Título: Restos a pagar garantirão investimentos
Autor: Romero , Cristiano
Fonte: Valor Econômico, 04/01/2008, Política, p. A6

O governo ainda não definiu os cortes, no total de R$ 20 bilhões, que fará no Orçamento da União para compensar o fim da CPMF, mas já decidiu que duas áreas serão inteiramente preservadas: o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que prevê investimento de R$ 18 bilhões em 2008, e o Bolsa Família, que tem dotação de R$ 10,5 bilhões. Os cortes, segundo informou ontem o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, serão feitos nas emendas dos parlamentares ao Orçamento, nos investimentos propostos pelo próprio governo fora do PAC e nas despesas de custeio programadas para este ano.

De acordo com o ministro do Planejamento, as emendas de parlamentares ao Orçamento de 2008 somam cerca de R$ 15 bilhões. Já os investimentos fora do PAC chegam a R$ 12 bilhões, enquanto as despesas com custeio previstas na proposta orçamentária montam a R$ 92,944 bilhões (um incremento de 16,6% em relação ao que foi efetivamente gasto em 2007).

Paulo Bernardo informou que o governo negociará os cortes com o relator da proposta orçamentária, deputado José Pimentel (PT-CE), que pretende concluir seu trabalho em meados de fevereiro. Até lá, revelou o ministro, as contratações de funcionários públicos e a concessão de reajustes salariais estão suspensos. A única exceção diz respeito ao Ministério Público Federal, que pretende criar 2.295 novas vagas em 2008.

"Enquanto não resolvermos toda a equação, não tomaremos medidas para aumentar gastos. Há casos de concursos que já foram pactuados com o Ministério Público, já assinamos termos, mas, sobre o restante, precisamos equacionar o Orçamento, equilibrar receitas e despesas", observou Paulo Bernardo.

No ano passado, o governo anunciou a disposição de contratar, para os três poderes e o Ministério Público, 56.348 novos funcionários. Em cinco anos de gestão, o governo Lula já contratou quase 100 mil servidores. "Não posso falar em aumento de gastos com um rombo de R$ 40 bilhões para administrar", reconheceu o ministro, referindo-se ao total da perda de receita da CPMF em um ano.

Enquanto o Orçamento não for aprovado, o governo gastará 1/12 da proposta orçamentária enviada ao Congresso, mas encontrou uma brecha para tocar os investimentos que julga prioritários, principalmente, os que estão previstos no PAC - a rubrica "restos a pagar", que não entra no cálculo do 1/12. Nessa rubrica, o governo incluiu R$ 41 bilhões, o maior montante de "restos a pagar" da história, segundo informou o ministro do Planejamento.

No fim do ano passado, o governo, já tendo sofrido a derrota da extinção da CPMF, acelerou a autorização de gastos (empenhos de despesas), cujos pagamentos só acontecerão em 2008, por meio da rubrica "restos a pagar". Em 2007, o governo liberou R$ 16 bilhões para essa rubrica. Do total, R$ 10,2 bilhões para pagar investimentos e o restante, para despesas de custeio. Segundo Paulo Bernardo, há "restos a pagar" acumulados de orçamentos de anos anteriores a 2007.

O ministro disse que o governo respeitará o acordo feito com as centrais sindicais, no fim de 2006, referente à regra de correção do salário mínimo até 2010. Por essa regra, o mínimo é reajustado com base na inflação do ano anterior e do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos antes. Se o IPCA fechar 2007 com variação de 4,36%, segundo expectativa média do mercado, o salário mínimo deverá ter reajuste de 8,3% neste ano, passando a valer cerca de R$ 411. "Temos acordos com as centrais sindicais e vamos respeitá-los", assegurou Bernardo.

O ministro contou que partiu do ministro da Fazenda, Guido Mantega, a idéia de anunciar, logo no primeiro dia útil do ano, aumento de impostos e corte de despesas para compensar a perda da CPMF. A preocupação de Mantega foi com a reação dos mercados à falta de resposta do governo ao "problema fiscal" criado pelo fim da cobrança da contribuição. Em reunião no Palácio do Planalto, na sexta-feira, o ministro da Fazenda convenceu o presidente Lula a antecipar as medidas.

"Havia o risco de elevação dos juros futuros e a expectativa dos empresários, do mercado financeiro e dos consumidores de que o governo faria algo", ponderou Bernardo. O ministro criticou a oposição, que se sentiu "traída" e reagiu às medidas ameaçando não votar o Orçamento de 2008.

"Está dentro do marco democrático eles (a oposição) criarem dificuldades, anunciarem que vão atrapalhar e votar contra o governo. Eles fazem isso e nós temos que fazer a outra parte, que é manter o equilíbrio do orçamento, o superávit fiscal, tranqüilizar o país. Não pode é ter inversão de papéis. Não pode é a oposição querer governar o país, principalmente, lá da praia", ironizou Paulo Bernardo.