Título: Medo afasta clientela
Autor: Alves, Renato
Fonte: Correio Braziliense, 26/05/2011, Cidades, p. 27

A analista de sistemas Patrícia Medova, 38 anos, planejou, há mais de um mês, a festa da filha em um barco. Imaginava que os amigos da criança, que completa 11 anos, se divertiriam muito ao passar uma tarde em uma embarcação no meio do Lago Paranoá. Metade do valor do bufê, assim como a confraternização para 30 meninos e meninas, no valor de R$ 1,2 mil, já estava pago desde abril. Mas os planos mudaram com o naufrágio do Imagination. No dia seguinte à tragédia, Patrícia e o marido, Paulo Mafine, decidiram cancelar o barco e optaram por uma festa convencional, em uma pizzaria. Tiveram sorte: apesar de o contrato informar o contrário, a empresa contratada topou devolver o dinheiro. ¿Nós confiamos no proprietário, mas não tinha mais clima. Nenhum pai autorizaria o próprio filho a ir. Eu não deixaria a minha ir se fosse outra festa¿, afirma Patrícia.

A decisão do casal é apenas um exemplo do que as empresas do setor vêm sentindo no bolso. A Netuno Serviços Náuticos teve 12 cancelamentos de programas para o fim deste mês e o próximo. Dos quatro previstos para o fim de semana, não sobrou nenhum. O prejuízo já passa de R$ 16 mil, fora o bufê, cobrado à parte. O dono do negócio, José Carlos Andrade, está preocupado. ¿O contabilista disse para mim: `Carlos, hora de tomar atitude, rever a quantidade de funcionários. Não tem mais passeios para cobrir as despesas ou os custos de manutenção¿, lembra o proprietário. Por mês, são gastos R$ 15 mil para manter os oito barcos da empresa em perfeito estado de segurança. ¿Eu tenho 12 funcionários e 15 anos de mercado. Em todo esse tempo, nunca tive nenhum acidente. Nem mesmo tive que usar o extintor de incêndio¿, diz.

Desafio O único evento que seria realizado durante a semana pelo barco Mar de Brasília não ocorreu ontem. O passeio ecológico com alunos de um colégio particular da capital foi cancelado em cima da hora. Nos fins de semana, são realizados tours para quem quer conhecer Brasília pela vista do lago. No último caso, não há cancelamentos, pois os passeios são abertos a todos que comparecem ao local de partida do barco. Mas a expectativa é que, no próximo mês, o movimento diminua.

O desafio das empresas agora é resgatar a confiança do brasiliense. ¿Num passeio que ainda conseguimos fazer na terça-feira, todos perguntaram pelo colete e fizeram questão de ouvir com atenção as instruções de segurança, o que não acontece sempre¿, lembra Inês Servioli, que trabalha com o marido no barco Netuno. ¿As embarcações são feitas para flutuar sempre. A gente precisa mostrar que o problema não é o barco, mas aquele barco¿, defende José Andrade, em referência ao Imagination.

Outra empresa que não recebe um centavo desde o acidente é a do barco Happy Day. Isso porque a embarcação está sendo usada pelo Corpo de Bombeiros, a Marinha e a Polícia Civil como base de apoio no resgate das vítimas do Imagination. ¿Eu vim para ajudar e acabei ficando para dar uma força¿, conta o dono, José Felipe João Júnior, que, além de não receber, está arcando com os custos dos funcionários e do diesel do gerador de energia. Um evento programado para o Happy Day para depois de amanhã ¿ uma reunião de fiéis de uma igreja ¿ está mantido.