Título: Planalto intensifica negociação pela CPMF nos Estados tucanos
Autor: Lyra , Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 07/12/1220, Política, p. A6

Kátia Abreu e sua árvore de Natal decorada com etiquetas que mostram percentual dos preços dos produtos devido à contribuição O governo concentrou ontem a negociação política para aprovar a CPMF com os governadores, de situação e oposição, para convencer senadores a aprovar a prorrogação do imposto do cheque, em votação prevista para hoje. O governo decidiu, já no fim da manhã, que concorda em repassar integralmente os recursos da CPMF para a Saúde, e escolheu o ex-ministro da Fazenda deputado Antonio Palocci (PT-SP) para negociar a nova proposta diretamente com o governador de São Paulo, José Serra. Além disso, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tomou café da manhã com o governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda (DEM), e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, reuniu-se com o o governador de Rondônia, Ivo Cassol (sem partido), para discutir uma possível renegociação de dívidas do banco do Estado.

Palocci já está atuando como fiador da proposta desenhada ontem no Planalto. O petista sempre teve bom trânsito com a oposição, tornando-se respeitado por cumprir os acordos firmados, embora o governo o tenha desautorizado nas concessões que fez ao relatar a CPMF na Câmara. O governo precisou chamar alguém com credibilidade no Congresso porque a negociação ainda é baseada em promessas de mudanças no futuro, pois não quer fazer mudanças na PEC atual, para o texto não voltar à Câmara. "Mantega não tem condições para isso, pois fechou portas e queimou pontes com a oposição", diz um tucano que torce pela negociação. Costurada a duas mãos por Palocci e Serra, a idéia seria apresentada como uma alternativa para a retomada do diálogo governo e oposição.

Desde a semana passada, Palocci intensificou os contatos com o governador de São Paulo. Segundo um assessor tucano, secretários de Serra estiveram ontem em Brasília. Enquanto Lula estava com Arruda, Palocci estava no Ministério da Fazenda, horas antes de o Planalto fechar a proposta.

Entre os senadores tucanos, ainda há pelo menos um sinal de abertura: após reunião da bancada, apesar da declaração do líder Arthur Virgílio (PSDB-AM) de que todos os 13 senadores votarão contra a prorrogação do imposto, o ex-presidente da legenda, Tasso Jereissati (CE) disse que "se surgisse uma nova proposta, a bancada poderia rever sua posição". Pelo menos três senadores tucanos demonstram desconforto em votar contra a CPMF: Marconi Perillo (GO), Lúcia Vânia (GO) e Cícero Lucena (PB), ligado ao governador Cássio Cunha Lima. À noite, depois de uma outra reunião, no gabinete do presidente do partido, senador Sérgio Guerra (PE), havia a possibilidade de liberação da bancada.

As negociações no Planalto também entraram pela noite de ontem. As lideranças governistas foram chamadas pelo presidente para uma reunião com os ministros José Múcio (Relações Institucionais), Dilma Rousseff (Casa Civil)e Guido Mantega. Acenou-se com o compromisso de que a totalidade da contribuição fosse destinada à saúde.

Enquanto o Palácio negociava com os governadores tucanos, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso mantinha severas críticas à negociação da CPMF acusando seu sucessor de ter sido 'arrogante' ao pressionar os senadores contrários à prorrogação e ao chamá-los de sonegadores. "O governo tem que tomar um banho de realidade. Foi muito arrogante ao chamar de sonegadores. Não chamei os que estavam contra de sonegadores, até porque, naquela época, eles não tinham o que sonegar. Agora, não sei", disse Fernando Henrique em seminário na Associação Comercial do Rio. O ex-presidente lembrou que durante o seu governo teve que passar por pressão semelhante e na ocasião só conseguiu prorrogar o imposto em janeiro.

Já o DEM fechou questão contra o imposto. No encontro com Arruda, Lula pediu que o governador do Distrito Federal intercedesse junto à cúpula do DEM para que a legenda não cobrasse na Justiça o mandato dos senadores César Borges (PR-BA) e Romeu Tuma (PTB-SP), caso votem a favor do imposto. E que também dialogasse com o Democratas para evitar punições a Jonas Pinheiro (DEM-MT) e Jayme Campos (DEM-MT), parlamentares que tendiam a votar a favor da CPMF, pressionados pelo governador Blairo Maggi, que está negociando com o governo a rolagem da dívida do Estado.

A ida de Lula até Arruda revelou-se infrutífera. Poucas horas depois do café da manhã, os senadores do DEM resolveram fechar questão contra a CPMF - 14 votos pela sua derrubada. "Entendemos a aflição do governador Blairo Maggi. Mas somos homens maduros e vamos respeitar uma decisão partidária", reconheceu Jayme Campos (DEM-MT).

Na Fazenda, apesar do silêncio oficial, travou-se outra frente de batalha em busca do apoio dos governadores. Depois de conversar sobre uma possível renegociação da dívida de Mato Grosso para comover - em vão - Jonas Pinheiro e Jayme Campos - Mantega, ontem, ouviu os pleitos do governador de Rondônia, Ivo Cassol (sem partido). Cassol foi pedir uma renegociação da dívida do Banco do Estado de Rondônia (Beron), que está sob intervenção federal há oito anos. Nesse período, a dívida do banco teria saltado de R$ 40 milhões para R$ 600 milhões. A assessoria do governador alega que, em situações de intervenção, as dívidas devem ser quitadas pelo Banco Central, não pelo governo estadual.

Em troca, Cassol prometeu conversar com Expedito Júnior (PR-RO), que reluta em votar a favor da CPMF. "Ele pode até me recomendar que vote a favor, mas isso não é suficiente", disse Expedito. Até mesmo o ex-governador de Roraima, Ottomar Pinto (PSDB), que faleceu ontem, em um hospital de Brasília, de ataque do coração, tinha vindo para negociar com o governo o repasse de terras do Estado que ainda estavam em poder da União.

A senadora Kátia Abreu (DEM-TO) fez, ontem, no cafezinho do plenário do Senado, um movimento bem-humorado contra o imposto do cheque. Instalou uma árvore de Natal que, em vez de enfeites, era decorada com cartões com o nome de produtos, seus valores e a porcentagem de impostos pagos pela população. Uma das etiquetas mostrava que 79,6% do valor de um perfume é para pagar impostos. Na geladeira, os tributos mordem 47,1% do preço total.

Quando os senadores apareciam no cafezinho, Kátia os convidava para comer pedaços de panetone. Mão Santa (PMDB-PI), que apesar de ser da base aliada anuncia voto contra a CPMF, dizia que estava comendo impostos. Quando viu Renan Calheiros (PMDB-AL), Kátia Abreu chamou-o, mas ele fingiu que não ouviu. (Colaboraram Raquel Ulhôa, Thiago Vitale Jayme e Arnaldo Galvão, de Brasília, e Rafael Rosas, do Rio)