Título: Brasil perde US$ 2,5 bilhões ao ano
Autor: Neila Baldi
Fonte: Gazeta Mercantil, 31/08/2004, Agribusiness, p. B-12

Entraves entre as lavouras e o porto poderão se agravar caso a safra 2004/05 seja maior. O agronegócio brasileiro perdeu US$ 2,5 bilhões na safra 2003/04 devido a entraves nas exportações. Segundo levantamento da Bunge Brasil, encaminhando ao governo federal, metade deste prejuízo ocorreu na chegada ao porto e o restante no embarque. Especialistas dizem que, se em 2005 a safra for cheia, o problema será maior. Além disso, o Brasil poderia perder compradores devido à demora e aos custos das exportações.

O levantamento feito pela empresa considerou as perdas de produção no transbordo e os dias de espera para o embarque das mercadorias. Segundo Adealgiso Telles, diretor corporativo da Bunge Brasil entre a lavoura e o porto, há perdas devido às estradas inadequadas, à armazenagem e à infra-estrutura e logística. No embarque, o problema é a demora. De acordo com o estudo, em média, a safra 2003/04 - considerando-se soja, milho, café e açúcar - perdeu até 15 dias para ser embarcada, o que causa um custo adicional de sobreestadia (até US$ 35 mil por dia).

"Só não teve apagão logístico por causa da quebra de safra", diz Telles. Para ele, se a soja não sofrer impacto climático, o Brasil colherá até 64 milhões de toneladas na safra 2004/05. Sérgio Mendes, secretário-executivo da Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec), disse que o Brasil deixou de exportar 5 milhões de toneladas de soja devido à quebra na produção. "Se a safra for cheia realmente vai haver tumulto", afirma. Opinião semelhante tem o presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB), João Sampaio. Segundo ele, se a próxima colheita for do tamanho deste ano ou pouco maior, o agronegócio vai sofrer e perder muito com a falta de infra-estrutura.

Segundo o levantamento, o maior problema ocorre no porto de Paranaguá (PR), onde estima-se uma perda de US$ 400 milhões, seguido por Santos (SP), com perda de US$ 230 milhões e Rio Grande (US$ 150 milhões). Os três são os principais corredores de exportação dos grãos brasileiros.

Para Telles, estes problemas prejudicam a exportação brasileira, pois o custo de transporte aumenta, o prêmio pago pelo produto cai e o País ainda corre o risco de ver reduzidas as suas exportações, uma vez que no segundo semestre há concorrência com a safra do Hemisfério Norte.

De acordo Mendes, o preço da soja brasileira este ano foi US$ 16 por tonelada inferior ao dos concorrentes, sendo US$ 13 por tonelada devido à distância e US$ 3 por tonelada em decorrência do custo portuário. Outro problema no escoamento da produção, segundo Mendes, foi a proibição, pelo governo do Paraná, de exportação de soja transgênica por Paranaguá, provocando procura por outros portos, elevando o tempo de espera e encarecendo o frete em até US$ 5 por tonelada.

Nicho de mercado

Segundo a assessoria de imprensa do porto, os não-transgênicos são considerados nicho de mercado para o governo. A assessoria informa que, apesar disso, o volume de grãos exportados pelo porto aumentou - 35 milhões de toneladas até o momento para 33,5 milhões de toneladas em todo o ano de 2003. Além disso, segundo a assessoria, o tempo de espera é de dois a três dias para o navio embarcar.

Os exportadores de café também reclamam dos entraves nos portos. De acordo com o Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) em março deixavam de embarcar 300 mil sacas (60 quilos) do grão. Atualmente, são 500 mil sacas. "Com essa demora, talvez não vamos atingir a meta de vendas externas para o ano", afirma Guilherme Braga, diretor do Cecafé. A expectativa é de que no segundo semestre, o País comercializasse com o exterior 16 milhões de sacas - além das 11 milhões de sacas exportadas entre os meses de janeiro e junho.

Segundo Braga, o problema para as exportações de café tem ocorrido com as empresas de navegação, com atrasos constantes, overbooking e falta de contêineres.

Ele diz ainda que, como os fretes subiram, há priorização para outras cargas, que anteriormente não usavam contêiner e sim graneleiros - em falta nos portos brasileiros. Além disso, ele acrescenta que poucos grupos concentram até 70% das exportações e têm maior poder de barganha. Por isso, eles conseguiram negociar a US$ 900 o contêiner, que agora está em até US$ 2.200. "Os entraves geram ingressos mais lentos de divisas, aumento dos custos para os exportadores devido a juros e sobredespesas. Além disso, pode acontecer de o comprador trocar de fornecedor", afirma Braga.

Sampaio enumera alguns dos problemas do agronegócio na exportação: as estradas, a falta de pessoal de fiscalização, os calados e a infra-estrutura dos portos. Segundo ele, o fato de o Brasil usar rodovia para distância longas encarece o frete em até quatro vezes frente aos Estados Unidos e Argentina.

Matriz inadequada

"Temos uma matriz de escoamento inadequada, pois enquanto a produção avança para o Centro-Oeste e Norte, os portos continuaram concentrados no Sul e Sudeste", avalia Mendes. Os problemas de logística e infra-estrutura no escoamento da safra brasileira poderiam ser resolvidos com investimentos. Segundo Mendes, nos próximos dias, a Anec irá solicitar ao governo que recapeie as estradas para estarem adequadas quando a safra 2004/05 começar a ser colhida.

Telles, diz que a Bunge Brasil tem aprovado para os próximos quatro anos US$ 320 milhões para investir em logística, sendo metade em terminais portuários, US$ 100 milhões em vagões e o restante em armazéns. No entanto, segundo ele, entraves burocráticos estão atrasando as obras - investimentos portuários têm prazo de 36 meses para a conclusão. Com a falta de licitações em alguns portos e a demora na liberação dos trâmites, Telles diz que nos últimos anos a Bunge tem investido na Argentina, pois não consegue aplicar os recursos no Brasil.