Título: Decisão da SDE pode atrapalhar prazos do leilão da usina do Madeira
Autor: Basile, Juliano, Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 17/09/2007, Brasil, p. A2

A decisão da Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça, de suspender as cláusulas de exclusividade entre a Odebrecht e as fornecedoras de equipamentos com as quais a empresa pretende disputar a concessão das usinas do rio Madeira, pode levar a um adiamento do leilão. A Odebrecht anunciou que vai recorrer da decisão. "Vamos exercer todas as prerrogativas legais para resguardar a legitimidade dos nossos contratos e o sigilo de informações estratégicas", disse Irineu Meireles, diretor da Odebrecht Investimentos. O governo e eventuais concorrentes elogiaram a medida.

O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, disse que a decisão da SDE possibilita maior concorrência e favorece a busca de tarifas menores na disputa, em benefício do consumidor. "A decisão torna mais atraente a formação dos consórcios, já que reduz um limitador que havia à concorrência."

A SDE determinou, na sexta-feira, a imediata anulação da cláusula da Odebrecht com a General Electric pela qual essa última não poderia oferecer proposta para a venda de equipamentos para outras empresas no leilão. E a secretaria suspendeu parcialmente as cláusulas de exclusividade da Odebrecht nos contratos com a Alstom, a VA Tech Hydro e a Voith. Pela medida, essas três empresas poderão negociar o fornecimento de equipamentos e serviços com concorrentes da Odebrecht após o leilão. Ou seja, caso a Odebrecht perca, essas três empresas estão desobrigadas de cumprir a exclusividade.

A secretária Mariana Tavares de Araújo, da SDE, explicou que o objetivo da medida preventiva foi equilibrar o interesse público no leilão, consistente em se obter um melhor preço e tarifas mais baixas aos consumidores de energia no futuro, e o interesse privado da Odebrecht de disputá-lo com contratos com fornecedores. Segundo Mariana, foi constatado um risco de fato à concorrência e, por isso, foi realizada uma "intervenção pontual" nos contratos. "Concluímos que as cláusulas inviabilizam um contrato alternativo com outras empresas", disse a secretária.

Pelo acertado com a Odebrecht, a GE não podia oferecer proposta para outras empresas. E as outras três companhias - a Alstom, a VA Tech Hydro e a Voith - estavam presas por cláusulas de exclusividade. "A medida garante à Odebrecht o direito de participar com exclusividade com essas três empresas, mas libera o consórcio vencedor para contratar com esses fornecedores de equipamentos no futuro", explicou Mariana. Segundo ela, a determinação foi adotada a tempo, para garantir a agilidade necessária à realização do leilão. "Agora, as outras empresas já sabem que podem contar com a GE."

A Odebrecht terá cinco dias para se manifestar e ainda pode recorrer contra a anulação de cláusulas de seus contratos com fornecedores de equipamentos. A SDE também abriu processo administrativo contra a empresa. Isso significa que a Odebrecht será investigada pela suposta tentativa de impedir concorrentes de participar do leilão do Madeira. Se concluir que houve a intenção de barrar a concorrência, pode pedir ao Cade a aplicação de multa contra a Odebrecht. A multa varia de 1% a 30% do faturamento da empresa.

A Odebrecht pretende insistir na tese de que as cláusulas contestadas pela SDE não cerceiam a concorrência. Para a construtora, a decisão constitui "uma sinalização negativa para o mercado", pois ela teria apenas se preparado com antecedência para o leilão de Santo Antônio, previsto para o dia 30 de outubro, e agora teria sido penalizada "injustamente". Segundo a Odebrecht, existem pelo menos 14 fornecedores, no Brasil e no exterior, dispostos a participar da construção da hidrelétrica.

A Odebrecht acredita que seus concorrentes estão de olho principalmente em uma parceria com a General Electric. As conversas iniciais para a entrada da GE no consórcio liderado pela Odebrecht não resultaram em um acordo. E a Odebrecht teme que possa ocorrer transferência de informações passadas à GE para os concorrentes.

João Canellas, diretor-executivo da Amazônia Madeira Energética (Amel), pertencente à construtora Camargo Corrêa, classificou de fundamental a decisão da SDE. "Prevaleceu o bom senso, porque é preciso dar competição ao leilão", afirmou. O executivo disse também que a construtora pretende trabalhar com GE para o fornecimento de equipamentos.

O presidente da Suez Energy e do conselho da Tractebel Energia, Maurício Bähr, avalia que a decisão da SDE é uma boa notícia. "Tudo isso vai ocasionar tarifas mais interessantes para o consumidor, gerar mais competitividade no leilão e garantir a geração de empregos no Brasil", disse o executivo. O presidente da Chesf, Dilton da Conti, disse que a decisão " vai dar mais competitividade para o leilão".

Tolmasquim acrescentou que, "em princípio", o governo deve manter, com ajustes, o limite de 20% à participação acionária de construtores e fornecedores de equipamentos nos consórcios. Esse limite deverá valer somente após a entrada do sócio estratégico - o BNDES-Par e, provavelmente, fundos de pensão de estatais. Num primeiro momento, portanto, os consórcios podem ter participação de construtoras e fornecedores superior aos 20%. (Colaboraram Cláudia Schuffner, do Rio, e Maurício Capela, de São Paulo)