Título: Investidor demanda ativos de maior risco
Autor: Velloso, Thiago
Fonte: Valor Econômico, 31/07/2007, Caderno Especial, p. F4

Enquanto o Banco Central (BC) testa o comportamento dos indicadores econômicos a partir do estabelecimento de uma taxa básica de juros historicamente baixa, os investidores dos planos de previdência também experimentam terreno novo: o dos investimentos mais arriscados, com alocação de recursos que privilegia os ativos da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa).

A principal razão do fenômeno, segundo os especialistas, é justamente a trajetória de política monetária do BC, de contínuos cortes na Selic, que seguem a cadência constante da inflação. Com a redução da taxa, os títulos de renda fixa do Tesouro Nacional têm oferecido rendimento cada vez menor, praticamente obrigando aplicadores a tomarem mais risco e buscarem os fundos que compram ações da bolsa.

A intensificação dessa migração entre carteiras, no entanto, já era aguardada pelas empresas do setor, que viram o mesmo movimento ocorrer em países como Chile, México e outras nações em desenvolvimento. "Lá, o principal motivo foi a queda das taxas pagas pelos título públicos. No caso do Brasil, além disso, temos um fator adicional, que é o boom experimentado pela bolsa, que também elevou o apetite do investidor por ativos de maior risco", afirma o presidente da Brasilprev, Eduardo Bom Angelo.

Para o executivo, a diversificação dos ativos, com uma preferência pela renda variável, vai deixar de ser um opção apenas para os que pretendem extrair o melhor de suas aplicações. "Uma vez que as pessoas compreendam que a taxa de juros continuará caindo, certamente a renda variável se tornará um dos grandes focos do investidor brasileiro."

Bom Angelo vê interesse crescente pelos planos mais agressivos - corroborado pelos dados da carteira da Brasilprev. No primeiro semestre, mais de 15% dos novos recursos captados foram destinados a fundos multimercados. No mesmo período do ano passado, o porcentual foi de apenas 6%.

Embora tenha havido um aumento substancial, o próprio Bom Angelo admite que a Brasilprev ainda se encontra atrás do topo da curva traçada pelo mercado, no que tange às aplicações em renda variável. Segundo ele, no primeiro semestre, 56% das novas captações feitas pelas empresas do setor foram direcionadas para as carteiras que também aplicam em renda variável. Já no primeiro semestre do ano passado, o número foi de apenas 16%. "A tendência é de um fortalecimento constante desse fenômeno. Diria que estamos no início de um movimento de evolução e sofisticação do mercado brasileiro", ressalta Bom Angelo.

Para os interessados em aposentadoria ou no resgate dos recursos em idade já avançada a transferência de recursos é ainda mais interessante, de acordo com o presidente da Bradesco Vida e Previdência, Marco Antonio Rossi. Para ele, o investimento em renda variável é um dos mais adequados ao investidor que busca acumular recursos durante sua vida produtiva para usá-los na terceira idade. No Bradesco, há dois anos, 95% dos recursos captados iam para fundos de renda fixa, sendo que hoje o porcentual já caiu para 65%.

"O investimento em bolsa é de maturação longa, assim como aplicação em um fundo de previdência tem um período de duração estendido. Também sabemos que, olhando o passado, a bolsa costuma oferecer o melhor retorno. Então, temos um encontro de objetivos quase perfeito."

Outras companhias de gestão de recursos do sistema de previdência privada, principalmente as independentes, já trabalham com um porcentual elevado de dinheiro aplicado em fundos de bolsa. É o caso da Icatu-Hartford. Em 2006, 46% das transferências entre carteiras na empresa foram para os fundos de renda fixa. Nos últimos doze meses esse número caiu para 13%.

"Por sermos uma empresa independente e com tradição nas operações de bolsa, sempre foi natural ter um elevado porcentual dos clientes com alocação em fundos de bolsa. Esse ano, porém, percebemos um fortalecimento desse movimento", diz Luiz Martinez, gerente de produtos de previdência da Icatu-Hartford. Para ele, além da queda da taxa de juros e do desempenho da bolsa, é preciso também ressaltar o maior conhecimento do investidor, que vem se aproximando e testando movimentos mais arriscados.

Hoje, também já é possível notar um número crescente de aplicadores que buscam nos planos de previdência uma alternativa rentável aos veículos mais tradicionais, como os fundos de investimento. A razão é simples: a tributação, que no sistema regressivo, oferece uma incidência do Imposto de Renda (IR) de apenas 10%, após o décimo ano.