Título: Setor imobiliário quer mudanças em projeto de parcelamento de solo
Autor: Izaguirre, Mônica
Fonte: Valor Econômico, 14/01/2008, Brasil, p. A2

Ruy Baron / Valor Deputado federal Zezéu Ribeiro (PT-BA): contra o controle de entrada nos loteamentos que possuem ruas públicas O projeto que altera a legislação de parcelamento de solo para fins urbanos, em tramitação há mais de sete anos, está pronto para ir ao plenário da Câmara dos Deputados, quando forem retomadas as atividades legislativas, em fevereiro. Se depender do empresariado do setor imobiliário, no entanto, dificilmente o texto ficará como está. Descontentes com o substitutivo adotado pela comissão especial, os sindicatos estaduais que representam o setor, os Secovi, tentarão convencer os parlamentares a fazer alterações.

O esforço deve se concentrar em duas questões polêmicas. Uma delas afeta os atuais loteamentos de acesso controlado, a exemplo dos "Alphavilles". Prevalecendo o texto da comissão, três anos após a aprovação final, que depende também do Senado, ou eles deixarão de ser fechados ou terão que cumprir algumas regras dos futuros condomínios urbanísticos, novo tipo de parcelamento urbano, que surgirá com a mudança da lei.

Isso significa que, para manter o controle de acesso, os proprietários dos lotes terão que adquirir e destinar a uso público área localizada fora do perímetro do loteamento, igual a no mínimo 15% de sua área total. A alternativa é fazer doação equivalente em dinheiro a um fundo municipal de habitação. De uma forma ou outra, "será um custo tremendo" para os proprietários, alerta Hélzio Mascarenhas, coordenador de relações institucionais do Secovi do Rio.

Outro ponto polêmico refere-se à autorização de novos parcelamentos urbanos, na forma de loteamentos ou condomínios. Por proposta do deputado Zezéu Ribeiro (PT-BA), a comissão decidiu dar guarida aos municípios que quiserem exigir dos empreendedores doação de parte dos lotes ou de valor equivalente em favor de programas governamentais de habitação. Goiânia já tem uma legislação municipal que condiciona novas autorizações à doação de lotes para programas de habitação popular da prefeitura.

O substitutivo aprovado pela comissão não determina, mas permite que outros municípios façam o mesmo. O Secovi-RJ teme que, além de dificultar a contestação judicial da lei de Goiânia, isso leve outras prefeituras a seguir o exemplo, o que encareceria os novos empreendimentos, tornando o preço dos lotes menos acessível à população. O texto deixa claro que essa exigência de contrapartida pelo município, se houver, será adicional à exigência de destinação de áreas internas ou externas para uso público.

Além do espaço necessário às ruas internas, os novos loteamentos, que em princípio não poderão ser cercados, terão que destinar, no mínimo, 15% de sua área a domínio público, para implantação de praças, áreas verdes ou equipamentos comunitários, como escolas e centros de lazer. Regra semelhante vale para os condomínios urbanísticos, que poderão ser cercados. A diferença é que, no caso deles, por causa do controle de acesso, esses 15% estarão fora do perímetro de cercamento.

Pelo texto da futura lei, o condomínio urbanístico é um tipo de parcelamento onde as ruas internas fazem parte da propriedade privada, ou seja, são área de uso comum dos condôminos e não área pública. Por isso, poderão ser cercados. Já na modalidade loteamento, as ruas internas são consideradas área pública e, por isso, em princípio, os proprietários dos lotes não poderão controlar o acesso de outras pessoas.

As prefeituras poderão continuar autorizando novos loteamentos com controle de acesso após a nova lei,. mas eles terão que seguir a mesma regra dos condomínios urbanísticos quanto à destinação de área externa para uso público. Se a área apontada para uso público for interna, não poderá haver controle de entrada. Os Alphavilles e outros loteamentos fechados já existentes serão afetados, porque o texto exige adaptação de todos às novas regras, tanto os antigos quanto os novos, após três anos de vigência.

O Secovi-RJ vai sugerir aos deputados emenda que transfira essa questão para cada município resolver. Assim, cada prefeitura decidiria exigir ou não, de loteamentos anteriores e posteriores à lei, a doação de uma área externa para uso público, em troca da permissão para controle de acesso.

O deputado Renato Amary (PSDB-SP), último relator do projeto na comissão especial, acha que a preocupação do Secovi é legítima, pois tenta evitar aumento de custo para proprietários atuais e futuros adquirentes de lotes. Ele preferia que as condições para permitir controle de acesso fossem definidas por cada município, de acordo com a realidade de cada um. "O que é bom para uma cidade pode não ser bom para outra", diz. Ainda assim, Amary defende o texto da comissão, porque reflete "o máximo de consenso possível" entre os segmentos da sociedade envolvidos com o tema. "Só assim foi possível levar o projeto para plenário, após sete anos e meio."

O deputado Zezéu Ribeiro (PT-BA) acha imprescindível exigir áreas de uso público, além das ruas, dentro dos novos loteamentos. Só assim, defende, o crescimento das cidades ocorrerá com previsão de espaço para um mínimo de equipamentos comunitários perto das pessoas, como escolas e centros de lazer. Social e economicamente, diz, é importante que as populações não precisem percorrer grandes distâncias para ter acesso a eles.

Ribeiro é contra o controle de entrada nos loteamentos, onde as ruas são públicas. Para atender a quem faz questão de cercas é que surge a figura do condomínio urbanístico, diz. Mas ele acha justa a exigência de destinação de área externa para uso público, até para haver isonomia de tratamento. Ribeiro defende ainda que a lei ampare a exigência adicional de doação de lotes para programas de habitação popular por parte de prefeituras que assim desejarem. Ele entende que essa é uma forma de democratizar o acesso à terra e de fazer com que os proprietários devolvam ao poder público parte dos ganhos de valorização proporcionados pelos investimentos públicos em infra-estrutura urbana.