Título: Planejamento recomendará que ministros não usem cartão
Autor: Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 08/02/2008, Política, p. A10

O Ministério do Planejamento vai distribuir, no início da próxima semana, uma circular aos secretários-executivos deixando expresso que os ministros de Estado não poderão mais usar os cartões corporativos. Apesar de não haver qualquer limitação legal, o Planalto entende que a recomendação é política e será acatada por todos os titulares das Pastas. Pelos cálculos do Executivo, apenas seis ministros atualmente possuem cartão corporativo. Mas, todos os demais 7,145 mil cartões em posse de servidores continuarão sendo utilizados normalmente.

A proibição dos ministros de portarem o cartão corporativo não estava expressa no decreto publicado na quarta-feira no "Diário Oficial da União" porque, nas palavras de um ministro palaciano, "não podemos colocar na legislação algo que, legalmente, não é proibido". O entendimento político, contudo, evoluiu a partir do caso da ex-ministra da Igualdade Racial, Matilde Ribeiro, que se demitiu após gastar R$ 461,16 em um free-shop. Em entrevista coletiva na noite de quarta, a chefe da Casa Civil, ministra Dilma Rousseff, considerou inapropriado "quem ordena uma despesa ser o mesmo a executá-la".

Alguns ministros, como o da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, se anteciparam à recomendação e abriram mão do cartão. Mas, o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, reclamou que teve várias notas fiscais de reembolso não pagas pelo Executivo. Stephanes justificou como "gastos de viagem" os aproximadamente R$ 5 mil com o cartão corporativo em 2007.

Essa situação gera outro problema que está em estudo no Ministério do Planejamento: a possibilidade de os ministros ganharem "diárias" de viagem. No caso dos servidores, as diárias cobrem gastos de estadia e alimentação. Os ministros não têm essa prerrogativa. A percepção de alguns governistas é de que, enquanto uma fórmula alternativa para essa situação não for encontrada, ainda haverá dificuldades em impedir que os ministros usem o cartão.

Para um ministro que acompanha o debate, a medida é positiva, mas com efeitos limitados. "O problema não é o cartão, é o autor. Não adianta achar que a simples apreensão do revólver signifique que um eventual assassino foi punido. Quem mata é o assassino, não a arma". Para ele, se o dolo for cometido, basta punir quem o cometeu. "Não há dúvidas que isso ficou muito mais fácil de ser identificado com o cartão. Sem ele, a despesa com a mesa de sinuca seria feita em dinheiro vivo e poderia ser encoberta com uma nota de alimentação, por exemplo", justificou outro ministro.

Com a proibição dos ministros de utilizarem os cartões, a tendência é de que as despesas dos mesmos sejam pagas por outros servidores, autorizados pelo "ordenador de despesas". Algumas Pastas, como a Justiça, já agem assim. Um servidor que viaja com o ministro Tarso Genro fica responsável pelo pagamento de algumas despesas emergenciais do ministro, em trânsito, como hospedagem e alimentação. Por essa visão, o "crime" cometido pelo ministro dos Esportes, Orlando Silva, foi ter utilizado o cartão corporativo para comer uma tapioca de R$ 8, em Brasília, onde reside. "Se ele pegasse o mesmo cartão e comesse a mesma tapioca em São Paulo, não teria problema nenhum, pois estaria em trânsito", justificou o ministro da Comunicação Social, Franklin Martins.

O decreto de regulamentação publicado no "Diário Oficial" foi claro apenas ao proibir o saque de recursos em dinheiro vivo com o cartão corporativo. As exceções - ainda assim limitadas a 30% do total da despesa anual do órgão ou entidade -, terão que ser justificadas e autorizadas pelo ministro. Ficam fora dessa limitação a Presidência da República, a Vice-Presidência, os ministério da Fazenda e da Saúde (nos casos de atendimento às populações indígenas), a Polícia Federal, as repartições do Ministério das Relações Exteriores no exterior, bem como militares e servidores lotados na área de inteligência do governo federal.