Título: Perigo aumenta
Autor: Oliveto, Paloma
Fonte: Correio Braziliense, 14/03/2011, Mundo, p. 12

Natureza em fúria Técnicos japoneses têm dificuldade para resfriar reator de usina nuclear e governo admite possibilidade de derretimento dos núcleos, o que levaria à exposição radioativa

A segunda-feira começou no Japão com o risco iminente de mais explosões nas usinas nucleares. Técnicos de Fukushima anunciaram que, além da ainda grave situação no reator 1, a unidade 3 não respondeu à tentativa de resfriamento. O porta-voz do governo, Yukio Edano, admitiu à televisão japonesa a possibilidade de os núcleos dos dois reatores estarem derretendo parcialmente, situação que levaria à liberação de material radioativo na atmosfera. Para piorar, duas outras usinas, Onagawa e Tokai, entraram em pane, embora as autoridades tenham garantido que conseguiram controlar seus reatores. Os problemas também são consequência do terremoto de 11 de março, que, ontem, foi elevado para magnitude 9.

Por algumas horas, a usina de Onagawa, na costa do estado de Miyagi, o mais próximo do epicentro do terremoto, entrou em emergência, depois que foram detectados níveis de radioatividade mais altos do que os permitidos, segundo um comunicado da Agência Internacional de Energia Atômica. Mas a companhia de energia elétrica do Japão, a Tohoku Electric Power Company (Tepco), garantiu que os três reatores estavam controlados e que a radioatividade era proveniente das fugas das centrais de Fukushima, a 100km do local. Para provar que os níveis tinham voltado ao normal, as autoridades cancelaram, no início da tarde, o estado de emergência. Em Tokai, a 120km de Tóquio, o reator precisou ser resfriado pelo único gerador elétrico dos três existentes. Os demais falharam depois do terremoto. De acordo com a Tepco, porém, a situação foi controlada ao longo do dia.

Já em Fukushima, o nível de radiação no reator 3 estava acima do aceitável devido a uma falha na tentativa de liberar a pressão do interior da unidade, de acordo com a Tepco. As válvulas que deveriam lançar o vapor não funcionaram e, mesmo depois de consertadas, o nível de água continuava baixo. Além disso, uma câmara de contenção secundária do reator apresentava acúmulo de hidrogênio, aumentando o risco de explosão.

Se isso acontecer, a situação poderá ser mais grave do que a registrada no sábado, quando o excesso de gás de hidrogênio levou para os ares o telhado da câmara que protege o reator 1. Na unidade 3, além de urânio, é utilizado plutônio como combustível. No caso de derretimento, esse elemento, misturado ao urânio, torna-se mais perigoso porque aumenta a volatilidade do material. O Instituto de Radioproteção e Segurança Nuclear da França afirmou que ¿novos vazamentos de produtos radioativos ocorreram ao redor do reator 3 por causa da despressurização do recinto de confinamento¿, medida tomada para conter a fundição do núcleo.

Na tentativa de acalmar a população, o primeiro-ministro japonês, Naoto Kan, fez um discurso transmitido pelas emissoras de tevê. ¿A situação é preocupante, houve liberação de radiação no ar, mas não há nenhum dado que indique que a quantidade de radiação tenha sido grande¿, afirmou. ¿O que ocorreu é totalmente diferente do acidente de Chernobyl¿, disse, referindo-se ao desastre nuclear da Ucrânia, em 1986. ¿Estamos trabalhando para impedir que os danos se estendam¿, garantiu Kan.

Uma das medidas adotadas foi a continuidade da evacuação das cidades construídas no entorno da usina. Até agora, pelas contas da Oficina de Coordenação de Ações Humanitárias das Nações Unidas, 210 mil pessoas deixaram suas casas, e 380 mil estão vivendo nos cerca de 2 mil abrigos do país. Embora o primeiro-ministro insista que os danos à saúde da população serão mínimos, as autoridades orientaram os moradores do estado de Fukushima a sair de casa com máscaras e capas de vinil descartáveis, para diminuir o risco de contaminação.

A Agência de Segurança Nuclear e Industrial do Japão, vinculada ao Ministério da Economia, divulgou que, de 100 pessoas que foram evacuadas da cidade de Futaba, em Fukushima, nove foram expostas à radiação, mas em baixos níveis. Um segundo grupo, de 60 indivíduos, também passou por testes, mas os resultados não foram divulgados.

Para especialistas, embora a situação seja grave, não há riscos de se repetir o acidente de Chernobyl. ¿Lá, cerca de 10 bilhões de curies de material radioativo foram liberados¿, explicou ao Correio o engenheiro nuclear Robert Zubrin. Segundo ele, uma comparação mais plausível é com o acidente de Three Mile Island, ocorrido nos Estados Unidos em 1979 e classificado em nível 5, enquanto que o do Japão foi considerado nível 4. ¿Em Three Mile Island, apenas 6 curies foram lançados¿, conta Zubrin. Em uma audioconferência de imprensa, o físico Ken Bergeron, que trabalha com simulação de acidentes em reatores, disse que uma falha total nos sistemas de resfriamento ¿é considerada extremamente improvável¿.