Título: Falta pouco para um novo recorde
Autor: Denise Bueno
Fonte: Gazeta Mercantil, 31/08/2004, Relatório - Seguros Patrimoniais, p. 1

Com vendas em alta, o setor de seguros conta com o crescimento sustentável da economia e a abertura do mercado de resseguros para superar os tempos do Plano Real. S e o ritmo de crescimento verificado no Brasil a partir de julho passado se mantiver, faltará pouco para o setor de seguros de riscos patrimoniais registrar o melhor momento de sua história. "Até maio, estava tudo estagnado. Acho que até as quadrilhas especializadas em roubo sentiram a estagnação do País, pois a carteira de transporte de cargas registrou queda brutal na sinistralidade no primeiro semestre do ano. Nem eles deviam ter encomendas", comenta ironicamente Casimiro Blanco Gomez, diretor da Porto Seguro. "Por outro lado, percebemos a venda teve alta a partir de maio, o que mostra que um volume maior de mercadorias está circulando da indústria de base para o fabricante e dele para o varejo", acrescenta.

Segundo executivos, caso se concretize o cenário de crescimento projetado pelo governo, principalmente com aumento da renda per capita, o setor poderá superar até mesmo os efeitos da estabilização da moeda com o Plano Real. Só o setor de seguros cresceu 188% entre 1995 e 2003, com o faturamento saltando de quase R$ 13 bilhões para R$ 37,3 bilhões.

O mercado de seguros, previdência e capitalização arrecadou R$ 28,2 bilhões em prêmios no primeiro semestre deste ano, o que levou o setor a um crescimento nominal de 17,12% sob o resultado obtido no mesmo período do ano passado, segundo estatística da Federação Nacional das Empresas Privadas de Seguros (Fenaseg), elaborada com base nos dados divulgados pela Superintendência de Seguros Privados (Susep), órgão que regulamenta e fiscaliza o setor. Segundo estudo do consultor Luiz Roberto Castiglione, a influência do VGBL, um seguro de vida voltado para a aposentadoria, é muito significativa. Excluindo-se o VGBL, o crescimento nominal apenas do setor de seguros ficou em 12% ou em 5% em termos reais.

"Se tudo caminhar bem, com o País crescendo, o governo estimulando o setor como fez com a redução do IOF e com o pacote tributário da previdência, projetamos gerar recursos superiores a R$ 220 bilhões até 2009, considerando-se as reservas técnicas e o capital das empresas que atuam no setor", avalia João Elisio Ferraz de Campos, presidente da Fenaseg. Em 2003, as reservas e o capital das companhias totalizou R$ 95 bilhões.

Para que o mercado de seguros cresça, os executivos citam algumas premissas básicas. A primeira delas é que a economia mantenha o ritmo de crescimento. "Se a economia não der um salto, o panorama fica igual ou um pouco pior para as seguradoras que ainda precisam se adequar ao novo cenário", diz Luiz de Campos Salles, presidente da Itaú Seguros.

Para Hélio Novaes, vice-presidente da SulAmérica Seguros, a queda nas taxas de juros provocou uma mudança radical no dia-a-dia das seguradoras e nos consumidores, que exigem produtos mais apropriados ao seu bolso, até o executivo que será mais pressionado pelo acionista para manter a rentabilidade da companhia nos patamares de anos anteriores. "O cenário vivido hoje pelas seguradoras e pelos segurados é outro. Temos uma economia em crescimento. Todos precisam de ganho de escala e rentabilidade. É um momento de grande amadurecimento e o mercado de seguros está preparado para crescer junto com o País", relata.

Em junho de 2004, o total de investimentos do mercado atingiu o volume de R$ 104 bilhões, sendo R$ 28,4 bilhões de patrimônio líquido das empresas, e R$ 75 bilhões de provisões técnicas. Praticamente tudo isso aplicado em títulos de renda fixa. Foi daqui que veio o ganho.

De acordo com um estudo do consultor Castiglione, a rentabilidade sobre as vendas caiu de 6% no primeiro semestre de 2003 para 5,1% em junho deste ano. "Uma queda nominal de 10,1% ou real de 4,2%", ressalta o consultor. O setor de seguros encerrou o primeiro semestre do ano com lucro líquido consolidado de R$ 2 bilhões contra R$ 1,49 bilhão do mesmo período de 2002, crescimento nominal de 36% ou real de 27,8%, descontando-se a inflação média do período (IGPM). Isso mostra que apesar do esforço das companhias em melhorar índices operacionais, a recuperação no resultado não foi possível em razão da quedas das taxas de juros do patamar médio de 26% no primeiro semestre de 2003 para 16% no primeiro semestre de 2004.

