Título: Vale pede reajuste de 90% para o minério de ferro
Autor: Vera Saavedra Durão
Fonte: Valor Econômico, 24/01/2005, Empresas &, p. B6

As mineradoras abriram uma guerra na negociação contra a indústria mundial do aço. Quem imaginava que elas pudessem contentar-se com 35% a 40% de reajuste para o minério de ferro este ano enganou-se. Hoje as propostas vão de 50% a 90%, percentual posto na mesa pela Companhia Vale do Rio Doce (CVRD). "O carvão virou nossa referência. Se pagaram 119% pelo preço do carvão, por que não 90% pelo do minério?", questionou Roger Agnelli, presidente da Vale. Ele admitiu estar disposto a enfrentar uma queda-de-braço com as siderúrgicas para garantir preços de mercado ao minério pelo menos até março. As negociações entre as três grandes mineradoras mundiais - BHPBilliton, Rio Tinto e CVRD com as usinas de aço da Europa e da Ásia começaram em novembro e dezembro. Agnelli acredita que vai ser uma negociação extremamente difícil e o processo será longo, principalmente por que as negociações do preço do carvão saíram na frente e levaram quase 120% de aumento - passando de US$ 58 para US$ 125 a tonelada do insumo. "Isto tornou o entendimento sobre o reajuste do minério de ferro mais difícil. Tanto que não solicitamos o mesmo nível do carvão, pedimos um pouco abaixo, apesar dos dois produto terem condição de mercado semelhantes." A resistência das siderúrgicas em aceitar o reajuste não tem agradado a Vale. Agnelli considera o percentual solicitado de 90% "ponto de partida" e destaca que "nós não estamos impondo, não determinamos preço, mas o mercado está aí e a negociação já começou desde dezembro e o Guy Dollé (presidente da Arcelor, maior siderúrgica do mundo) diz que não negocia mais de 20%", comentou irritado. Para Agnelli, "é inconcebível o presidente da Arcelor estar expondo opiniões, sendo que do outro lado aceitou pagar 120% para o preço do carvão". Na ótica do executivo da maior mineradora do mundo, culpar a alta do minério pelo aumento do aço "é balela". Razão pela qual defende que um aumento de 90% ou 100% no preço do minério de ferro - que seria o maior da história do insumo - não necessariamente levaria o aço a subir no mercado brasileiro. Apesar do mercado de minério de ferro estar com oferta apertada por conta da demanda das siderúrgicas, ele lembra que no ano passado, o minério de ferro só teve um reajuste. "Pedimos muito mais de 20% e levamos 18%, no início do ano e ficamos sem aumento até hoje (o minério só tem um reajuste anual), enquanto a siderurgia aumentou fortemente o preço em 2004. Para mim, o impacto do reajuste do minério sobre a inflação é nulo", afirmou. A Vale, conforme argumenta Agnelli, só tem dois clientes de seu minério no mercado doméstico: Usiminas e Companhia Siderúrgica de Tubarão (CST). "As demais usinas têm minas cativas, como CSN e Belgo. O impacto de qualquer reajuste do minério para o país é na balança comercial. Se nosso aumento passar, vamos agregar mais US$ 4,5 bilhões às exportações. Já o aumento do carvão vai impactar as importações em mais US$ 1 bilhão", disse. Outro ponto que a Vale considera nessa negociação, segundo José Carlos Martins, diretor de participações e novos negócios da mineradora, é a questão cambial. "Nós entendemos que as siderúrgicas têm condições de pagar este aumento, pois na Europa, por exemplo, a valorização do euro foi de 30% e nós vendemos em dólar americano. No Japão o iene também se valorizou". Estimativas do International Iron and Steel (IISI) apontam que a demanda por aço vai aumentar 60 milhões de toneladas em 2005 no mercado global, o que vai exigir das mineradoras a colocação de mais 90 milhões de toneladas de minério nesse mercado. A partir dessa semana as rodadas de acertos entre usinas de aço e mineradoras vão ser retomadas. Martins e Agnelli reconhecem que a Vale tem compromisso com a siderurgia mundial. Mas na hora do reajuste cada um cuida dos seus interesses. As siderúrgicas da China, estão fora da negociação, mas seguem as demais. "O carvão aumentou e não gerou chiadeira. As negociações fecharam em uma semana. As siderúrgicas perderam rentabilidade e agora querem recuperar no minério. Mas, vamos continuar negociando, o vento sopra a nosso favor", disse Agnelli.