A escolha de Joaquim Levy para o Ministério de Fazenda tem o poder de alimentar esperanças entre empresas e mercado, tanto que a bolsa subiu com a notícia, depois adiada. Levy tem excelente reputação, desempenhou com eficiência os cargos que ocupou, mas está sendo montada uma equipe heterogênea e não ficou claro se ele terá poder. Aliás, nada ficou claro.
Essa trapalhada de anuncia e depois adia o anúncio passou a ideia de improviso e instabilidade, mas o mercado está demandando tanto otimismo que concluiu que é só uma questão de tempo para se confirmar como ministro o economista Joaquim Levy. Em um segundo momento, as outras questões, óbvias, serão consideradas, mas ontem foi dia de a bolsa comemorar mesmo sem a confirmação oficial.
O maior desafio de Levy será conviver com tanta gente que pensa bem diferente dele. Ele terá que começar escolhendo alguém de peso e competência para o cargo que já ocupou. A Secretaria do Tesouro está em grave crise de credibilidade pela desastrada atuação do atual secretário, Arno Augustin. Ainda não está afastada a ameaça de que Augustin permaneça no governo, e os dois não são compatíveis, para dizer o mínimo. Augustin foi preterido por Palocci, em 2003, em favor de Joaquim Levy. No Palácio, haverá também em posição de poder outra pessoa da qual Levy já discordou muito no passado: o ministro-chefe da Casa Civil, e economista, Aloizio Mercadante.
Será preciso pôr um fim imediato às alquimias fiscais, o que deixará claro o grau de deterioração nas contas públicas. Em um debate público, em 2003, logo no início do governo Lula, o então presidente do BNDES Carlos Lessa defendeu a mudança na Lei de Responsabilidade Fiscal e o então todo poderoso ministro José Dirceu disse que o governo cumpria a lei, mas não se conformava com o seu rigor. Levy respondeu que não havia motivos para mudanças na lei e que ela havia mostrado “eficácia e flexibilidade”.
Nelson Barbosa se preparou para o cargo de ministro desde que saiu do governo após 10 anos trabalhando com Guido Mantega, ora no Planejamento, ora na Fazenda. Na Fundação Getúlio Vargas, ele continuou sendo interlocutor frequente de pessoas do governo. A operação de sua saída foi vista como preparação para voltar ministro, mas da Fazenda. Nas conversas e entrevistas, ele passou a se distanciar de algumas posições de Guido Mantega. Disse numa entrevista para mim em fevereiro deste ano que não havia mais espaço fiscal para desonerações porque o país estava com dificuldades nas contas. As desonerações continuaram e ontem o governo anunciou a micrometa de superávit de R$ 10 bilhões. No começo do ano, a meta era de R$ 116 bilhões.
O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, fica mais forte com um ministro da Fazenda mais fiscalista, porque isso retira o peso que está hoje todo em cima da política monetária. Mas se houver um grande conflito em torno do aperto nas contas públicas, Joaquim Levy brigará sozinho.
Em artigo publicado recentemente com o título “Robustez fiscal e qualidade do gasto como ferramentas do crescimento”, Joaquim Levy defendeu teses que são consideradas heréticas no atual governo, como: mudar o foco da dívida líquida para a dívida bruta; adotar um primário de 2,1% do PIB sem truques para reduzir a dívida pública a 50% até 2018; entrar para a OCDE; moderar transferências e subsídios, inclusive para empresas; parcimônia no uso das desonerações; explicitar a trajetória para o gasto corrente do governo.
Há três cenários: ou ele muda e se adapta; ou ele dura pouco no cargo; ou o governo muda. A terceira é a mais improvável.