Título: Fórum empresarial defende aprovação de acordo entre fiscos de Brasil e EUA
Autor: Watanabe , Marta
Fonte: Valor Econômico, 15/08/2008, Política, p. A7

Um pequeno grupo de empresas iniciou esta semana uma ofensiva para defender o acordo bilateral para troca de informações entre Brasil e Estados Unidos. Formado por executivos de dez empresas brasileiras e dez americanas, o grupo, auto-denominado como Fórum de CEOs Brasil-Estados Unidos, defende que o texto do acordo bilateral é constitucional e não viola o direito à privacidade ou ao sigilo de dados e nem submete contribuintes ao risco de ter informações utilizadas para outros fins que não os de fiscalização tributária. Entre as brasileiras integrantes do fórum estão Coteminas, Gerdau, Vale e Embraer (ver quadro).

A interpretação do grupo de CEOs colide com a defendida até agora pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Procurada ontem, a assessoria de imprensa da entidade informou que a Fiesp mantém suas declarações iniciais sobre o acordo e que deverá avaliar o assunto em reunião de seu conselho jurídico até o fim de agosto. A federação se declara a favor da fiscalização e da transparência, mas diz que o texto em análise no Congresso permite "praticamente a troca livre de informações".

O texto do acordo bilateral em análise pelos parlamentares é resultado de um consenso entre os fiscos americano e brasileiro. O tratado já foi assinado pela Receita Federal e pela Embaixada dos Estados Unidos, mas precisa da aprovação no Congresso para entrar em vigor. Os parlamentares devem decidir se aprovam ou rejeitam os termos do acordo. Não é possível fazer emendas ao texto.

O projeto de decreto legislativo do acordo já havia sido aprovado por duas comissões, mas emperrou na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. O texto foi alvo de debate na última quarta-feira em audiência pública solicitada pelo deputado Paulo Bornhausen (DEM-SC), um dos que defendem que o acordo é perigoso e pode colocar em risco o sigilo de informações.

Flávio Leite, coordenador técnico do grupo de CEOs diz que existe uma grande preocupação de que a rejeição do acordo para troca de informações comprometa as negociações em curso em prol de um acordo para evitar dupla tributação entre Brasil e Estados Unidos. "O intercâmbio de informações é pré-requisito para avançar no tratado de bitributação e é um gesto político do país nessa direção", diz. Segundo ele, uma das prioridades do grupo sempre foi o acordo para evitar dupla tributação. De acordo com cálculos da Gerdau, um tratado nesse sentido reduziria de 56,4% para 47,3% a carga tributária de Imposto de Renda sobre a repatriação de lucros das unidades que as empresas brasileiras mantêm em terras americanas. "Isso tira nossa competitividade com as empresas situadas nos demais países do BRIC", diz, referindo-se à Rússia, Índia e China.

Em nota, o empresário Jorge Gerdau Johannpeter, presidente do Conselho de Administração da Gerdau, diz que, embora tratadas em acordos diferentes, as questões de intercâmbio de dados e bitributação são complementares e estão vinculadas, "sendo que não há razão para a existência de um sem a criação do outro".

O deputado Paulo Bornhausen (DEM-SC), não dá importância ao receio de que a rejeição do acordo comprometa o futuro do acerto sobre o fim da bitributação. "Não temos qualquer garantia dos Estados Unidos de que, uma vez aprovado o acordo atual, poderemos firmar um segundo acordo, sobre bitributação", afirma o deputado. "Só estamos aprovando o que é bom para os Estados Unidos. O que é bom para nós, que é o fim da bitributação, não vai acontecer."

Heleno Taveira Torres, professor da Universidade de São Paulo que criticou o texto do acordo sobre troca de informações na audiência pública também discorda do grupo de CEOs. "Entre os direitos fundamentais do cidadão e os interesses econômicos de poucas empresas já submetidas a um transparência plena em função de questões de mercado, fico com a proteção dos direitos."

Torres diz que os Estados Unidos só mantêm acordos para troca de informações com paraísos fiscais. "As exceções são México, Peru e Colômbia, mas esses países têm um alto grau de dependência econômica dos Estados Unidos, o que não acredito ser o caso do Brasil", diz o professor. Segundo ele, nenhum desses países têm acordos para evitar bitributação com os EUA. "Os americanos não têm acordos para troca de informações com outros países desenvolvidos ou em desenvolvimento."

Em nota ao Valor, a Receita Federal diz que desde 2006 autoridades do Brasil e EUS consideram o acordo para troca de informações como um passo importante para o tratado de bitributação. O órgão diz que a a tramitação do texto do acordo para troca de dados não interrompeu os encontros para avançar na negociação do acordo para evitar dupla tributação.

Assinada por Marcus Vinicius Vidal Pontes, chefe da assessoria de assuntos internacionais da Receita, a nota assinala que "as discussões na CCJ fazem parte do processo democrático e a tramitação segue os prazos normalmente observados em atos internacionais desta natureza. Portanto, o tempo que está sendo consumido na apreciação do Congresso Nacional já foi levado em consideração pelas autoridades de ambos os países."