Título: STF tem sido favorável a habeas
Autor: Basile , Juliano
Fonte: Valor Econômico, 23/07/2008, Finanças, p. C8

O Supremo Tribunal Federal (STF) tem concedido habeas corpus para manter em liberdade pessoas presas em operações consideradas "espetaculares" da Polícia Federal. Essa tendência deve ser confirmada em agosto, no julgamento do investidor Daniel Dantas e da diretoria do Opportunity.

Em julgamentos recentes, ministros do STF examinaram as principais polêmicas envolvendo a prisão dos envolvidos na Operação Satiagraha: supressão de instâncias (o fato de o STF decidir antes de o caso passar por todas as instâncias do Judiciário), exposição dos presos à mídia, uso de interceptações telefônicas para fundamentar prisões e necessidade de manter o suspeito preso para não afetar a investigação. Em todos os casos, o tribunal derrubou alegações da PF nesses quatro pontos.

Há três casos-chave para entender a jurisprudência do STF no assunto: as prisões do ex-prefeito paulistano Paulo Maluf e do banqueiro Edemar Cid Ferreira e o processo por sonegação contra o publicitário Roberto Justus. No julgamento de Maluf, em 2005, o STF concluiu que poderia ignorar súmula do próprio tribunal para puxar processos para si caso constatasse abusos nas instâncias inferiores. Maluf e seu filho Flávio foram presos por tentar interferir nas investigações de lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Foram pegos em escuta telefônica tentando induzir o depoimento de um doleiro.

A súmula 691 determina que não cabe ao STF analisar pedido de habeas corpus caso tribunal inferior o tenha negado. Era esse o caso, mas, no julgamento, o então ministro Carlos Velloso (hoje aposentado), argumentou que essa súmula pode ser superada quando se trata de liberdade de locomoção . Ele considerou que Maluf tinha endereço certo e se apresentou às autoridades; logo, não teria a intenção de fugir. Quanto às conversas com um doleiro, Velloso concluiu que se tratava apenas da estratégia de defesa. Votou pelo habeas corpus e foi seguido pelos ministros Gilmar Mendes, Celso de Mello, Cezar Peluso e Nelson Jobim.

No caso de Justus, o STF determinou a extinção da ação penal. Os ministros consideraram a alegação da defesa de que o suposto débito tributário de Justus estava em julgamento no Conselho de Contribuintes e, portanto, não havia ainda crime tributário. Peluso chegou a sugerir o cancelamento da Súmula 691, mas foi contido pelos demais que viam nisso risco de proliferarem pedidos de habeas corpus ao STF. "A Corte é humana e com determinada capacidade de jurisdição", afirmou o então ministro Sepúlveda Pertence, reforçando a tendência de que o STF irá agir contra decisões de outros tribunais se verificar abusos.

No julgamento do habeas de Edemar, acusado, em 2006, de gestão fraudulenta do Banco Santos, os ministros fizeram um desabafo contra o uso de gravações telefônicas e interceptações de e-mails. Eros Grau atacou a interceptação de mensagens trocadas entre o banqueiro e seus advogados. "Essa escalada de invasão de privacidade poderá nos levar a um triste e doloroso destino. Os próximos seremos nós", advertiu.

"Vê-se, de pronto, que se trata de prova ilícita insusceptível de fundamentar decreto de prisão", completou Peluso. Gilmar Mendes concluiu que a prisão estaria funcionando como "antecipação da pena", o que seria incompatível com os princípios da presunção de inocência e da dignidade humana. Pressões da imprensa não devem servir de parâmetro para o tribunal, argumentou.