinas do Rio Madeira promete momentos de tensão até outubro. Depois da reclamação da Camargo Corrêa contra o contrato de exclusividade para fornecimento de equipamentos nacionais para o consórcio Odebrecht-Furnas, ontem foi a vez do grupo Suez protestar. Victor-Frank Paranhos, diretor da Suez Energy International, disse que poderá comprar equipamentos na Rússia e China se após o leilão continuar valendo o acordo de exclusividade entre fabricantes de equipamentos e o consórcio Furnas-Odebrecht.

O acordo de exclusividade foi confirmado pelo presidente da Alstom e ex-presidente da Eletrobrás Aloísio Vasconcellos, que listou como integrantes do consórcio liderado pela Odebrecht a Voith-Siemens, Va Tech, Areva e ABB, além da Alstom. Procuradas pelo Valor, assessores dessas companhias informaram que seus porta-vozes não estavam disponíveis.

"Um grupo de empresas assinou um protocolo para trabalhar em conjunto para buscar a melhor oferta e preço para o leilão do Madeira por causa da luta pela modicidade tarifária", disse. "Foi um esforço conjunto lá atrás em 2005 para vencer a grandiosidade do projeto em um momento em que ninguém acreditava nele."

Interessado potencial nos equipamentos nacionais, o diretor da Suez avalia que qualquer exclusividade pode ser válida só até antes do leilão. "É assim em qualquer país do mundo", enfatizou. Depois dele, caso a Odebrecht não vença, o executivo da Suez não vê "lógica econômica" na manutenção de um contrato que pode gerar empregos na China e na Rússia, mesmo com o Brasil tendo capacitação para fornecer esses equipamentos. Ademais, disse duvidar que qualquer acordo firmado por uma subsidiária tenha mais valor que outro fechado com a holding, indicando que a Suez vai procurar os fabricantes na Europa. De qualquer modo, Paranhos disse que a Suez usará dados de seu cadastro de fornecedores para calcular preços de equipamentos para calcular os custos da construção antes de participar do leilão.

A percepção de Paranhos é que se a exclusividade dos fabricantes continuar vigorando mesmo depois do leilão, o governo adotará alguma medida. "Tenho certeza que o governo acaba com a tarifa de importação. Porque senão acaba o mercado. É contra a lógica econômica e o governo não vai ficar refém disso", disse Paranhos, que esteve na segunda-feira em Brasília com a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Vasconcellos, da Alstom, diz que nem todos os fabricantes nacionais estão com eles no consórcio. E citou a GE, a argentina Impsa, a brasileira Bardella e a Weg.

Ao detalhar os planos da Suez para o Madeira, Paranhos disse que o grupo tem intenção de disputar sozinha a usina de Santo Antonio. Se perder, tem interesse em Jirau, que será leiloada em 2008. Mas não cogita construir as duas porque seria um risco muito grande construir dois projetos dessa magnitude no mesmo rio.

O executivo da Suez explicou que não há tempo hábil para formar um consórcio a essa altura. Daí a decisão de entrar no leilão sozinho. Isso não significa que a Suez não tenha interesse de conversar com fornecedores de equipamentos e obras civis antes do leilão. Se ganhar, o Suez espera ter como sócios estratégicos a Eletrobrás e o BNDES , estando aberto à adesão de outros acionistas como fundos de pensão. "Não abrimos mão do BNDES. O governo é um sócio estratégico que interessa e agrega", disse Paranhos. E em um terceiro momento, o grupo fará uma oferta pública das ações da companhia de propósito específico que já está em processo de registro.

A construtora Odebrecht rechaçou ontem as acusações de falta de transparência de seus parceiros no consórcio que disputará o leilão da usina de Santo Antônio. De acordo com a empreiteira, não há como desenvolver projetos como os empreendimentos do Rio Madeira sem o "engajamento" de fabricantes de equipamentos - no caso, de turbinas bulbo, que serão usadas nas hidrelétricas do complexo.

Nota divulgada pela Odebrecht afirma que, nos estudos feitos pela construtora, foram identificadas pelo menos 14 empresas brasileiras e estrangeiras aptas a fabricar esse tipo de turbina. Por haver troca de informações tecnológicas e estratégicas, muitas envolvendo segredos industriais, segundo a Odebrecht, é praxe firmar "acordos de confiabilidade e exclusividade".

Empresários interessados no investimento disseram ontem que as exigências do Ibama feitas na licença prévia ao projeto das usinas do Madeira são realistas. Cada empresa ainda vai analisar com mais detalhamento as exigências, mas a primeira conclusão é de que não há nenhum ponto que mereça preocupação especial. "As condicionantes abordaram o que já era esperado por quem estava acompanhando o projeto", disse Ralph Lima Terra, vice-presidente da Associação Brasileira da Infra-estrutura e Indústria de Base (Abdib). O único problema identificado até agora está na falta de mão-de-obra qualificada para atuar em projetos ambientais, devido ao longo tempo sem serem tocados empreendimentos desse porte no país. "Há muitos anos não temos uma obra como essa", diz ele. (Colaboraram Daniel Rittner, de Brasília, e Samantha Maia, de São Paulo )