Título: Datasul faz aliança com Salesforce.com
Autor: Rosa,João Luiz
Fonte: Valor Econômico, 17/09/2007, Empresas, p. B3

Paulo Caputo é uma das 7 mil pessoas que estão sendo aguardadas em San Francisco, hoje, para uma conferência da Salesforce.com, a companhia americana que se tornou um ícone do modelo de software como serviço - aquele em que os programas são usados via internet e pagos na forma de assinatura, como uma conta de água ou luz. Caputo não é, porém, o que se poderia chamar de mais um na multidão. A Datasul, na qual ele atua como diretor de novos negócios, é a primeira empresa brasileira a ingressar na incubadora tecnológica da Salesforce.com em San Mateo, na Califórnia, e a novidade será anunciada com destaque por Marc Benioff, o executivo-chefe da Salesforce.com, na abertura do encontro.

"Buscamos os avanços tecnológicos que estão ocorrendo em todas as partes do mundo e a incubadora vai nos ajudar a entender melhor a tecnologia da Salesforce.com", diz Caputo.

Com um lugar na incubadora, além do apoio da equipe de engenharia da Salesforce.com, a Datasul terá acesso às experiências das demais companhias instaladas no local e das empresas de investimento de risco que gravitam em torno do Vale do Silício, afirma Enrique Perezyera, presidente da Salesforce.com na América Latina. A incubadora foi criada há cerca de um ano e meio e hospeda entre 40 e 50 empresas de cada vez. "(Os parceiros) podem ficar o tempo que quiserem", diz Perezyera.

O primeiro alvo da parceria já foi definido: é a conclusão do trabalho de desenvolvimento de um software para gestão de frotas. O programa começou a ser criado pela Datasul antes da formalização da aliança. Agora, sua segunda e última parte será desenvolvida simultaneamente no Brasil e nos Estados Unidos. Um grupo inicial de quatro profissionais já foi enviado a San Mateo e vai funcionar em sistema de rodízio, com equipes indo e vindo da Califórnia.

Individualmente, esse tipo de parceria pode parecer um detalhe estratégico na trajetória das duas companhias, mas ganha relevância quando se toma um cenário mais amplo - o da mudança do modelo de receita que começa a ganhar força no segmento de software de negócios. É uma transformação que ameaça tanto as empresas tradicionais, que vivem de vender licenças de uso, como as de software como serviço.

A Salesforce é o melhor exemplo desse segundo grupo. Criada em 1999, a companhia conseguiu dar sucessivos saltos de vendas, posicionando-se como uma líder em seu segmento em menos de uma década. Só nos últimos três anos, a receita aumentou de US$ 176,4 milhões para US$ 497 milhões, com previsão de chegar a US$ 730 milhões no ano fiscal corrente, o de 2008. O desempenho transformou Benioff - um ex-executivo da Oracle e fundador da Salesforce.com - no paladino do software como serviço e mostrou que o modelo, do qual se falava há muito tempo, podia de fato dar dinheiro.

O desafio para a Salesforce.com, agora, é que as gigantes dos programas de gestão empresarial (ERP, na sigla em inglês) - o bloco tradicional do setor -, avança rapidamente sobre o modelo de software como serviço. A SAP apresenta na quarta-feira um produto internamente chamado de A1S, no qual planeja gastar 400 milhões de euros (US$ 553 milhões) em dois anos.

É consenso que a tarefa vai exigir dos mastodontes - que também incluem Oracle e Microsoft - jogo de cintura suficiente para evitar que o novo modelo acabe canibalizando sua fonte de receita tradicional. Ninguém duvida que esse é um grande desafio, mas muitos começam a perguntar se, do outro lado do campo, a Salesforce.com e outras novatas conseguirão resistir à pressão que está por vir e que a companhia nunca sofreu até agora.

É nesse ponto que a política de alianças da Salesforce.com ocupa um papel central em sua estratégia de crescimento. A empresa é especializada em programas que ajudam outras companhias a se relacionarem com seus clientes (CRM, na sigla em inglês). Essa especialização, no entanto, é vista como um ponto fraco por alguns rivais, que dizem que a Salesforce.com terá de agregar produtos de outras áreas se quiser concorrer em pé de igualdade com as companhias de ERP, que têm atuação mais ampla.

É isso o que a Salesforce.com está tentando fazer com o portal de internet The AppExchange. "O site funciona como o iTunes, a loja virtual de música da Apple", compara Perezyera. A empresa escolhe o programa de que precisa no portal e pode testá-lo, sem custo, durante 30 dias. Depois disso, se aprovar a escolha, faz a assinatura.

O site proporciona uma operação de baixo custo - a Salesforce.com acaba de abrir um novo site em português, mas não tem escritório próprio no Brasil -, ao mesmo tempo que expande a oferta de produtos, diz Perezyera. Hoje, o portal oferece 500 programas diferentes, feitos por outras empresas, mas sob os critérios da Salesforce.com, afirma o executivo.

Para a Datasul, a parceria abre um canal adicional de vendas, diz Caputo. A nova aliança não vai alterar os acordos existentes com outras companhias, como Microsoft, IBM e Progress, mas vai expandir o raio de atuação. A Datasul poderá vender diretamente o software de gestão de frotas no Brasil e nos outros mercados em que atua. Nas demais regiões, o site passa a ser um canal de distribuição: o cliente paga à Salesforce.com, que repassa parte da receita à Datasul.