Título: SDE pede pena máxima ao cartel dos gases
Autor: Basile , Juliano
Fonte: Valor Econômico, 20/05/2008, Empresas, p. B7

A Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça pediu a aplicação de pena máxima por formação de cartel contra as empresas White Martins, AGA, Air Liquide e Air Products. As empresas são acusadas de organizar um "sofisticado cartel" para fraudar licitações públicas e dividir clientes com prejuízos para vários setores da economia, como saúde, alimentos, bebidas e metalurgia. Agora, correm o risco de pagar 30% dos seus faturamentos - a punição máxima da Lei Antitruste (nº 8.884). Somente com relação à White Martins a multa seria equivalente a R$ 513 milhões.

A SDE também pediu a punição máxima a sete executivos dessas empresas. Eles podem ter de pagar multas de 10% a 50% do total aplicado a cada empresa. A Indústria Brasileira de Gases (IBG) também aparece entre as rés, mas com pedido de multa inferior pelo fato de ter ingressado no cartel depois de seu início. Um executivo desta empresa também está no rol dos processados. O caso será encaminhado hoje para o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) que fará o julgamento final, determinando a aplicação das penas ou absolvendo as empresas citadas.

De acordo com a SDE, as vítimas imediatas do cartel foram hospitais públicos, privados, revendedores e distribuidores de gases industriais. No processo, a secretaria descreve um "sofisticado cartel de abrangência nacional no mercado de gases industriais e medicinais, pelo qual uma empresa respeitava a carteira de clientes das outras". E alerta para a gravidade da conduta, que teria levado hospitais a comprarem menos gases para atender pessoas doentes.

A denúncia de cartel no setor chegou às autoridades antitruste do Ministério da Justiça em dezembro de 2003 através de uma fonte anônima, por telefone. Essa fonte informou que a White Martins, a AGA, A Air Products e a Air Liquide manipulavam lances em licitações públicas e dividiam clientes.

-------------------------------------------------------------------------------- As vítimas do cartel foram hospitais públicos, privados, revendedores e distribuidores de gases industriais --------------------------------------------------------------------------------

A apuração levou a SDE a identificar um código entre as empresas. Elas se comunicavam através de um sistema de cores em planilhas. A White Martins seria verde, a Air Products usaria o amarelo, a AGA seria vermelho e a Air Liquide, azul.

Em fevereiro de 2004, as investigações chegaram ao Judiciário. O Ministério Público de São Paulo pediu a abertura de investigação criminal contra as empresas e o pedido foi aceito pela 15ª Vara Criminal da capital paulista. Foi realizada ação de busca e apreensão de documentos na sede das companhias, e a leitura do material coletado levou à inclusão da IBG no processo. A SDE chegou a concluir um parecer em janeiro de 2007, mas as empresas ingressaram na Justiça contestando a produção das provas e conseguiram adiar a conclusão final do caso na secretaria - o que só ocorreu efetivamente ontem.

O principal argumento de defesa das empresas foi o de que elas possuíam diferentes percentuais de participação de mercado, o que mostraria a inconsistência de um cartel no setor. Mas, as autoridades antitruste do Ministério da Justiça consideraram que foi justamente a falta de competição entre as empresas que levou à manutenção de percentuais diferentes de participação de mercado. Segundo a SDE, uma das facetas do cartel "era o estabelecimento de um pacto de não agressão por meio do qual as carteiras de clientes, tanto industriais como medicinais, eram mantidas intactas". "É evidente que para que se mantivessem estáveis os 'market shares' não poderia haver disputa por clientes."

As empresas também se defenderam dizendo que a troca de clientes era constante, o que seria impossível num cartel. Porém, a SDE concluiu que esta troca existia justamente para compensar eventuais "infrações" ao cartel. Ou seja, quando uma empresa "furava" as determinações do cartel, era punida com o repasse de seu cliente para outra companhia. O cartel era monitorado, insistiu a secretaria, e, neste ponto, era "extremamente sofisticado" chegando ao ponto de determinar como as empresas deveriam se portar diante de novas oportunidades de negócios.

Para chegar à pena máxima, a SDE considerou também o fato de as empresas já terem sido condenadas em outros países e, mesmo assim, terem repetido a prática de cartel no Brasil. Há condenações na Europa, no Canadá, na Argentina e no Chile.