Título: Reunião sobre clima põe de novo EUA no foco
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Fonte: Valor Econômico, 31/03/2008, Internacional, p. A12

Começa hoje em Bancoc a primeira rodada de negociações internacionais de combate às mudanças climáticas depois da Conferência de Bali, no final de 2007. A idéia do encontro na Tailândia é dar início a um acordo sobre o clima que funcione depois de 2012, quando termina o primeiro período de compromissos do Protocolo de Kyoto. O foco das atenções no evento, que vai até sexta-feira, estará, de novo, nas atitudes da delegação dos Estados Unidos.

"Será uma reunião de grande importância", espera o diplomata Luiz Alberto Figueiredo Machado, que preside o encontro e costuma chefiar os negociadores brasileiros nestes eventos internacionais de clima e biodiversidade. "Vamos estabelecer o programa de trabalho e iniciar imediatamente as discussões de todos os elementos que compõem o Plano de Ação de Bali", diz. "Elementos" significam medidas para que os países reduzam emissões de gases do efeito estufa (a mitigação do problema), ações de adaptação à mudança do clima, transferência de tecnologia e financiamento para tudo isso. "É o início da negociação concreta com vistas a uma decisão em 2009 que signifique o engajamento de todos e reflita um esforço global de combate à mudança do clima".

A data de 2009 é a da Conferência das Partes, a CoP-15 de Copenhague, quando se reunirão os representantes dos países que assinaram a Convenção do Clima, os que estão comprometidos com as metas do Protocolo de Kyoto, os que não estão e os que podem vir a estar. Nesta data, a nova administração americana já estará definida e operante. O ministro Figueiredo presidirá a série de quatro mega encontros internacionais sobre clima previstos para 2008 e que desembocarão no segundo semestre na CoP-14, na Polônia.

A Conferência de Bali (ocorrida em dezembro) terminou em grande estilo, com representantes de 200 países tentando chegar a uma agenda que culmine em um acordo em 2009 (o chamado Mapa do Caminho de Bali, idéia brasileira), e com os EUA tentando obstruir o processo. Nos minutos finais da conferência, um representante de Papua Nova Guiné disse que, se os EUA não querem ajudar no processo, que saiam da frente. O plenário explodiu em aplausos e os americanos toparam o tal mapa do caminho.

Os EUA, desde maio de 2007, correm em raia própria neste tema - o presidente Bush convoca reuniões entre os países mais emissores do mundo e busca costurar um acordo diferente ao de Kyoto, que é mundial e está dentro do regime das Nações Unidas. Os diplomatas brasileiros, chineses, europeus, indianos vão às reuniões (a próxima será em abril) e escutam o que seus colegas dos EUA têm a dizer, mas evitam transformar estes encontros em fóruns negociadores. Em Bancoc o jogo é outro.

"Há uma expectativa em relação aos EUA", diz Sergio Serra, embaixador extraordinário para mudança do clima. O mapa de Bali criou um dispositivo só para incluir os EUA no processo de cortar gases-estufa. O tal artigo não fala em metas, mas em compromissos que possam ser mensuráveis e passíveis de informação. Há outro, similar, para as nações em desenvolvimento que se tornaram grandes poluidoras como a China, a Índia e o Brasil. Bancoc é o início do processo para ver o que os novos atores do efeito-estufa, que não participam de Kyoto, vão ter que fazer.

O que é novidade também é fonte de preocupação. Negociar uma forma de incluir os EUA no esforço mundial de combate às mudanças climáticas, temem Brasil e União Européia, não pode ser válvula de escape para países que fazem parte de Kyoto mas não estão muito contentes com isso - como Japão, Canadá e Rússia. Como é difícil chegar a consenso com tantos interesses distintos, o processo de negociação pode se desdobrar em workshops cá e lá. "O tempo é curto", diz Serra. "Temos que deixar estas questões encaminhadas. Não adianta deixar tudo para o fim."