Título: Lula quer levar 400 empresários à Argentina, mas só a metade deve ir
Autor: Leo, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 23/07/2008, Brasil, p. A2

Por determinação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o governo se esforça para transformar a visita que ele fará à Argentina, em 4 de agosto, em uma forte demonstração do setor privado brasileiro no mercado argentino. Lula quer manifestar apoio à presidente Cristina Kirchner, que enfrenta uma crise inédita no governo, com a queda dos índices de popularidade, desmoralização da política econômica e a derrota, no Congresso, da tentativa de tributar exportadores. Lula gostaria de visitar Cristina acompanhado de 400 empresários brasileiros. Deve ir com bem menos que isso.

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) prometeram ajuda ao presidente e vêm se empenhando em motivar os empresários com a missão, que permitirá os executivos contatarem diretamente as habitualmente arredias autoridades argentinas. No início do mês, o diretor do Departamento de Relações Internacionais e Comércio Exterior da Fiesp, Ricardo Martins, fez uma missão exploratória a Buenos Aires, onde se reuniu com os líderes da indústria no país.

"A receptividade lá é enorme, eles estão buscando soluções, em matéria de vendas, joint ventures, fontes de financiamento", disse. "Nosso entrosamento foi muito grande, estamos vendo essa viagem com entusiasmo." A Fiesp mobilizou uma operação de telemarketing para convidar empresários brasileiros para a missão que acompanha Lula: enviou mensagens por e-mail para 15 mil sócios e mais 9 mil associados do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp), além de contatos diretos com empresas de grande porte e forte interesse na Argentina. Até agora, cerca de 50 se inscreveram por e-mail, e esses se somam a outros 45 grandes empresários que já confirmaram participação.

Nos contatos de governo feitos pelo Itamaraty com a equipe de Cristina Kirchner, os argentinos apontaram setores como os de autopeças, software, eletroeletrônico, metalúrgico e a agroindústria, como "carentes de investimento" em que o governo local teria interesse em apoiar a instalação e ampliação de fábricas e instalações. Em 2007, 60% dos investimentos brasileiros na Argentina foram dirigidos à aquisição ou ampliação de empresas já existentes, quase 32%, porém, foram para novos empreendimentos. O restante destinou-se a associações ou terceirização de atividades.

Martins afirma que a Fiesp está apostando em "qualidade, mais que quantidade" para compor a missão que acompanhará a visita de Lula. O Itamaraty planeja levar à Argentina representantes de 10 a 12 setores, entre eles o de têxtil e calçados, bens de capital, indústria naval, alimentos e bebidas, turismo madeira e móveis e software. O governo e empresários querem levar também setores que encontram dificuldades com a concorrência na Argentina, como o de eletrodomésticos de linha branca, que enfrentam barreiras nas vendas ao mercado vizinho.

"Queremos mostrar que não estamos indo para comprar o que resta, como alguns temem", diz Martins, que tem sócio argentino em um empreendimento metalúrgico, e viu, principalmente na mídia Argentina, comentários preocupados sobre a voracidade dos investimentos brasileiros.

A Fiesp, que vê a viagem com Lula como uma missão precursora para uma nova missão empresarial à Argentina, em outubro, pretende pôr lado a lado empresas e associações do mesmo setor nos dois países, para avaliar possibilidades de atuação conjunta.

Dificilmente, porém, governo e empresários conseguirão reunir mais que 200 executivos para uma viagem em pleno período de férias, em meio às incertezas sobre o futuro da política econômica argentina, agravadas com as denúncias de manipulação dos índices de inflação e pelos desentendimentos entre a Casa Rosada e o setor produtivo. Para a diplomacia brasileira, porém, a viagem poderá servir para estreitar os laços entre os empresários e, numa perspectiva otimista, até usar os laços políticos entre os governos para encontrar uma fórmula de conciliação dentro da própria argentina.