Título: Novo Mercado faz sombra e Bovespa Mais não deslancha
Autor: Valenti , Graziella
Fonte: Valor Econômico, 01/11/2007, Empresas, p. B3

A aposta prioritária para o futuro da bolsa paulista, o Bovespa Mais, está sendo atropelada pelo presente, com a força de expansão do Novo Mercado. Criado no fim de 2005 para ser um espaço dedicado a emissões e companhias de menor porte, o segmento ainda não deslanchou. Mas não foi por falta de interesse das empresas médias pelo mercado de capitais.

Das 53 empresas que fizeram oferta de ações na Bovespa neste ano, 33 apresentaram faturamento inferior a R$ 500 milhões no ano passado e 21, arrecadação menor que R$ 200 milhões. Entre as estreantes está a Invest Tur, que captou para um projeto, sem apresentar qualquer resultado aos potenciais investidores. Houve sete casos de companhias que até 2006 tinham receita líquida inferior, até mesmo, a R$ 50 milhões anuais.

Esse cenário ajuda a explicar por que uma quantidade tão grande de emissões agregou pouco no capital total em circulação na Bovespa. Relatório recente do Citigroup aponta que as novatas representam apenas 3,3% dos US$ 483 bilhões de ativos negociados na praça paulista. Quase 90% desse total é representado pelas "blue chips" das grandes empresas, que compõe o índice calculado pelo Morgan Stanley MSCI Brazil.

O sucesso do Novo Mercado está atraindo mais e mais companhias à bolsa. A mudança do cenário brasileiro colocou a sigla IPO - oferta pública inicial de ações, em inglês - como projeto de muitos empresários e empreendedores.

Heloísa Bedicks, diretora executiva do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), conta que houve um aquecimento no interesse por assuntos pertinentes à transparência e boas práticas de gestão de empresas abertas. "O boom de aberturas fez com que todos parassem para prestar atenção no assunto."

No Bovespa Mais, há algumas concessões que tornam a listagem mais simples. Nesse espaço, por exemplo, não há um percentual mínimo do capital da companhia que deva ser colocado em circulação no mercado de imediato - como os 25% exigidos para os demais segmentos dedicados à governança. A idéia é que as colocações feitas ali não demandem grande pulverização dos papéis, podendo ser dedicadas a grupos definidos de investidores.

O desenvolvimento desse segmento foi um dos temas de destaque durante as apresentações que a bolsa fez antes de listar seus próprios papéis, na sexta-feira passada. O espaço está repetindo a história do Novo Mercado, que passou mais de um ano até a primeira adesão, em fevereiro de 2002, com a Companhia de Concessões Rodoviárias (CCR), e quatro anos até decolar com a estréia da Natura, em 2004. A expectativa é que, em breve, o Bovespa Mais conquiste sua primeira adesão.

Na opinião do sócio da empresa de investimentos Stratus Álvaro Gonçalves o espaço conseguirá acumular, dentro de três a cinco anos, mais participantes do que o Novo Mercado tem hoje, na casa de 60 empresas. Ele acredita que a experiência de algumas companhias que pularam uma etapa indo diretamente ao espaço especial de governança deixará evidente a função essencial do Bovespa Mais.

Pedro Rudge, sócio da gestora de recursos Investidor Profissional, também defende o papel desse espaço. Para ele, é de grande importância que a companhia passe um período de experimentação, que haja um mercado de acesso inicial, antes do Novo Mercado, para as novatas. Porém, admite a existência de uma concorrência entre os segmentos, especialmente porque o empresário não vê muitas justificativas para cumprir todas as etapas. Ele defende que haja alguma facilidade adicional na listagem de uma empresa nesse novo segmento, com menos exigências.

Para Gonçalves, da Stratus, os bancos que coordenam as aberturas de capital deveriam criar estruturas especiais para emissões de menor porte. Com atuação internacional, essas instituições têm condições de levantar volumes significativos de recursos, que nem sempre são adequados ao porte e ao projeto de empresas menores. As empresas que chegaram esse ano à Bovespa, por exemplo, tiveram faturamento de R$ 38,7 bilhões em 2006 e captaram um montante pouco inferior com emissão de ações: R$ 30,1 bilhões.

Para o investidor, a importância do Bovespa Mais está no aprendizado da empresa sobre a convivência com o mercado de ações. É unânime a percepção de que as novatas ainda terão que se provar no quesito governança empresarial.

O gerente de relações com investidores da Natura, Helmut Bossert, destaca que, por mais que a empresa se prepare, a prática sempre demanda aprendizado. " Por mais que você treine, na hora de entrar em campo é que o jogo começa. Aí, é outra história." Ele conta que foi necessário explicar e treinar os funcionários sobre as razões da necessidade de prestação de informação.

Heloísa Bedicks, do IBGC, diz que está em andamento um estudo para ver a quantas anda a governança das companhias fechadas de médio porte. Segundo ela, serão estudadas empresas com faturamento até R$ 500 milhões. As empresas que estrearam a pesquisa são Sasazaki e a Lupo.

A percepção da especialista é que houve um aumento no interesse, mas ainda há muita necessidade de informação, especialmente, para além das regiões Sul e Sudeste, que concentraram o processo de listagem de ações.

Para atrair companhias que queiram participar do mercado, mas que supostamente ainda não têm porte para tanto, Rudge, da Investidor Profissional, acredita que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) poderia criar níveis de listagem diferenciados, a exemplo do que existe para estrangeiros nos Estados Unidos. Para ele, tal iniciativa ajudaria o Bovespa Mais. A redução das exigências seria permitida apenas para as captações que envolvam os chamados investidores qualificados - especializados em aplicar no mercado financeiro.