Título: Executivos criam fundo para vender vinho
Autor: Martinez, Chris
Fonte: Valor Econômico, 21/01/2008, Empresas, p. B5

Ricardo Benichio / Valor Donos do Vitis-Vinifera (da esquerda à direita): Percussi, Lacerda, Luis Souza, Flavio Jansen, Stephen Hood, Hitoshi (sentado) e Ken Marshall (de óculos, sentado) Um grupo de executivos de alto escalão, empresários e advogados, amigos entre si, decidiu se unir em torno de um hobby comum: o vinho. Roberto Nishikawa, presidente da Itaú Corretora, Ricardo Lacerda, presidente do banco de investimentos do Citi, Flavio Jansen, ex-presidente do Submarino, Luis Souza, sócio do escritório de advocacia Souza, Cescon e Hitoshi Castro, um dos donos da gestora de recursos Gap, se juntaram a outros 20 homens de negócios e criaram um fundo de investimentos para importar vinho barato em grandes quantidades e apostar na distribuição em larga escala. O Vitis-Vinifera, que entra hoje com pedido de registro na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), nasce com aporte de R$ 6 milhões e com o desafio de popularizar ainda mais o consumo da bebida no Brasil.

Mais do que simplesmente criar um fundo com recursos próprios, esses experientes e jovens senhores estruturaram um negócio que, por tabela, traz para o Brasil a Constellation Brands - maior fabricante e distribuidora de vinhos do mundo, com 250 marcas e vendas superiores a US$ 5 bilhões. A multinacional americana de bebidas, que também vende cerveja e alguns destilados, firmou um acordo com os sócios do Vitis-Vinifera, por meio do qual se compromete a fornecer com exclusividade de dois anos um robusto cardápio de vinhos. Marcas como Barrossa Valey Estate, Leasingham e Banrock fazem parte da lista.

A nova empresa do Vitis-Vinifera, com o nome de Australis, será comandada pelo sócio Ken Marshall, dono da importadora KMM, especializada em vinhos australianos. Também vai trazer vinhos de outras praças, como Nova Zelândia, África do Sul, Estados Unidos e Europa. Mas o que essa nova importadora tem de diferente das demais, a exemplo de Expand e Mistral?

A Australis vai apostar naquilo que parece ser uma combinação tão perfeita quanto sonhadora : vender vinhos de qualidade a um preço efetivamente baixo, com garrafas chegando ao consumidor final a R$ 15, R$ 10 ou menos do que isso. Os investidores vão investir alto no vinho envasado em caixa, para que uma taça nos restaurantes custe menos que R$ 5, e nos supermercados, uma caixa com três litros saia por R$ 30. A Expand e, especialmente a Mistral, trabalham com vinhos mais selecionados e preços mais altos.

"Na Europa, onde o consumo per capita supera a marca de 40 litros por ano, é muito comum as pessoas tomarem vinhos de 2 euros a 3 euros, o que mostra que a classe média pode ter acesso à bebida e, portanto, ter o hábito de toma-la diariamente ", diz Hitoshi Castro, sócio da Gap, uma das maiores gestoras independentes de fundos do Brasil, responsável por uma carteira de R$ 5 bilhões, e que vai administrar o fundo. "Se houver espaço e a legislação permitir, podemos montar uma fábrica para envasar o vinho em caixas aqui no Brasil, o que tornaria o produto ainda mais acessível", diz Castro. "O Brasil tem um enorme potencial de mercado para esse tipo de investimento", garante Ricardo Lacerda, do Citi.

Dinheiro para crescer não parece ser exatamente o problema desse grupo, acostumado a grandes operações de fusões e aquisições. A idéia inicial é usar os R$ 6 milhões para estruturar a Australis. Um dos braços do negócio está focado na venda de vinho ao varejo, o que inclui grandes e pequenas redes de supermercado, além de bares, restaurantes e churrascarias. O outro quer colocar o pé no próprio varejo, desta vez com lojas próprias, sob a bandeira Australis. O modelo ainda está sendo discutido, mas, ao que tudo indica, deve ser inspirado na inglesa Oddbins - hoje controlada pela Seagram - onde impera a simplicidade e os preços são incrivelmente sedutores.

Ken Marshall diz que a estratégia é abrir uma rede de lojas próprias e, numa segunda etapa, franquia, a exemplo do que a Expand já faz. Aquisições de lojas, redes ou distribuidores locais também não estão descartadas. "Se a opção for boa, podemos ir ao mercado fazer uma captação ou ainda abrir o fundo para novos sócios", diz Hitoshi. Hoje, o Vitis-Vinifera está fechado para novas adesões.

Para o especialista em vinhos Jorge Lucki, há espaço para essa turma de investidores. Cita como exemplo a Inglaterra, onde há diversos tipos de clubes de vinho, alguns deles com mais de 120 mil membros. E faz uma ressalva: a Constellation sempre foi uma empresa focada na venda de grandes volumes, no consumo de massa, o que não quer dizer vinhos de primeiríssima qualidade.