Título: Kadafi na ofensiva
Autor: Tranches, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 15/03/2011, Cidades, p. 25

Sem ajuda do Ocidente, rebeldes não conseguem conter os ataques aéreos do ditador líbio

Beneficiado pelo impasse de nações ocidentais que até ontem não haviam se decidido sobre uma intervenção militar na Líbia, o ditador Muamar Kadafi, por meio de suas forças leais, avançou sobre regiões tomadas por insurgentes, no leste do país. Reunidos na França, chanceleres do G8 (oito países mais industrializados do mundo) iniciaram ontem as discussões sobre a possível criação de uma zona de exclusão aérea na Líbia. A Liga Árabe já declarou que apoia a medida, mas a Rússia opôs-se à intervenção e EUA, Itália e Alemanha apresentaram reservas à decisão, que tem o apoio da França.

A zona de exclusão aérea é um pedido dos próprios líderes da oposição, que apelam à ajuda internacional para limitar as ações de Kadafi. Ontem, a cidade de Ajdabiya, a 160km de Benghazi, principal reduto rebelde, foi atingida por quatro obuses (artilharia semelhante a morteiro) lançados pelas forças do governo. Eles caíram nas imediações da saída oeste da cidade, também localizada a 80km de Brega, palco de confrontos entre insurgentes e apoiadores de Kadafi no domingo. A região é um enclave crucial e, uma vez tomada pelo governo, deixaria os rebeldes encurralados. Com o recrudescimento dos ataques, aumenta o temor da oposição de que Benghazi seja atacada em breve.

Enquanto isso, um dirigente da rede Al-Qaeda, Aou Yahya al-Libi, pediu aos rebeldes que prossigam com os combates, em um vídeo divulgado no domingo na internet. Esta foi a primeira reação da Al-Qaeda, a quem Kadafi atribui a rebelião desde o início dos protestos, em 15 de fevereiro.

O engenheiro civil líbio Moataz Zayed Solima, que deixou a cidade de Benghazi há três dias e seguiu para o Egito para fugir dos confrontos, disse, em entrevista ao Correio, que há muitas informações desencontradas sobre possíveis ataques à cidade. Ele afirmou que a população tem recebido mensagens em seus celulares de que o governo retomou o controle em vários pontos da região e que suas forças estão seguindo para Benghazi. ¿Mas as pessoas sabem que isso é parte da propaganda do governo¿, diz.

Apesar de ter se refugiado no Egito, o engenheiro garante que a situação em Benghazi é de segurança. ¿Do ponto de vista lógico, do balanço de forças entre as tropas de Kadafi e os rebeldes, não há como os insurgentes vencerem esta guerra. Mas se você perguntar minha opinião, acredito que, se Deus quiser, vamos vencer e todo o país ficará livre desse tirano.¿

Petróleo Kadafi luta com todas as armas para desestabilizar os opositores. Ontem, forças armadas líbias anunciaram que os soldados que se uniram à rebelião serão ¿perdoados¿ caso decidam se entregar. Na esfera internacional, em uma retaliação ao Ocidente, o governo líbio convidou empresas da Rússia, da Índia e da China para explorar as reservas de petróleo do país. A oferta se segue às ameaças de Kadafi de expulsar companhias ocidentais, devido ao apoio de seus governos aos rebeldes.

Ontem, o ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, afirmou que, a não ser que a decisão seja aprovada pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, nenhum país adotará medidas unilaterais contra a Líbia. Após participar do Encontro Empresarial Brasil-Uruguai, em São Paulo, ele disse ter conversado com a Alta Representante da União Europeia para Relações Exteriores, Catherine Ashton, por telefone, que garantiu que qualquer decisão que envolva intervenção contra a Líbia terá de ser discutida na ONU. Segundo o chanceler, a posição coincide com o ponto de vista brasileiro.