Título: Racha interno entre aliados e na oposição emperra CPI dos Cartões
Autor: Ulhôa, Raquel; Basile, Juliano
Fonte: Valor Econômico, 14/02/2008, Politica, p. A9

A ambigüidade das posições dos líderes governistas no Congresso em relação à proposta de criação da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para apurar eventuais abusos na utilização do cartão corporativo da administração pública federal sinaliza ora um racha na base aliada ora um boicote à investigação. Nenhum líder da base na Câmara havia assinado o requerimento pedindo a instalação da comissão, embora o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), seja um dos autores da iniciativa. À noite, o líder do governo na Câmara, Henrique Fontana (PT-RS), e o líder do PT, Maurício Rands (PE), afirmaram ter assinado o documento, que, no entanto, não havia ainda sido entregue ao deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP), autor do pedido de criação da CPI mista.

Fontana tem dito que discorda dos termos do requerimento negociado por Jucá, por não deixar explícito que o governo Fernando Henrique Cardoso será investigado. "Fontana está com preciosismo. A apuração nesse período está implícita no texto. E, se o governo tem maioria, investiga qualquer coisa", reagiu Jucá, mostrando irritação. Segundo o pemedebista, houve entendimento entre ele, Fontana e o ministro José Múcio Monteiro (Relações Institucionais) para a criação da comissão. "Se não tiver a comissão mista, vamos retomar a CPI exclusiva do Senado".

Sampaio, que negociou com Jucá a criação da CPI mista, conseguiu ontem 172 assinaturas (apenas uma a mais do que o número exigido) ao requerimento pedindo a instalação da comissão. Segundo ele, nenhum dos líderes dos partidos aliados na Câmara havia assinado, assim como Fontana. "Isso significa que não passou de ato de dissimulação o governo dizer que queria investigar. De repente, teve um jogo armado entre a liderança do governo no Senado e a liderança do governo na Câmara", afirmou. Fontana disse "estranhar" a declaração, já que deixou "quatro recados" para que Sampaio levasse o documento para ser assinado por ele. E não teve retorno.

Jucá defende, também, que a base aliada ceda à oposição um dos postos de comando da CPI - presidência ou relatoria -, como reivindicam o PSDB, o DEM, o PPS e demais partidos de oposição, mas os líderes na Câmara são contrários.

Os líderes do PSDB e do DEM no Senado decidiram aguardar uma posição definitiva do governo até o fim desta semana. Caso a reivindicação não seja atendida, uma nova estratégia será adotada. Segundo o líder tucano, Arthur Virgílio (AM), há duas soluções possíveis: criar uma CPI exclusiva do Senado ou participar da CPI mista e obstruir as votações. O presidente do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), defensor da "divisão equânime" do poder da CPI entre governo e oposição, afirmou ontem aos líderes que irá interceder a favor da negociação. Garibaldi está preocupado com o risco de paralisação dos trabalhos da Casa.

O líder do PSDB, senador Arthur Virgílio, entrou, ontem, com mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) para ter acesso imediato aos dados sigilosos dos cartões corporativos do gabinete pessoal do presidente Lula. Ele argumentou que é função do Congresso exercer a fiscalização do Executivo. E que, como senador, teria o direito individual de acesso às contas pessoais do presidente. A ação de Virgílio foi proposta dois dias depois de dois ministros do STF se declararem contra o sigilo nas contas do gabinete do presidente. Para Celso de Mello, o decano no Supremo, e Marco Aurélio Mello, que também preside o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a regra que deve prevalecer é a da transparência nas contas, independente da autoridade.