Um relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), divulgado ontem pela manhã, em Genebra, revelou que a taxa de homicídios teve uma queda de 16% em todo o mundo entre 2000 e 2012. No entanto, na contramão da redução global do registro de assassinatos, o Brasil lidera o ranking em números absolutos. De acordo com os cálculos da entidade, mais de 64 mil homicídios ocorreram no país em 2012 — índices superiores aos de nações como Índia, Colômbia e México. Em todo o mundo, foram contabilizados 475 mil assassinatos. Em termos per capita, a taxa brasileira representa cinco vezes mais que a média internacional. O Relatório Mundial sobre a Prevenção da Violência 2014 é o primeiro documento do tipo a avaliar também os esforços no combate à violência interpessoal. 

Segundo o estudo realizado em conjunto pela Organização Mundial da Saúde (OMS), pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e pelo Escritório da ONU sobre Drogas e Crimes (UNODC), somente um terço dos 133 países pesquisados estão implementando iniciativas, em larga escala, para coibir a violência, o que inclui medidas de prevenção de assédio moral, visitas de enfermeiros a famílias em situação de risco e apoio aos cuidadores de pessoas idosas. Ainda de acordo com a pesquisa, em apenas metade dessas nações as entidades identificaram serviços de proteção e de apoio às vítimas no local onde o abuso foi praticado. 

“As consequências da violência contra as famílias e contra as comunidades são profundas e podem resultar em problemas de saúde ao longo da vida para as pessoas afetadas”, lamentou a diretora-geral da OMS, Margaret Chan. “No entanto, nós sabemos o que funciona para prevenir a violência em nossas casas, escolas e locais de trabalho e em nossas ruas e parques infantis. Devemos ter inspiração de governos que têm demonstrado sucesso na redução da violência, ao tomarem as medidas necessárias. Eles nos mostraram que, de fato, a violência pode ser evitada”, concluiu.

Na avaliação das agências das Nações Unidas, pouco mais da metade dos 133 países estudados têm buscado reforçar a legislação, apesar de 80% deles terem aprovado leis no sentido de prevenir a violência. “O relatório faz o balanço de medidas que os países estão tomando para responder à violência interpessoal, mas o estudo também revela lacunas na prevenção da violência global, as quais devem ser preenchidas, como a qualidade e o alcance dos programas de prevenção, o acesso a serviços para as vítimas, particularmente para mulheres e meninas — desproporcionalmente afetadas pela violência —, bem como a aplicação das leis existentes”, explicou Helen Clark, gestora do Pnud.

Porte de armas
Embora tenha liderado o ranking de 2012 da OMS em números absolutos de homicídios, o Brasil é destacado pelo relatório como um país de leis abrangentes contra maus-tratos a crianças e a idosos, mas que necessita combater, de maneira mais eficaz, a violência sexual e o porte de armas nas escolas. As estatísticas publicadas pela ONU são superiores às fornecidas pela polícia brasileira, segundo as quais pouco mais de 47 mil assassinatos ocorreram naquele ano. Com 32,4 homicídios para cada 100 mil habitantes, o país não é considerado o mais violento do mundo em termos de mortes per capita. O posto é ocupado por Honduras, que ostenta um índice de quase 104.

Em entrevista por telefone ao Correio, o médico Alex Butchart, coordenador da OMS para Prevenção da Violência, afirmou que “o Brasil não ocupa o posto de mais violento do mundo, de maneira alguma, apesar de estar entre os primeiros”. “Nós acreditamos que, em países em desenvolvimento, as medidas para prevenir a violência não são completadas por iniciativas de cunho social”, disse. Apesar de o país ter se dedicado à redução da pobreza durante a última década, Butchart explicou que há outros fatores por trás do alto índice de homicídios registrado em 2012. “O acesso a armas de fogo, por exemplo.” Consultado pela reportagem, o Ministério das Relações Exteriores não retornou o pedido para comentar as estatísticas divulgadas pela ONU.