A insatisfação com a ingerência política nos fundos de pensão e com os casos frequentes de investimentos malsucedidos levou funcionários das estatais a formar chapas para ocupar cadeiras nos conselhos deliberativos dessas entidades. O objetivo é tentar aumentar o poder de fiscalização sobre os gestores de seus patrimônios bilionários. Esse movimento começou no início deste ano, quando funcionários do Banco do Brasil, da Petrobras e da Caixa Econômica Federal elegeram conselheiros com posições críticas à direção dos três maiores fundos de pensão do país: Previ, dos empregados do BB; Petros, da Petrobras; e Funcef, da Caixa. Juntos, eles administram um patrimônio de mais de R$ 300 bilhões destinado ao pagamento de futuras aposentadorias complementares de funcionários das estatais que são suas patrocinadoras.

conselheiros também criarão fórum

Agora, esses conselheiros pretendem criar um fórum de participantes de vários fundos de pensão para trocar informações e experiências sobre como aumentar a fiscalização interna das fundações e promover mudanças nos estatutos para reduzir a influência das patrocinadoras, e, portanto, do governo. As primeiras reuniões deverão acontecer em janeiro de 2015.

Como O GLOBO informou ontem, participantes e funcionários dos fundos de pensão têm feito denúncias a órgãos de ingerência política nessas entidades a Polícia Federal, Ministério Público Federal e Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc). O Sindicato dos Empregados de Previdência Privada do Rio de Janeiro (Sindepperj) apelidou a suposta coordenação política de direcionamento de investimentos dos fundos de "Clube do Amém".

Na maioria dos fundos de pensão, a direção das estatais, influenciada pelo governo ou por partidos da base aliada, indica o mesmo número de conselheiros que os eleitos pelos participantes. No entanto, a patrocinadora exerce o controle de fato com a prerrogativa de indicar o presidente do conselho, que tem voto de desempate. Acontece que, em vários fundos, esse instrumento não era utilizado porque não se mostrava necessário. Conselheiros eleitos por funcionários que fazem parte de sindicatos ligados à Central Única dos Trabalhadores (CUT), braço sindical do PT, dedicam-se com afinco à eleição de conselheiros nos fundos de pensão. Uma vez no colegiado, passam a acompanhar o voto dos indicados pelas patrocinadoras.

Em maio deste ano, participantes da Previ e da Funcef venceram chapas de sindicalistas ligados ao PT e assumiram cadeiras no conselho deliberativo das entidades. São representantes de grupos de auditores de carreira do Banco do Brasil e da Caixa.

Na Petros, sindicalistas ligados à Associação dos Engenheiros da Petrobras e do Sindicato dos Petroleiros do Estado do Rio de Janeiro (Sindpetro-RJ) já haviam conquistado, em 2013, duas cadeiras fazendo oposição à Federação Única dos Trabalhadores (FUP), que tem um conselheiro eleito e vários dirigentes da fundação indicados pela Petrobras.

A influência política é maior nos fundos cujas regras de governança dão menos poder de decisão aos representantes dos participantes. Na Previ, por exemplo, os funcionários têm direito a eleger conselheiros e alguns diretores. Não há voto de qualidade da patrocinadora, mas os principais cargos seguem sendo indicados pela direção do Banco do Brasil, ligada ao PT, como os de diretor-presidente, diretor de Participações e diretor de Investimentos.

Previ teve lucro em 2013

Já na Petros, todos são eleitos pelo conselho deliberativo, onde a Petrobras tem o voto de desempate.

- A gente percebe que em vários negócios controversos a Petros está sempre com Postalis ou Funcef. A Previ quase não aparece - explica Silvio Sinedino, conselheiro eleito da Petros e um dos integrantes do grupo de participantes dos fundos de pensão.

Fundos com maior participação de pessoas independentes têm melhor resultado. Em 2013, um ano com rentabilidade baixa para todos os fundos por causa de problemas na economia, a Previ teve um superávit de R$ 24,7 bilhões. Já a Petros amargou déficit de R$ 2,2 bilhões.

Maria Inês Capelli, presidente da Associação dos Profissionais dos Correios (Adcap), acredita que a criação de uma rede de segurados de diferentes fundos pode aumentar a conscientização dos funcionários das estatais para participar da gestão dos fundos de pensão. Ela afirma que os participantes do Postalis, o fundo de pensão dos funcionários dos Correios, podem aprender muito com a experiência dos oposicionistas que venceram eleições nos conselhos de Previ, Funcef e Petros recentemente.

