A desigualdade no Brasil não aparece apenas entre os municípios ou entre os diferentes estados, mas também em áreas muito próximas dentro de uma mesma região metropolitana, aponta levantamento com base no Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), divulgado ontem pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O cálculo é feito a partir de três indicadores: educação, longevidade e renda. No Rio de Janeiro, a região da Praia de Icaraí tem o maior IDH (0,962), acima de bairros tradicionais da capital, como Leblon (0,944) e Ipanema (0,937). O IDH varia entre zero e um: quanto mais perto de um, melhor é a condição de vida.

O pior IDH no Rio está no município de Japeri, na Baixada Fluminense, – a menos de 90 quilômetros de Icaraí – com várias localidades com o índice mais baixo da região (0,591), como Colinas, Santo Antônio, Santa Amélia e o Complexo Penitenciário de Japeri.

O estudo mostra que houve queda na desigualdade entre 16 das principais regiões metropolitanas do Brasil no período de 2000 a 2010, assim como na distância que separa bairros ricos e pobres nessas áreas. Ainda assim, a Região Metropolitana de Recife é a que tem a maior diferença entre as áreas com pior e melhor condições de vida. O bairro nobre de Espinheiro ostenta 0,955, enquanto na área rural de Ipojuca/Nossa Senhora do Ó e Camela o IDH é de 0,523. A lista é seguida por Manaus, Natal e Curitiba. O Rio de Janeiro, por sua vez, ocupa a nona posição no ranking da desigualdade dentro das metrópoles. Essa diferença é menor nas regiões metropolitanas de Cuiabá, em Mato Grosso.

- As desigualdades se reproduzem em todos os níveis, de espaço, de educação, de saneamento, de infraestrutura. E isso tem a ver também com o fato de que o gasto público é maior nas regiões com mais riqueza, isso reforça a concentração – afirma Flavio Comim, da UFRGS e da Universidade de Cambridge.

Em 2010, em uma mesma região metropolitana, a renda per capita podia variar até 47 vezes de um bairro ou município para outro, como em Manaus. E a expectativa de vida, 14 anos, como em Recife e Manaus. Já o percentual da população de 18 anos ou mais com ensino fundamental completo oscilava entre 21% e 95% (Curitiba).

São Paulo é líder

Na comparação entre 2000 e 2010, São Paulo continuou sendo a região de mais alto IDHM (0,794 na escala até 1), mas o intervalo que a separava de Manaus (0,720), a última colocada, diminuiu quase pela metade. E a metrópole paulista tem as cinco localidades com maior IDH do Brasil. Todas as 16 regiões metropolitanas avaliadas atingiram o patamar de alto desenvolvimento humano, antes restrito à capital paulista e municípios vizinhos.

O estudo reúne indicadores de 9.825 Unidades de Desenvolvimento Humano (UDHs), áreas que podem corresponder a um bairro ou simplesmente a um limitado número de ruas, bem como a um município inteiro, no caso das cidades pequenas.

Para o ministro-chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, Marcelo Neri, o levantamento mostra avanços, como a redução das desigualdades não só entre as 16 regiões metropolitanas analisadas, mas também dentro delas, entre os municípios e bairros que as compõem.

- O atlas mostra que há grandes disparidades, mas essas disparidades têm caído ao longo do tempo. O Brasil teve uma transformação profunda – disse Neri.

Na Região Metropolitana do Rio, Icaraí já ocupava o primeiro lugar da lista de melhores IDHs do Rio em 2000. Para a professora de Economia Brasileira da Universidade Federal Fluminense (UFF) Hildete Pereira, isso se deve ao fato de o bairro concentrar um grande número de pessoas de classe média à alta, ter um índice de escolaridade alta e, como consequência, renda mais elevada.

- Diferentemente de bairros de classe alta do Rio, Icaraí não tem favelas na vizinhança. Já no caso de Japeri, a situação é homogênea. Assim, algumas localidades aparecem no extremo da lista – explicou Hildete Pereira.

Na região do Complexo Penitenciário de Japeri, a falta de saneamento básico é a principal reclamação da população, seguida da falta de pavimentação. O bairro concentra diversos esgotos a céu aberto e os moradores sofrem ainda mais em dias de chuva. Na última semana, dez cobras de cerca de 50 centímetros foram encontradas no quintal de Maria das Graças Souza, de 41 anos.

- Nós convivemos com doença de pele sempre. Feridas que vão aumentando se a gente não tiver cuidado – afirma a dona de casa, que tem seis filhos.

O governador Luiz Fernando Pezão afirmou ontem que o governo já vem atuando para levar desenvolvimento para Japeri: o município conta com os mesmos incentivos fiscais de Queimados, com amplo distrito industrial, e está em estudo a promoção de incentivos fiscais, associados à abertura do Arco Metropolitano.