Título: Corpo nas mãos dos legistas
Autor: Santana, Ana Elisa
Fonte: Correio Braziliense, 06/05/2011, Brasil, p. 8

Familiares das vítimas do voo 447 da Air France que não chegou a completar a viagem do Rio de Janeiro a Paris em 31 de maio de 2009 começam a se sentir mais aliviados quase dois anos após o acidente. Um mês e um dia depois do anúncio de que restos mortais dos passageiros haviam sido encontrados na fuselagem do Air Bus A 330, a Direção de Polícia Militar francesa (DGGN, sigla em francês) anunciou ontem que um corpo içado chegou à superfície e foi levado a bordo do navio Ile de Sein.

Para Nelson Faria Marinho, presidente da Associação dos Familiares das Vítimas do Voo 447, a notícia é um alento para os que tentam superar o trauma da tragédia. ¿As famílias estão se sentindo mais confortadas porque agora finalmente vão ter os corpos para encerrar a vida, ter um lugar para visitar, chorar a morte de seus entes queridos¿, afirma. Segundo Marinho, apenas uma família alemã se manifestou contrária à retirada dos corpos do fundo do Oceano Atlântico.

De acordo com um comunicado expedido pela DGGN, o corpo retirado foi encontrado a uma profundidade de 3,9 mil metros, estava preso ao assento do avião e bastante deteriorado. O documento diz ainda que o resgate dos restos mortais está sendo realizado em condições complexas devido à possibilidade de haver deterioração dos pedaços por conta da mudança de temperatura e de pressão da água durante o içamento. ¿Grandes incertezas continuam existindo em relação às possibilidades técnicas de levar os corpos à superfície¿, informa o texto divulgado.

Ainda segundo a polícia francesa, pode ainda haver dificuldades técnicas para extrair o material genético dos ossos, etapa necessária para o procedimento de identificação das vítimas. Os familiares, no entanto, preferem não acreditar nessa hipótese. ¿Nós estamos tecnologicamente bem avançados em matéria de DNA. Até por um fio de cabelo é possível identificar a pessoa. Não há a menor dúvida de que ele será identificado¿, diz Nelson Faria Marinho.

Quatro especialistas do Instituto de Pesquisas Criminais (IRCGN, na sigla em francês) estão a bordo do navio Ile de Sein para coletar material dos restos mortais içados ontem. O que foi recolhido será encaminhado, com as caixas-pretas içadas nesta semana, para análise no laboratório da BEA, em Paris, na próxima semana. A expectativa é de que a retirada dos cadáveres dure cerca de um mês.

Certidão Apesar de ainda não haver certeza sobre a retirada dos outros corpos, o presidente da Associação de Familiares afirma que a ação deve ser garantida com ordens judiciais. ¿A própria legislação francesa ¿ e a nossa é igual ¿ diz que, quando se encontra um corpo, tem que retirar do local onde ele está¿, argumenta Marinho. O fim do processo é aguardado para que os familiares consigam também finalizar processos burocráticos sobre a morte dos entes queridos.

Nelson Faria lembra que o processo para requerer uma certidão de morte presumida, quando não há corpo, é lento no Brasil. ¿Demora de seis meses a dois anos e a maioria (das famílias) ainda não tem. Com o documento pode-se movimentar uma conta que ficou no banco, requerer aposentadoria, pensão, resolver as pendências para continuar a vida....¿, diz.

A base O navio que funciona como base na operação de resgate dos destroços e das vítimas do acidente saiu do porto de Dacar, no Senegal, no último dia 22. Ele está localizado 1,1 mil quilômetros da costa brasileira e carrega a bordo oito membros da Direção de Polícia Militar francesa, entre militares da Polícia de Transportes Aéreo e Marítimo e do Instituto de Pesquisas Criminais da Polícia Militar, especializado na identificação de vítimas de catástrofes.