Título: Vale perde mais um round na longa disputa judicial com o Cade
Autor: Galvão , Arnaldo
Fonte: Valor Econômico, 17/01/2008, Empresas, p. B8

A Companhia Vale do Rio Doce sofreu ontem, no Supremo Tribunal Federal (STF), nova derrota na longa disputa que move contra o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). A presidente do STF, ministra Ellen Gracie, determinou o arquivamento da reclamação da mineradora que contestava a competência do presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Raphael de Barros Monteiro Filho, para suspender liminar do Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região que, por sua vez, autorizava a empresa a não cumprir decisão do Conselho.

Em 2005, ao julgar a compra de oito mineradoras pela Vale, a autoridade antitruste mandou a empresa abrir mão do direito sobre o excedente da produção e consumo cativo de minério de Casa de Pedra, mina controlada pela CSN, ou vender o controle da Ferteco, empresa que havia adquirido em abril de 2001.

A assessoria da Vale informou ontem que os dirigentes da empresa decidiram não comentar a decisão da ministra Ellen Gracie. Mesmo sem essa manifestação, ainda existe a possibilidade de recurso à Corte Especial do STJ, instância máxima integrada por 22 ministros.

Na prática, o arquivamento da reclamação levada ao Supremo confirma a validade da decisão do STJ que julgou legal a restrição determinada pelo Cade contra a Vale há pouco mais de uma semana. Em 2005, depois de um empate em três a três entre os conselheiros, foi necessário o voto de desempate da presidente Elizabeth Farina.

Na reclamação, a Vale tinha alegado a existência de questões constitucionais para afirmar que é do STF, e não do presidente do STJ, a competência para suspender decisão favorável à empresa. Ao julgar o pedido da gigante mineradora contra a decisão do ministro Barros Monteiro, Ellen Gracie reconheceu que o presidente do STJ "agiu no âmbito de sua competência" porque o caso também envolve matéria infra-constitucional.

A ministra considerou que a Vale pretendia que o Supremo "autorizasse a persistência no descumprimento do ato do Cade, tentando, mais uma vez, sobrepor os seus interesses privados, de índole patrimonial, ao interesse público da defesa da ordem econômica".

A presidente do Supremo advertiu que o cumprimento de decisões do Cade "não pode ser subordinado à prévia resolução de questões patrimoniais, de natureza eminentemente privada, que devem ser equacionadas no foro adequado". Portanto, na sua visão, a Vale tem de buscar o ressarcimento da perda da preferência sobre a exploração produtiva da mina Casa de Pedra no juízo civil competente.

Ao arquivar o pedido da Vale, Ellen Gracie ressaltou que, no caso, existe a possibilidade de "perigo de dano inverso" porque a decisão do Cade poderá perder sentido se não for imediatamente cumprida. Ela ainda admitiu que o Conselho julgou as transações com a utilização de critérios que se encontram, "em princípio, dentro de um juízo eminentemente técnico". A magistrada advertiu que a jurisprudência do STF estabelece que a reclamação não pode ser substituta de outros recursos.

Em setembro do ano passado, a Vale optou por ficar com a Ferteco mas manteve suas ações judiciais para preservar o direito sobre o excedente de Casa de Pedra. Para o Cade, a venda livre desse minério permitiria à CSN comercializar com outras empresas, expandir Casa de Pedra e ser concorrente efetiva da Vale.

Na reclamação levada ao STF, a Vale contestou o fato de o Cade ter retirado seu direito ao excedente da mina, "sem que se saiba se a CSN pagará por esse ativo o seu efetivo valor". A companhia acusou o órgão antitruste de "determinar a doação de parte de seu patrimônio, com ofensa ao seu direito de propriedade, sem observância do devido processo legal".

A Vale também questionou o fato de o Cade não ter avaliado nem auditado os ativos em Casa de Pedra. No caso da Ferteco, o Conselho mandou reunir os ativos, auditá-los e avaliá-los para, em seguida, vendê-los. Segundo a companhia, o mesmo deveria ter sido feito para Casa de Pedra. "O Cade silenciou, de forma solene, sobre qualquer etapa que deveria ocorrer, de forma precedente, à obrigação de desconstituição dos direitos de preferência sobre o acordo de Casa de Pedra", diz a reclamação da Vale.

A companhia reconheceu, no entanto, que a eventual indenização da CSN terá de ser paga na esfera privada mas disse que o Cade não poderia impor a transferência desse direito "sem que se saiba previamente o seu valor e, principalmente, se a CSN vai indenizar a Vale".

Em auditoria feita pelo Banco Fator, a pedido da Vale, um ano e meio após a decisão do Cade, o direito ao excedente de Casa de Pedra foi fixado em US$ 522 milhões. Posteriormente, advogados da Vale escreveram, nos autos do processo, que este direito valeria mais de R$ 2 bilhões.

O acordo que originou esse direito foi firmado em março de 2001, quando do descruzamento societário entre Vale e CSN. O prazo estipulado para esse acordo foi de 30 anos. A Vale tem ainda direito de compra de Casa de Pedra, casa a CSN a decida vender.

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