Título: Governo prevê repercussão limitada à disputa pelo PT
Autor: Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 22/08/2007, Política, p. A9

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento dos 40 do mensalão deve ter mais repercussão sobre o PT que no governo, segundo avaliações feitas no partido e no Palácio do Planalto, onde se considera que o escândalo do "já está na conta". O que pode mudar esse quadro é a eventual exclusão do ex-ministro José Dirceu do processo. Muito embora ele diga que não está interessado em disputar poder, é dado como certo que Dirceu chegará fortalecido ao 3º Congresso Nacional do PT, a ser realizado no final do mês, em São Paulo.

Na véspera do julgamento, alguns dos principais implicados se manifestaram por meio de suas páginas na internet. José Dirceu e o ex-deputado Roberto Jefferson, autor da denúncia sobre o suposto esquema de compra de votos, criticaram duramente do Ministério Público Federal do DF, que propôs cinco ações de improbidade administrativa contra 37 dos 40 acusados de integrar o "mensalão". Segundo Dirceu, "trata-se, evidentemente, de um abuso e de uma tentativa de influenciar não só a sociedade, às vésperas do julgamento no STF". Para Roberto Jefferson, "foi uma atitude absolutamente patética, para não dizer indecente". Jefferson, no entanto, afirmou não ter "pena" do PT: "Foi ele quem criou o monstro, ao tribunalizar as questões políticas ao longo dos últimos 20 anos".

O ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, procurado por seu advogado para tratar sobre o que falar, se limitou a dizer, segundo apurou o Valor: "Eu contratei o senhor para ser meu advogado. O senhor é o meu advogado. Vai lá, fala e me defende". Os petistas, de um modo geral, ficaram irritado com declarações feitas por governadores do partido, na antevéspera do julgamento, admitindo a existência do esquema: Jaques Wagner, da Bahia, disse que as pessoas "viram que não somos (o PT) a Brastemp que imaginavam", e Marcelo Déda, de Sergipe, emendou: "É, mas também não querem voltar ao tanquinho (de lavar roupas", numa referência ao bom desempenho eleitoral do partido em 2006.

O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha disse que, se o procurado Antonio Fernando Souza está convencido de que houve "mensalão", deveria pedir a anulação de todas as leis votadas votadas pela Câmara no período. E que se o "mensalão" foi um esquema de compra de votos, como afirma o promotor, haveria uma contradição em relação a seu indiciamento: como presidente da Câmara, no período, o deputado não votava.

João Paulo também recorreu a uma citação do ex-ministro do STF Sepúlveda Pertence: "Para saber se se deve aplicar a pena, é necessário o processo, mas o processo, pelo estigma que acarreta e os constrangimentos que gera já é, em si mesmo, uma pena: assim, com o processo, começa-se por punir aquele de quem se pretende saber se merece ser punido".

Para o Planalto, a eventual exclusão de José Dirceu do processo teria a vantagem de tirar o "mensalão" das redondezas do gabinete do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas por outro lado talvez obrigue o governo a ter de reestruturar seu atual relacionamento com o PT. Hoje, com o PT fragilizado, haveria um certo "equilíbrio" nessa relação, o que pode mudar na hipótese de um fortalecimento de José Dirceu e seu grupo no partido. "Desorganiza o que está organizado", de acordo com um raciocínio vigente em áreas do governo.

No PT e no governo se avalia que, se escapar do processo, Dirceu tentará retomar as rédeas ao partido, talvez até mesmo disputando sua presidência, muito embora o ex-ministro diga que estará preocupado apenas em tratar de sua anistia política - ele teve o mandato cassado pela Câmara. E o grupo comandado pelo ex-ministro saiu na frente na eleição dos delegados ao 3º Congresso Nacional partido.

"Vou ao Congresso do PT como filiado, não voltarei a ser dirigente do PT e não sou candidato às eleições de 2010, simplesmente porque sou inelegível", descreveu Dirceu em seu site. "Mas tenho legitimidade e direito de fazer política, de ser militante do PT e de participar, porque tenho direitos políticos, apenas sou inelegível por oito anos, fruto de uma cassação sem provas".

O Planalto, de um modo geral, acredita que está sem nenhum controle sobre o ex-chefe da Casa Civil. Ele foi, por exemplo, aconselhado não fazer atividade em Brasília para o lançamento de seu sítio na internet, na primeira semana de agosto, às vésperas do julgamento pelo STF do inquérito contra os 40 acusados de organizar e operar o esquema do "mensalão". Os argumentos foram variados: se fossem todos os ministros e apenas um faltasse, o fato daria margem a especulações. Por outro lado, se não fosse nenhum, seria isso seria encarado como um sinal de desprestígio de Dirceu. Ao final, foram apenas Luiz Dulci (Secretaria Geral) e Matilde Ribeiro (Igualdade Racial), e Gilberto Carvalho, chefe de gabinete de Lula. E todos disseram que compareceram ao lançamento em caráter pessoal.