Título: Governo quer ter golden share na indústria bélica
Autor: Rittner , Daniel
Fonte: Valor Econômico, 10/04/2008, Brasil, p. A4

O plano, que está em elaboração e será apresentado dia 7 de setembro, teve suas conclusões preliminares divulgadas ontem pelos ministros da Defesa, Nelson Jobim, e de Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger. Eles apregoaram a "reorganização radical" da indústria de defesa, com proteção às empresas nacionais do setor. Para isso, segundo Mangabeira, é essencial aplicar regras que protejam essas empresas do "curto-prazismo mercantil" e não as submetam ao "risco de descontinuidade de compras governamentais".

"Não podemos tratá-las como se elas vendessem qualquer produto nacional", disse Mangabeira. Indústrias como Helibrás, Avibrás, a fabricante de pistolas Taurus e a Mectron, que produz radares e mísseis, podem ser alvo da tentativa do governo de obter ações especiais como compensação por um programa robusto de fomento. É uma forma de "assegurar o poder estratégico do Estado", conforme definiu o ministro extraordinário.

É essa a lógica que prevalece, segundo ele, nas negociações para a transferência de tecnologia com outros países. "A todos eles deixamos claro que não estamos interessados em comprar produtos, mas em parcerias", disse Mangabeira, depositando suas maiores esperanças nas conversas com França e Rússia.

A reformulação da indústria de armamentos faz parte do tripé em que se baseia o Plano Estratégico de Defesa. O segundo eixo trata da obrigatoriedade do serviço militar e a eventual criação de um serviço social. O terceiro ponto é o reaparelhamento das Forças Armadas em função do desenho de seis cenários possíveis de emprego das tropas - o monitoramento das fronteiras terrestres e marítimas em circunstâncias de paz; a invasão de fronteiras por forças paramilitares, com o apoio velado ou não de um país vizinho; uma guerra assimétrica na Amazônia contra uma potência bélica; uma guerra em outro continente, com reflexos para o Brasil e emprego efetivo ou potencial de armas nucleares; a participação do Brasil em missões de paz das Nações Unidas; e operações internas para garantia da lei e da ordem em grandes metrópoles.

O projeto F-X da Aeronáutica, cancelado em 2005 e recém-retomado, pode ir de novo para a gaveta. Desta vez, porém, para dar lugar a um programa mais ousado: o desenvolvimento, com uma potência bélica, do protótipo de uma novíssima geração de caças, provavelmente envolvendo a Embraer. O projeto inicialmente consistia na compra de 8 a 12 caças para modernizar a frota brasileira, a um custo aproximado de US$ 700 milhões. Desde o ano passado, a Aeronáutica retomou as sondagens a grandes fabricantes, numa compra que poderia chegar a vários bilhões de reais.

Jobim revelou que duas alternativas serão postas à mesa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A primeira é de fazer a aquisição de caças de quarta geração - como o Rafale francês ou o Sukhoi russo - barganhando "ao máximo" a transferência de tecnologia. Outra opção é deixar essa compra de lado e investir todos os recursos com quatro finalidades: a modernização dos sistemas de armas dos caças já disponíveis na frota da FAB; o avanço de projetos próprios de veículos não-tripulados (primeiro de monitoramento e, depois, de combate); investimentos "maciços" em recursos humanos na Aeronáutica; e o desenvolvimento de uma quinta geração de caças. É um projeto "de décadas, não de anos", em que o objetivo "é mais aprender do que fabricar", disse Mangabeira.

Na Marinha, a prioridade total é o desenvolvimento do submarino de propulsão nuclear, mas outras ações incluem a redistribuição territorial das tropas, hoje excessivamente concentradas no Rio de Janeiro. No Exército, a intenção é priorizar a Força de Ação Estratégica Rápida, extremamente móvel e flexível, que abrange 10% do contingente da Força. Jobim deixou clara a necessidade de reforçar a presença militar na Amazônia, onde o contingente militar é de 27.236 homens - quase 80% do Exército. "Temos de redimensionar inclusive o tamanho do efetivo."