Atrair novos consumidores

Uma segunda premissa para que o setor cresça e também mantenha a rentabilidade do negócio é aumentar a base de consumidores por meio da popularização do seguro. "O poder aquisitivo reprimido da população brasileira oculta as maiores oportunidades para todos os mercados", comenta José Rudge, presidente da Unibanco-AIG Seguros. "Somos 170 milhões de brasileiros e poucos têm seguro", acrescenta Luiz Carlos Trabuco Cappi, presidente da Bradesco Seguros e Previdência. "A direção que o governo deu na redução do IOF foi muito positiva, pois beneficiou um seguro que tem forte impacto social, uma vez que paga indenização à família se algo acontece ao chefe da casa", diz Cappi. Desde que lançou o seguro de vida de R$ 9,90, que a partir de setembro, com a redução do IOF passará a custar R$ 9,50, já foram vendidas mais de 300 mil apólices.

Luís Luz, presidente da Companhia de Seguros Aliança do Brasil, que tem como sócio o Banco do Brasil e a Aliança da Bahia, confirma a tendência do seguro popular. Segundo ele, basta um esforço de venda para que se tenham números recordes. Um dos produtos que se destacou no primeiro semestre foi o BB Seguro Vida Mulher, com mais de 175 mil apólices vendidas até o último dia 12. Outro destaque foi o BB Seguro Vida, lançado no dia 19 de julho e voltado para a baixa renda, que vendeu 9,3 mil apólices em menos de um mês.

Já Campos Salles, da Itaú, assim como Novaes, da SulAmérica, são céticos quanto a capacidade de viabilizar os produtos populares com preços entre R$ 2 e R$ 4. Segundo Salles, por meio das agências bancárias é possível atingir as classes A, B e C. "As classes D e E terão acesso por meio dos seguros embutidos nas contas de consumo, como luz, gás, telefone", acredita Novaes.

Melhor comunicaçãoA terceira premissa passa pela melhora da imagem do setor. "As seguradoras precisam do choque da ouvidoria e do conhecimento. Vamos dar um salto de qualidade com a gestão do conhecimento e do ouvir o que os clientes têm a dizer", revela Cappi, acrescentando que "evidentemente que as condições macroeconômicas são marcantes para o desenvolvimento do País". A ouvidoria da Bradesco completa um ano em setembro, tem em média 1,1 mil casos mensais, o que representa menos de 1% das apólices em carteira. A UniverSeg, lançada em 13 de maio, conta com 3 mil inscrições.

Praticamente todas as companhias criaram ouvidorias, o que gerou uma forte redução no volume de queixas registradas pela Susep. A regulamentação para garantir os direitos dos consumidores vem se aperfeiçoando, desde as iniciativas que partem das próprias companhias como a que parte da Susep. Desde que Renê Garcia assumiu a presidência da Susep, em março de 2003, mais de oito resoluções já foram emitidas. Todas visando garantir o direito do consumidor. "À medida em que o cliente se sentir mais seguro, com certeza comprará mais planos de previdência e seguro, principalmente os produtos voltados para a poupança de longo prazo", acrescenta.

Uma iniciativa do setor que deverá ter um efeito positivo no curto prazo é a proposta das cláusulas referenciais para produtos empresariais, com riscos de até R$ 2 milhões, o que inclui também residências. Segundo Maria Elena Bidino, diretora da Fenaseg, o objetivo do trabalho, conduzido por profissionais especializados do setor e que ainda será aprovado pelas comissões, é evitar conflitos com o segurado trazendo um contrato transparente e objetivo.

"É trágico para o segurado descobrir que o prejuízo que ele sofreu não está coberto. E para o segurador também é muito ruim ter o segurado frustrado, pois ele vive de pagar indenizações e obter renovações", diz a executiva. O primeiro da fila é a cláusula de cobertura para danos elétricos, pois é a que mais tem apresentado problemas. A estimativa é de que até 2005 o novo clausulado entre em vigor.

Maior competição no resseguro

E a quarta, entre as iniciativas principais na busca de promover o desenvolvimento do mercado, estaria na inovação e na desregulamentação do setor. "Um capítulo a parte é o monopólio de resseguro", cita Cesar Saad, diretor executivo da Unibanco-AIG. Segundo o executivo, a condição de monopólio, num setor extremamente competitivo e dinâmico, tem sido o grande obstáculo para o desenvolvimento do mercado brasileiro, pois, devido a sua obrigatoriedade de prover de resseguro todas as seguradoras de forma uniforme, a diferenciação estabelecida por aquelas que investem em especialização e inovação se transforma apenas em custo adicional, em vez de vantagem competitiva. "O resultado é um ambiente desfavorável ao investimento em desenvolvimento de produtos e serviços, tornando as seguradoras reféns da guerra de preços, e às empresas brasileiras, que têm acesso limitado aos benefícios que um mercado de seguros maduro traz", analisa Saad.