Título: OAB afirma que substitutivo dos precatórios oficializa calote
Autor: Seabra, Marcos
Fonte: Gazeta Mercantil, 19/06/2008, Politica, p. A9

São Paulo, 19 de Junho de 2008 - A aprovação ontem pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado do substitutivo que altera as regras de pagamento dos precatórios atrasados de estados e municípios provocou a ira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a divisão dos partidos de oposição. O projeto, que vai à votação em Plenário, prevê, entre outros, a criação de um regime especial para o pagamento dos precatórios atrasados pelos estados e municípios, hoje uma dívida pública de aproximadamente R$ 100 bilhões. Os devedores destinariam a cada ano uma parte menor de sua receita corrente líquida para pagar essas dívidas. Estados e Distrito Federal reservariam entre 0,6% e 2% dessa receita, enquanto os municípios reservariam entre 0,6% e 1,5%. O presidente da OAB, Cezar Britto, e o senador Álvaro Dias (PSDB-PR), consideram que o substitutivo "legaliza o calote". Para o presidente da OAB, "se a situação hoje é de caos, a solução que se está propondo aumenta o caos". Na opinião de Britto, os percentuais fixados são muito baixos, fazendo com que as dívidas sejam pagas em períodos muito extensos. Nos Estados do Rio e Janeiro e São Paulo, por exemplo, segundo estimativa da OAB, a espera dos credores passará a ser, em média, de 50 anos. A briga dos precatórios opõe interesses de governadores e prefeitos aos de advogados e credores, principalmente em relação aos precatórios milionários. Foram os governadores que fizeram lobby para empurrar as dívidas de maior valor para o final da fila. Encabeçando o time de endividados que apóiam o projeto está o governador de São Paulo, José Serra (PSDB). O estado acumula a maior dívida com precatórios - cerca de R$ 17 bilhões, na frente da prefeitura da capital paulista, até 2006 comandada pelo próprio tucano, e o estado de Minas Gerais, que deve R$ 4 bilhões. O senador Valdir Raupp (PMDB-RO), em resposta ao tucano e o presidente da OAB, frisou que os precatórios em atraso, de acordo com o substitutivo, terão de ser pagos em, no máximo, 15 anos. "Conversamos com vários governadores, com entidades ligadas aos municípios, apenas com a OAB o diálogo não caminhou", disse Raupp. Já para o senador Antonio Carlos Júnior (DEM-BA), aliado de primeira hora dos tucanos no Congresso, o substitutivo "possui muitos pontos polêmicos", o que dificultaria a sua compreensão. "Muita coisa não está clara", avaliou o deputado do DEM. O senador Demóstenes Torres (DEM-GO), um dos defensores de mudanças no sistema, admitiu que as regras atuais são adequadas, mas ponderou que, no passado, não havia as limitações impostas pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Por causa disso, "muitos gastaram para que seus sucessores pagassem". Ao defender o substitutivo, o senador Valter Pereira (PMDB-MS) disse que "o que se está fazendo é uma opção entre o ideal e o possível". "E essa é a medida possível. Não é a ideal, mas a que se faz necessária", avaliou o senador por Mato Grosso do Sul. No final de maio, o senador Aloizio Mercadante (PT-SP) pediu urgência para a aprovação do texto, afirmando que "há prefeituras cujas receitas vêm sendo seqüestradas e também há pequenos precatórios que não são pagos devido aos grandes precatórios que travam a fila". Ele se referia, por um lado, ao seqüestro de recursos por determinação judicial (quando se bloqueiam as contas de um ente público que paga os precatórios atrasados) e, por outro, à modalidade de pagamento, prevista no substitutivo, que privilegia as dívidas de menor valor. Sob o ponto de vista de Álvaro Dias, as mudanças propostas "desmoralizam a Justiça, que condena (ao pagamento dos precatórios), mas é ignorada". Nesse contexto, o senador disse que a matéria "afronta a Constituição". Afirmou ainda, ao comentar a situação dos estados que têm grandes dívidas relacionadas aos precatórios, que o substitutivo oferece "um alívio" para os atuais governadores, mas permitirá o acúmulo de um passivo "que vai estourar nas costas dos próximos governadores a serem eleitos". O senador tucano disse ainda que o substitutivo "atende a estados e municípios, mas prejudica o cidadão credor". "Há credores que jamais receberão seus créditos", previu ele. Raupp, por sua vez, afirmou que "há um certo terrorismo quando se diz, por exemplo, que alguns credores terão de esperar quarenta anos para receber". "Injustiça é deixar como está. Nunca recebi visita de pequenos credores pedindo para deixar as regras sem alterações", comentou o relator, acrescentando que "a maioria dos precatórios de maior valor não está mais nas mãos dos credores originais, mas nas mãos de grandes escritórios de advocacia". No início de junho, o secretário-executivo da Frente Nacional de Prefeitos, Gilberto Perre, disse existir um mercado paralelo de precatórios no qual os credores originais venderiam essas dívidas a terceiros "com grande deságio". Perre afirmou "que aqueles que adquirem os precatórios com elevados deságios e apostam no seqüestro de receitas para lucrar estão interessados no insucesso desta tentativa de mudança". (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 9)( - Com Agência Senado)

-------------------------------------------------------------------------------- adicionada no sistema em: 19/06/2008 01:33