- Precisamos barrar o aparelhamento e a ação de sindicalistas que não estão defendendo o interesse dos funcionários. É a nossa aposentadoria que está em jogo - diz Maria Inês, que também integra o grupo que está formando a rede de segurados.

Reunidos em São Paulo no dia 12 de novembro, membros de Adcap, Funcef, Previ, Petros e da Associação Nacional dos Auditores Internos da Caixa Econômica Federal (Audicaixa), que estão à frente da criação do fórum, lançaram um manifesto com as principais diretrizes de trabalho, preocupados com os "destinos dos fundos de pensão" e tendo em vista o que chamaram de "ameaças no contexto atual". Foram definidas quatro frentes de trabalho: concentrar esforços para incentivar a união de atividades para proteger os interesses dos membros dos fundos; traçar estratégias comuns na política de investimentos; participação ativa nas discussões sobre mecanismos regulatórios que afetem os associados; e aumento da participação na governança dos fundos, pondo à disposição o maior número de informações aos participantes do fórum.

 

 

Previ, fundo do BB, diz que tem gestão autônoma

 

Fundações Petros e Funcef também negaram influência política na tomada de decisões

 

Os fundos Petros (Petrobras), Funcef (Caixa) e Previ (Banco do Brasil) negam sofrer influência política na escolha de seus administradores ou na tomada de decisões sobre investimentos. Em carta enviada ontem ao GLOBO, a Previ afirmou que "o processo decisório, inclusive de investimentos, é norteado por uma política elaborada pela diretoria de Planejamento, cujo diretor é eleito pelos participantes, e pautado por análises técnicas". De acordo com a Previ, a diretoria de Administração também é eleita pelos funcionários, e a estrutura interna da entidade garante "autonomia e independência em sua gestão". O modelo de governança paritário da Previ vem sendo aprimorado desde 1998, informou a fundação.

A Funcef disse ter "um modelo de governança referência, com paridade em todos os colegiados, onde tanto a patrocinadora quanto os participantes indicam ou elegem seus representantes". Já a Petros disse que seus investimentos "são totalmente independentes e não sofrem qualquer influência externa", e que todos os seus investimentos "passam por análises técnicas internas".

 

Oposição se mobiliza em comissão do Senado para investigar atuação do 'Clube do Amém'

Aparelhamento político leva instituições a investirem recursos em negócios suspeitos

Simone Iglesias

O "Clube do Amém" entrou na mira da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado. Amanhã, o líder do PSDB, senador Aloysio Nunes Ferreira (SP), cobrará agendamento de audiência pública com a presidente da Associação Nacional dos Participantes de Fundos de Pensão, Cláudia Ricaldoni, e com Carlos de Paul, da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc). Conforme revelado ontem pelo GLOBO, há um esquema de aparelhamento político na gestão dos fundos de pensão das estatais, apelidado de "Clube do Amém", que leva essas instituições a investirem os recursos em negócios suspeitos.

O tucano apresentou requerimento para as entidades irem ao Senado esclarecer denúncias de gestão fraudulenta de recursos do fundo de pensão Postalis, dos funcionários dos Correios.

- A agenda da comissão está carregada, mas vamos ter que apressar a aprovação desse requerimento e agendar a audiência pública para este ano ainda. Essas novas denúncias mostram que não há limites para o PT. Não se trata mais de fatos isolados, mas de um Modus operandi de um partido que resolveu fundar seu poder na corrupção como estratégia de ocupação - disse Aloysio Nunes.

Os partidos de oposição se reunirão amanhã para analisar o que mais pode ser feito para que se investigue os investimentos temerários que vêm sendo feitos pelos fundos de pensão. Segundo o líder do DEM, senador José Agripino Maia (RN), a pauta da CPMI da Petrobras está congestionada e, mesmo que sejam apresentados requerimentos para apurar as denúncias, a tendência é que nem cheguem a ser apreciados, já que os trabalhos da comissão deverão se encerrar dia 22 de dezembro. Por isso, avaliou, a discussão deverá se iniciar na CAE e ser levada, em 2015, a uma nova CPI.

- Esse é um caso clássico da máxima "onde há fumaça, há fogo". Há anos, muito antes de o PT chegar ao governo, circulam indícios de aplicação incorreta dos recursos e de manipulação na gestão dos fundos por petistas - afirmou o senador do DEM.

As denúncias de irregularidades partiram da Associação dos Aposentados e Pensionistas do Serpros e pela Associação Nacional dos Participantes de Fundos de Pensão à Previc no ano passado. Segundo as entidades, há "uma possível articulação entre os fundos para a realização de aplicações nem sempre de acordo com os interesses dos participantes". As associações alegam que as aplicações feitas pelos gestores levaram à perda de recursos.