Título: Com recomendação de peso
Autor: Torres, Izabelle; Sassine, Vinicius
Fonte: Correio Braziliense, 10/02/2011, Política, p. 6

VERBAS PÚBLICAS O Ministério do Trabalho indicou a maior parte dos recursos que seriam usados por entidade para qualificar motoboys. Quantia não foi liberada

A emenda parlamentar com maior valor entre as três aprovadas para a Federação Interestadual dos Mototaxistas e Motoboys Autônomos (Fenamoto) foi recomendada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). É o que afirma o deputado Hugo Leal (PSC-RJ), autor da emenda de R$ 2,5 milhões destinada, no ano passado, à entidade, com o objetivo de capacitação de mototaxistas. ¿Pedi algumas indicações de quem poderia dar treinamentos e o Ministério do Trabalho me deu a dessa entidade. Daí, propus a emenda¿, diz o deputado.

A Fenamoto tem um convênio de R$ 1,5 milhão com o MTE para capacitar motoboys no Distrito Federal (DF), mas os cursos são irregulares, como o Correio revelou ontem. O presidente da federação, Robson Alves Paulino, é aliado político do ministro do Trabalho, Carlos Lupi. Ambos integram o PDT. Outra entidade ligada a Robson, o Sindimoto de Goiás, recebeu mais R$ 4,96 milhões para capacitar motofretistas. O número de vagas ¿ 6,6 mil ¿ foi bem superior à procura e o convênio precisou ser prorrogado.

Além dos três convênios com o MTE, Robson Alves ¿ ex-vereador em Goiânia, atual suplente e que se define como um ¿lobista político com responsabilidade¿ ¿ conseguiu a aprovação de três emendas parlamentares em 2010. Apareceram três padrinhos dispostos a incluir a Fenamoto na lista de beneficiadas. Somadas, as emendas dos deputados Hugo Leal e Eduardo Gomes (PMDB-TO), e a do senador Cícero Lucena (PSDB-PB) tentaram colocar, nas mãos de Robson Alves, R$ 3,5 milhões. O dinheiro entrou na cota do contigenciamento e não foi empenhado.

O deputado Hugo Leal é um ferrenho defensor da não regulamentação da atividade de mototaxista. Ele conta que, depois de vencido nas discussões e na votação do projeto de regulamentação da profissão, decidiu trabalhar para ¿amenizar os danos¿ causados pela nova lei, investindo em aperfeiçoamento dos condutores. Foi nesse contexto que, segundo o parlamentar, pediu a indicação ao MTE de uma entidade apta para a capacitação de motociclistas. A posição de Hugo Leal na Comissão de Viação e Transportes da Câmara foi pela proibição do serviço de mototáxi.

Se fosse liberado, o dinheiro chegaria às contas da Fenamoto para que ela organizasse 16 seminários no Rio de Janeiro para qualificar os mototaxistas. ¿Quando vi que aquele projeto absurdo era uma realidade, decidi trabalhar para que pelo menos esses motoristas fossem qualificados e entendessem suas responsabilidades. O projeto não teve sucesso porque a verba não saiu. Mas confesso que não conheço bem a entidade¿, ressalta Hugo Leal.

Retorno político Apesar de os recursos pedidos nas emendas não terem chegado aos cofres da federação, alguns parlamentares conseguiram colher frutos políticos. Em Tocantins, terra do deputado Eduardo Gomes, Robson Alves participou da campanha do governador eleito Siqueira Campos (PSDB). O apoio, segundo anunciou o próprio dirigente, foi o agradecimento da federação ao deputado, que esteve na linha de frente da disputa que elegeu o tucano para o comando do estado. O deputado nega que mantenha relações próximas com Robson Alves. ¿As emendas que apresentei não foram liberadas. A ligação que tenho como os mototaxistas é no meu estado¿, disse.

Tanto a emenda sugerida por Eduardo Gomes, primeiro-secretário da Câmara, quanto a do senador Cícero Lucena, primeiro-secretário do Senado, objetivaram a capacitação de motofretistas em seus respectivos estados, Tocantins e Paraíba, capitaneada pela Fenamoto, que tem sede em Goiânia. Cada uma tinha valor de R$ 500 mil.

¿Eu vou atrás, converso com os parlamentares. A arrecadação da federação é muito pequena e dependemos de convênios, patrocínios e emendas¿, sustenta Robson Alves. ¿A emenda para o Rio iria qualificar os primeiros mototaxistas do estado, mas o Denatran entendeu que não era viável.¿ A capacitação de motofretistas no DF, por meio de convênio entre MTE e Fenamoto, é feita sem o credenciamento da entidade no Detran. Por isso, o órgão de trânsito não emitiu um único certificado aos motoboys que fizeram o curso até agora.

MTE nega ingerência A assessoria especial do ministro do Trabalho, Carlos Lupi, sustenta que a escolha da Federação Interestadual dos Mototaxistas e Motoboys Autônomos (Fenamoto) para capacitar motofretistas foi um processo ¿técnico¿ e sem ¿ingerência política¿. Se uma entidade sem fins lucrativos atende os requisitos legais e apresenta condições de ministrar as aulas, pode participar da chamada pública divulgada no site do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), conforme nota enviada ao Correio.

Não há na nota qualquer referência à ligação política entre Lupi e Robson Alves Paulino, presidente da Fenamoto, apesar do questionamento enviado à assessoria ainda na terça-feira. Robson integra a executiva regional do PDT em Goiás e refere-se a Lupi, presidente licenciado do partido, como ¿chefe¿ e ¿amigo¿. Também não há qualquer explicação sobre a execução do convênio e sobre o acompanhamento feito pelo MTE.

Cursos como o de motofretista surgem de necessidades de comunidades locais, segundo a assessoria de Lupi. Uma audiência pública definida pelo MTE permite a elaboração de um projeto com número de vagas, tipo de cursos e locais para a oferta da qualificação. ¿Esse foi exatamente o processo em que se desenhou a proposta nacional de qualificação para mototaxistas¿, informa a nota. Os editais de seleção estabelecem como critério a ¿vocação da entidade¿ para oferecer o curso. ¿Fenamoto e Sindimoto tiveram o melhor desempenho. Apresentaram os melhores projetos, já que conhecem intimamente o setor.¿

Ainda segundo a assessoria do ministro, o curso oferecido pela Fenamoto não fere a resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) que obriga a capacitação de motofretistas por entidade autorizada pelo Detran. O argumento é que as chamadas públicas para o curso ocorreram antes da edição da resolução. (VS e IT)