Título: Desoneração da folha será posterior à reforma
Autor: Izaguirre , Mônica ; Galvão , Arnaldo
Fonte: Valor Econômico, 27/02/2008, Política, p. A11

O governo vai incluir no âmbito da reforma tributária a desoneração da folha de pagamento das empresas, mas já não sabe exatamente como isso será feito. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse ontem, porém, que se comprometeu a enviar ao Congresso um projeto de lei com a desoneração até 90 dias após a aprovação da proposta de emenda constitucional da reforma tributária. Para o ministro, são relevantes as preocupações dos dirigentes sindicais apresentadas em uma reunião com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na segunda-feira. Eles disseram que a idéia de Mantega, de reduzir de 20% para 14%, em seis anos, a contribuição patronal à Previdência pode aumentar o déficit do sistema previdenciário e, no futuro, elevar a pressão política por uma reforma do INSS que retire direitos e benefícios dos empregados. As centrais sindicais defendem a desoneração da folha desde que acompanhada da correspondente vinculação de parte da tributação sobre o faturamento à Previdência.

Ontem o ministro da Fazenda reuniu-se com as lideranças dos partidos de oposição. Mantega confirmou a promessa de incluir no texto da reforma tributária um dispositivo que proíba o aumento da carga de impostos e contribuições federais durante a sua implementação. Isso, porém, não foi suficiente para garantir o apoio dos dois maiores partidos de oposição ao novo projeto de reforma tributária . "A proposta é acanhada tanto no que se refere à redução da carga de tributos quanto a uma nova divisão de receitas entre União, Estados e municípios", disse ontem o deputado ACM Neto (BA), líder do DEM na Câmara, ao deixar o gabinete do ministro da Fazenda.

O objetivo do encontro, para o qual foram chamados representantes do DEM, PSDB, PPS e PSOL, era apresentar à oposição os principais pontos das mudanças pretendidas no sistema tributário, objeto de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) a ser encaminhada amanhã ao Legislativo. O líder do PSDB na Câmara, deputado José Anibal (SP), destacou que a proposta prevê redução de alíquotas do futuro Imposto federal sobre Valor Adicionado (IVA-F) caso sua criação represente aumento real de arrecadação relativamente às contribuições que ele vai substituir (Cofins, Pis-Pasep, Cide e salário-educação).

O presidente do partido, senador Sérgio Guerra (PE), no entanto, evitou julgar a proposta no mérito, pois PSDB e DEM preferem esperar a PEC. Alinhados em muitas votações, os dois partidos querem que a reforma atenda a três princípios: alívio da carga tributária como proporção do Produto Interno Bruto (PIB), maior participação dos governos subnacionais na arrecadação total e simplificação do sistema. Para ACM Neto, em avaliação preliminar, só o item simplificação foi contemplado.

O líder do governo no Senado, senador Romero Jucá (PMDB-RR), reconheceu que a PEC "é neutra" no que se refere a outros dois pontos. Mas esclareceu que haverá redução de carga tributária em consequência de medidas infraconstitucionais que comporão o pacote da reforma e que serão apresentadas "tão logo possível". Nesse pacote, a principal medida é o projeto que reduz a contribuição patronal à Previdência.

Segundo Jucá, esse projeto será proposto em regime de urgência e deverá reduzir a alíquota em até 6 pontos percentuais, no ritmo de um ponto ao ano, durante seis anos. Jucá admitiu, por outro lado, que o governo não vai encaminhar o projeto de imediato porque tem dúvidas quanto à necessidade ou não de compensar essa perda de receita em outro tributo. Se houver compensação integral, haverá desoneração para setores intensivos no emprego de mão de obra mas não para a economia como um todo.

Para Jucá e outros participantes da reunião ficou claro que Mantega não gosta da idéia de transferir parte da alíquota da Previdência para o faturamento das empresas, como já permite a atual Constituição. O ministro quer uma desoneração de fato, até porque foi nesse sentido a orientação inicial de Lula. Também ficou claro para a oposição que Guido e Lula não estão seguros da possibilidade de abrir mão de uma compensação. "Estão refazendo os cálculos", disse o líder governista.

O governo decidiu olhar a questão com mais cautela a pedido das centrais sindicais, que estão preocupadas com o déficit da Previdência. O DEM e o PSDB não querem mera transferência de tributação. Mas parte da esquerda defende que deve sim haver compensação se cair a 14% a contribuição patronal sobre a folha. "Quem vai pagar a conta dessa desoneração", questiona a deputada Luciana Genro (RS), líder do PSOL na Câmara, que quer aumento da tributação sobre faturamento, sobretudo dos bancos. Ela estava na reunião de ontem e criticou o fato de a reforma não desonerar consumo nem rendimentos de trabalho.

O ministro das Relações Institucionais, José Múcio, admitiu ontem que o projeto pode não ser votado este ano. " Ano par é sempre um ano complicado, porque tem as luzes dos palanques (eleitorais), os discursos, mas se ela (reforma) for discutida não tem pressa de aprovar este ano " , disse Múcio. "A aplicabilidade da reforma é de oito anos, ou seja, é para os dois próximos governos. Não é uma reforma do governo Lula, é da sociedade e depende de um grande entendimento ", comentou Múcio, que foi ontem ao Rio participar de um seminário no BNDES. (Colaborou Rafael Rosas, do Rio)