Título: Quem protege também desrespeita
Autor: Luiz, Edson
Fonte: Correio Braziliense, 26/02/2011, Brasil, p. 12

Em 2010, as reclamações contra os serviços de atendimento à mulher quase dobraram em todo o país ¿ de 2.774, em 2009, para 5.302. A falta de providências sobre os boletins de ocorrência e a recusa em registrar queixas continuam entravando as denúncias de agressões e ameaças. Elas reclamam da omissão, mas querem, cada vez mais, saber sobre a Lei Maria da Penha, que penaliza com mais rigor a prática de violência contra as mulheres. Das quase 735 mil ligações que chegaram à Central de Atendimento à Mulher, o Ligue 180, mais da metade buscava informações sobre a legislação. Outros 108 mil registros eram relatos de agressões, cárcere privado e ameaças.

No ano passado, 5.302 pessoas recorreram à Central de Atendimento para denunciar quem deveria atendê-las. As delegacias comuns foram as campeãs em reclamação, com 2.308 casos. Os estabelecimentos especializados em atendimento das mulheres, como delegacias e postos, e o serviço 190 totalizaram mais de 2.200 registros em 2010. As demais denúncias foram contra fóruns e defensorias públicas. O aumento das reclamações foi de 91,1% comparado a 2009.

A procura por um órgão público para denunciar um agressor nem sempre dá resultado. Mais da metade das reclamações feitas ao Ligue 180 se referem ao trabalho da polícia. Das ligações feitas à Central de Atendimento à Mulher, 3.650 foram relacionadas à falta de providências sobre o boletim de ocorrência, à recusa do registro de queixa, à omissão do agente público, ao atendimento inadequado ou ao despreparo em casos de violência doméstica. Além disso, o serviço recebeu denúncias de maus-tratos, mau atendimento, ausência de profissionais, demora no andamento do processo e até infraestrutura inadequada.

Para a ouvidora da Secretaria de Políticas para as Mulheres, Ana Paula Gonçalves, a questão do atendimento nas delegacias é um problema sério. ¿O aumento das reclamações é preocupante porque as delegacias são as portas de entrada da denúncia¿, diz Ana Paula. ¿A partir do momento em que a mulher toma a atitude de ir à delegacia e ela é maltratada, ela se sente prejudicada e acaba voltando para casa sob o risco de sofrer nova violência¿, acrescenta a ouvidora. Segundo ela, a secretaria está encaminhando todas as reclamações às secretarias de Segurança e ao Ministério Público dos estados para que acompanhem os casos e façam fiscalizações mais rigorosas nas delegacias.

Mas há números da Central de Atendimento que são comemorados pela secretaria. No ano passado, foram registrados 82,8% de casos a mais que em 2009, atingindo 734,4 mil atendimentos. Segundo a ouvidora, o crescimento das reclamações mostra um avanço e não um retrocesso. ¿Os dados nos mostram que as mulheres estão procurando mais a central e o serviço está se tornando referência para elas¿, diz Ana Paula. Isso, conforme a ouvidora, vem acontecendo a partir de uma divulgação maior do Ligue 180, principalmente em eventos envolvendo o sexo feminino. Mesmo assim, 108.026 mulheres relataram violência, sendo que 63,8 mil foram físicas.

Denuncie Além do Ligue 180, as denúncias podem ser feitas na Delegacia de Atendimento à Mulher. Em Brasília, o telefone é 3442-4300.

Maria da Penha para gays Ana Elisa Santana A Justiça do Rio Grande do Sul concedeu medida protetiva a um homem que afirmou estar sendo ameaçado pelo ex-companheiro. Com base na Lei Maria da Penha, o juiz Osmar de Aguiar Pacheco, da cidade de Rio Pardo, determinou que o acusado fique a pelo menos 100 metros de distância do denunciante. Na decisão, o magistrado afirmou que qualquer pessoa em situação vulnerável pode se tornar vítima, independentemente do sexo. ¿Ao lado do Estado democrático de direito, há, e sempre existirá, parcela de indivíduos que busca impor, porque lhe interessa, a lei da barbárie, a lei do mais forte. E isso o direito não pode permitir.¿

A medida, decretada na última quarta-feira, é a primeira em que a lei ¿ criada em agosto de 2006 para proteger as mulheres de agressões domésticas ¿ é aplicada em relações homossexuais. O pioneirismo pode ajudar em decisões relacionadas à união homossexual no Supremo Tribunal Federal (STF), segundo o presidente da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transexuais (ABGLT), Toni Reis. ¿Nós ainda não temos nenhuma lei que proteja os nosso direitos. Então, os juízes têm que fazer uma ginástica mental para aplicar os conceitos constitucionais que dizem que todos são iguais perante a lei e que não haverá discriminação de qualquer natureza¿, afirma.

Balcão de queixas Além das denúncias de violência, o Ligue 180 registra reclamações contra os serviços de atendimento nos órgãos públicos

Órgão - Total de reclamações » Delegacias - 2.308

» Centros especializados - 1.147

» Fone 190 - 1.055

» Fórum - 180

» Defensorias públicas - 88

Tipo de reclamação - Total de registros » Falta de providências do BO - 939

» Recusa de registro de BO - 925

» Omissão - 691

» Atendimento Inadequado - 563

» Despreparo sobre violência do lar - 536

Dos quase 735 mil atendimentos feitos ao Ligue 180, cerca de 108 mil foram relacionados à violência. Confira a motivação das reclamações:

Tipo de violência - Total de casos » Física - 63.831

» Psicológica - 27.433

» Moral - 12.605

» Patrimonial - 1.839

» Sexual - 2.318

» Cárcere privado - 447

» Tráfico de mulheres - 73

Outros registros - Total de casos

» Lesão corporal - 58.714

» Ameaças - 15.324