Título: Técnicos pedem objetivos no corte de emissões
Autor: Chiaretti, Daniela
Fonte: Valor Econômico, 30/08/2007, Brasil, p. A4

Cientistas e especialistas em mudanças climáticas reunidos em seminário na Câmara dos Deputados, em Brasília, repetiram que o Brasil deve adotar metas para reduzir suas emissões. A defesa alfineta a postura adotada até agora pelo governo brasileiro nas negociações internacionais e referendada pelo presidente Lula, que costuma repetir que o Brasil está fazendo a sua parte no combate ao aquecimento global. No entendimento dos técnicos, a urgência do problema não admite jogo de empurra entre as nações - todos têm que fazer muito, e rápido.

"Se o Brasil, nos últimos três anos, reduziu o desmatamento, é perfeitamente factível ter metas", apontou o físico Luiz Pinguelli Rosa, coordenador-geral do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, durante o seminário "Aquecimento Global - a responsabilidade do Poder Legislativo no estabelecimento de práticas ambientais inovadoras" promovido por várias comissões do Congresso.

"O país tem que assumir outro tipo de protagonismo nas negociações internacionais" disse o ex-deputado Fabio Feldmann. "Tem que mudar radicalmente a postura. Não é possível que mantenha a mesma posição de 15 anos atrás."

"O Brasil tem que deixar de resistir a qualquer tipo de compromisso de redução de emissões. Isso precisa mudar. Se não for feito, a perda será enorme", defendeu o pesquisador Philip Fearnside, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, o Inpa. Fearnside, uma referência nos estudos da Amazônia, lembrou que o Brasil é um dos países que mais tem a perder com o desmatamento da floresta que, se acelerado, provocará mudança no regime de chuvas, perda em áreas agricultáveis, na vazão dos rios, no potencial hidrelétrico.

Paulo Moutinho, coordenador de pesquisas do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, o Ipam, lembrou o quanto é caro conservar florestas. "Hoje se desmata, porque o valor da floresta em pé é zero. Temos que achar valor para os nossos recursos naturais." Moutinho fez um exercício rápido do quanto o valor da floresta em pé poderia representar. Tomou por base a taxa média do desmatamento da Amazônia nos últimos anos e o preço médio da tonelada de carbono no mercado internacional (US$ 5 por ton/CO2 e chegou a US$ 500 milhões por ano, num dado conservador. "Só a redução do desmatamento anunciada pelo governo daria recursos de US$ 1,5 bilhão", calcula.

"As mudanças climáticas são reais, inequívocas e estão se acelerando", reforçou o climatologista Carlos Nobre, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), apontando o risco de savanização de parte da Amazônia, a ameaça de o semi-árido se tornar cada vez mais árido e a certeza que o país enfrentará vendavais e ressacas mais fortes e frequentes. "O que precisa ficar claro é que não dá mais para reverter o quadro. Dá para mitigar." Segundo ele, as conferências internacionais falam muito de mitigação, mas pouco de adaptação dos países. As duas coisas têm que andar juntas. O Brasil não tem sequer o mapa das vulnerabilidades nacionais."

Newton Paciornik, diretor do inventário nacional de gases efeito-estufa do Ministério da Ciência e Tecnologia, adiantou que o aguardado diagnóstico das emissões brasileiras começará a ter dados preliminares divulgados até o fim do ano. O estudo, um raio-X de quanto o país emite e como, deve ser concluído em 2008/2009. Trata-se da segunda edição do inventário brasileiro de emissões - a primeira saiu em 2004. Países ricos, comprometidos com o Protocolo de Kyoto, têm que lançar um trabalho destes anualmente. O inventário é fundamental na definição de políticas públicas de combate ao aquecimento global. Paciornik não adiantou dados do trabalho, que mostrará as emissões de 1990 a 2000, e não trará, ainda, a redução do desmatamento dos últimos anos.