Título: Esse dinheiro não chega pra nós, diz moradora
Autor: Chico Santos
Fonte: Valor Econômico, 05/08/2008, Especial, p. A14

Camila de Almeida, 18 anos, mãe de Maicon (4) e Nícolas (2), vai votar em Rosinha: "Os políticos são todos mentirosos" Camila de Almeida, 18, é mãe solteira de dois filhos, Maicon, de 4 anos e Nícolas, de 2. Mora sozinha com os filhos no Parque Guarus, margem esquerda do Paraíba do Sul, o rio que divide Campos ao meio, física e socialmente. Ainda estuda (5ª série) e ganha cerca de R$ 200 por mês como "babá eventual". Depende da ajuda da mãe, diarista, 10 filhos, para sobreviver. Começo de noite, com os filhos, uma irmã pequena e um sobrinho, aguarda a mãe na barraca de um camelô amigo para voltarem juntas para casa. Vai votar este ano pela 2ª vez, mas já traz a marca da desesperança nos olhos e na fala: "Já perdi a esperança de mudar. Royalties? Não chega para nós. Os políticos são todos mentirosos", responde. Futuro? "O melhor que puder". Planos? "Trabalhar, estudar e me formar", responde, sem convicção. Ainda assim, votará em Rosinha. "Ainda acho que Garotinho (marido da candidata) pode ser uma solução", afirma.

A falta de esperança e a decepção com a riqueza dos royalties foi a tônica da maioria dos entrevistados, escolhidos aleatoriamente pela reportagem do Valor, especialmente em Campos e Macaé, justamente os mais ricos. "Quando começou essa coisa de royalties a gente tinha tanta esperança que temia uma invasão de Campos por gente de fora. Foi só ilusão e corrupção para enriquecer os políticos", responde Muab Oliveira, dono de uma lojinha de confecções no shopping popular de Campos. Outro comerciante, Evanil Rangel dos Santos, 62, faz coro: "Campos está acabada. Não tem indústria, não tem desenvolvimento".

Em Macaé, Valdemir da Cunha Ramos, 47, ganha a vida vendendo nas ruas açaí, quando o tempo está firme, e guarda-chuva, quando o tempo muda. Casado, dois filhos, mora na Nova Holanda, uma das muitas favelas da cidade. "Essa renda (dos royalties) não está chegando à população de maneira nenhuma. Quando chove, fica tudo cheio", afirma enquanto atende à freguesia do mercado municipal de peixes.

Ali ao lado fica o restaurante popular da cidade, que serve cerca de 1.000 refeições por dia a R$ 1,00. Uma enorme fila se forma no almoço. Quem chega primeiro garante senha. Bárbara Lima, 30, quatro filhos, moradora da favela Nova Malvinas, abre o verbo na fila: "Não tem nada de bom (onde ela mora). Tudo lá é jogado no rio. Agora, perto das eleições é que começam os despistes (obras emergenciais). Esse dinheiro (dos royalties) só pode estar enchendo os bolsos de algum ricaço".

Restaurante popular, ônibus a R$ 1,00, com o valor restante da passagem de R$ 2,10 (em Cabo Frio) sendo complementado pela prefeitura (R$ 550 mil por mês) são algumas das ações sociais classificadas pela pesquisadora Sílvia Pantoja como neopopulistas que existem na região dos royalties, ao lado de programações vistosas, como shows de artistas famosos. Além do efeito duvidoso no combate à pobreza, essas ações nem sempre atingem apenas o público-alvo. "Ajuda no orçamento da casa", diz a jornalista Débora Medeiros, 42, aguardando com as duas filhas sua vez na fila do restaurante popular de Macaé.(C.S.)