Título: Petróleo faz país crescer acima de 20%
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Fonte: Valor Econômico, 06/11/2007, Especial, p. A16

Em Luanda falta luz dia sim, o outro também. A freqüência é tamanha que o órgão responsável pelo inacreditável trânsito da capital angolana dispõe de semáforos portáteis, movidos a bateria, para substituir os poucos fixos existentes em alguns cruzamentos da cidade nos longos períodos de apagão.

Para além da carência generalizada do país, é inegável que a estabilidade institucional conquistada com o fim da guerra civil (em 2002), a estabilidade macroeconômica que veio pouco depois e a crescente produção de petróleo, ajudada pelos preços estratosféricos do produto, estão fazendo Angola experimentar um período de crescimento econômico sem precedentes, o que faz do país um dos principais pólos de atração da África. As riquezas mais evidentes do país são o petróleo e os diamantes, mas Angola é uma das províncias minerais mais diversificadas da África.

China, Brasil e Portugal disputam o direito de serem os maiores parceiros no processo de reconstrução econômica angolano, em bases totalmente diversas da estrutura que existia quando Portugal exercia soberania sobre o país. Angola tinha uma economia eminentemente agrária, chegando a ser o 4º maior produtor mundial de café. Isso tudo foi destruído pela guerra civil.

Por enquanto, os países mais ricos do Ocidente, como Estados Unidos, Reino Unido, França e Alemanha, limitam-se às trocas comerciais e aos investimentos nas áreas de mineração, especialmente em petróleo e diamantes. Analistas e executivos ouvidos pelo Valor atribuem esse comportamento à persistência de desconfianças quanto à estabilidade política.

O petróleo, cuja produção chega este ano a 2 milhões de barris por dia (aproximadamente a mesma que o Brasil, só que de óleo de melhor qualidade), respondeu por US$ 29 bilhões das exportações angolanas de quase US$ 32 bilhões em 2006. Os diamantes, por US$ 1,1 bilhão.

A estabilidade de Angola está ancorada em um câmbio flutuante controlado. Em maio deste ano o Banco Nacional de Angola (BNA), o Banco Central do país, forçou uma apreciação cambial de aproximadamente 6%, com o dólar passando de 80 para 75 kwanzas, a moeda local. O dólar tem também livre circulação.

Paralelamente à apreciação do câmbio, foram elevadas a taxa de juros dos Títulos do Banco Central (TBC) da casa dos 9%, para uma inflação na casa dos 12,4%, negativa, portanto, para 15%, na tentativa de alcançar a meta informal de inflação de 10% usada como referência na Lei Orçamentária do país. A taxa, que fechou 2006 em 12,2% (era de 106% em 2002), mantém certa estabilidade este ano.

Há debate, envolvendo inclusive economistas brasileiros, sobre o melhor caminho para a manutenção da estabilidade, embora sem sair do campo da ortodoxia monetária. A âncora cambial versus os depósitos compulsórios dos bancos no BNA estão no centro desse debate.

Há temor de expansão dos gastos públicos, especialmente por causa das eleições legislativas de 2008 e da eleição presidencial, prevista para 2009. O mercado de títulos públicos ainda é muito pequeno para sustentar um papel mais ativo da taxa de juros, embora todos tenham louvado o fim da taxa negativa.

Debates à parte, o crescimento econômico do país tem sido exponencial, passando de 11,2% em 2004 para 20,6% em 2005 e 18,6% no ano passado. Para 2008, a previsão é de chegar a 23,4%. O PIB do setor de petróleo deverá crescer 22,3% e o do não-petróleo, 25,1%, segundo as estimativas aceitas, por exemplo, pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). O setor de petróleo representa 57% do PIB total. A indústria de transformação, somente 3,7%, basicamente, refino de petróleo e bebidas.

É neste cenário que China, Brasil e Portugal querem se tornar os parceiros preferenciais dos angolanos. Portugal tem uma linha de financiamento de ? 300 milhões em fase de liberação. A linha acumulada brasileira, por meio do BNDES, já soma US$ 2,2 bilhões. E os chineses estão ofertando a Angola créditos de US$ 7 bilhões a US$ 9 bilhões, dependendo da fonte da informação, com presença forte em obras públicas de saneamento e transportes.

Luanda é um canteiro de obras, o que contribui para aumentar a desorganização urbana. Puxando a brasa para sua sardinha, o lado brasileiro diz que o seu modelo é de cooperação, enquanto a China só quer exportar mão-de-obra e levar matérias-primas. Segundo cálculos do Relatório Econômico de Angola 2006, publicado pela Universidade Católica de Angola (Ucan), 70% dos materiais, serviços, equipamentos e mão-de-obra de Angola vêm da China.

Os chineses estão, pessoalmente, em dezenas de obras. A voz corrente, sem comprovação oficial, é de que muitos são presidiários que trabalham de graça em troca da redução das suas penas. Quanto aos portugueses, a aposta brasileira é de que eles acabarão perdendo por conta da rejeição natural dos angolanos a eles, decorrente de séculos de domínio colonial.(CS)