Tudo constante, 2014 será o primeiro ano desde 2000 em que o país fechará com a balança comercial no vermelho. A Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) acaba de revisar sua projeção, de um superávit de US$ 600 milhões para um déficit de US$ 4 bilhões. O preço das matérias-primas está em queda, a tonelada do minério de ferro perdeu um terço do seu valor.
O boom das commodities está passando e o Brasil não se preparou para o tempo das vacas magras. A época em que o Brasil registrou seu maior superávit da história, 2006, com um saldo positivo de US$ 46 bilhões, ficou para trás. De lá para cá, o presidente da AEB, José Augusto de Castro, sempre alertou que o país estava surfando em um ciclo de alta dos preços das commodities, o que fez disparar a cotação de produtos como minério de ferro e soja. Nossa economia estava se beneficiando de um contexto favorável, mas que não seria eterno. Agora, o cenário começou a se reverter, com a retração nos preços.
— Sempre que os preços sobem, a produção também sobe, com uma defasagem, e os preços voltam a cair. É cíclico. Por isso, é importante fazer o dever de casa e melhorar a competitividade do exportador como um todo. Hoje, temos excesso de oferta para vários produtos, e a China está crescendo menos. Isso derruba os preços e afeta as exportações do Brasil — explicou Augusto de Castro.
A tonelada do minério de ferro exportada pelo país em novembro custava 33% a menos do que no final de 2013. A mesma coisa aconteceu com a soja, com retração de 16%, enquanto o farelo de soja caiu 20%. O açúcar ficou 7% mais barato e o milho, 12,7%. Já o café subiu 41% de preço, mas sozinho não consegue compensar a perda dos outros produtos.
Até a segunda semana de novembro, segundo o Ministério do Desenvolvimento, o saldo da balança comercial estava negativo em US$ 3,4 bilhões. O déficit é maior que o do mesmo período do ano passado, de US$ 1,8 bilhão. O que é pior neste quadro é que tanto as exportações estão em queda (-4,5%) quanto as importações (-3,4%), ou seja, nossa corrente de comércio está menor (-3,95%), e isso é mais um sinal de como o nível de atividade econômica está fraco. Não é a toa que se espera crescimento perto de zero do PIB este ano.
Nem toda retração de preços de matérias-primas é ruim. No caso do petróleo, que caiu 20% este ano, a notícia é boa, pelo menos enquanto a Petrobras não consegue se tornar exportadora líquida, algo que só deve acontecer a partir de 2016, segundo Castro. Os óleos combustíveis também caem de preço em 20%. O aumento da produção combinada com a queda nos preços fizeram o rombo da conta petróleo, no acumulado de janeiro a outubro, cair de US$ 21 bilhões para US$ 15 bi. Ainda assim, muito longe do superávit.
Olhando para 2015, a desvalorização do dólar pode ajudar o setor industrial, segundo Castro. O problema é que cerca de 50% das nossas exportações de manufaturados têm como destino países da América do Sul. Argentina e Venezuela estão com problemas cambiais. Chile, Peru e Uruguai também são exportadores de commodities e vão ter menos receita em dólares, assim como o Brasil.
— Com isso, os nossos principais parceiros do setor de manufatura na América do Sul podem adotar medidas de restrição de importações. Então é cedo para dizer que a indústria vai se beneficiar muito do real mais fraco — explicou Castro.
Esse déficit da balança comercial vem em má hora. O Brasil está com riscos de rebaixamento da qualidade da dívida, a Petrobras também pode ser rebaixada, o déficit em conta-corrente está perto de 4% do PIB. Precisamos de dólares entrando na economia, numa época em que o capital está ficando mais arisco.