A última década foi de melhoria no acesso aos bens para todos os lares brasileiros, inclusive para aqueles com algum tipo de insegurança para ter comida na mesa. Entre os domicílios que tiveram restrições alimentares mais graves, 93,5% tinham fogão, percentual próximo aos 99,1% registrados entre aqueles sem nenhum risco de passar fome. O mesmo valia para a posse de geladeira: 85,8% dos vulneráveis tinham o aparelho contra 98,3% dos que estão em segurança alimentar. Em 88,4% das casas dos que estão em insegurança há TV, contra 97,8% dos lares dos que não têm problema de acesso a alimentos.

Mas, se esses eletrodomésticos são quase onipresentes nos lares do país, o mesmo não ocorre com o acesso a serviços básicos, como água encanada e coleta de esgoto. Em 2013, 63,2% dos domicílios em segurança alimentar tinham coleta de esgoto, quase o dobro do registrado nos lares em insegurança grave. O acesso à coleta de lixo era de 92% no primeiro grupo e de 75,2% no segundo.

Produtos usados

Para especialistas, não há contrassenso no aumento de posse de bens, mesmo entre as famílias mais vulneráveis à fome. Wasmália Bivar, presidente do IBGE, destaca que os itens adquiridos não são necessariamente novos, o que ajuda a explicar a alta.

- O que a população faz quando compra um novo computador ou uma nova televisão? Normalmente não se joga fora, se doa para alguém mais pobre - afirmou Wasmália.

Sonia Rocha, especialista em pobreza e desigualdade do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), lembra também que os bens podem ter sido adquiridos em período em que o domicílio tinha mais dinheiro. Ela ressalta que as famílias têm dois grandes gastos: transportes e alimentos.

- Como transporte é uma despesa rígida, a alimentação é onde as famílias ajustam.

Menos água potável

As exceções na posse de bens domésticos ocorreram entre itens como máquina de lavar, presente em 64,5% dos lares com segurança alimentar, mas em apenas 21,8% daqueles com insegurança grave. O acesso a computador com internet também era desigual, variando de 48,2% a 10%.

Na comparação com 2009, houve redução do índice de acesso à água encanada nos lares com todos os graus de insegurança alimentar. O percentual mais baixo foi registrado nos domicílios com maior nível de restrição, 73,6%, contra 87,2% nos sem risco de fome.

Segundo o IBGE, a queda no acesso a serviços nos lares mais precários não significa, necessariamente, piora.

- O que pode ter acontecido é que justamente aqueles que deixaram a insegurança alimentar são aqueles que tiveram mais acesso a esse tipo de serviço - explicou Wasmália.

Para Paulo Jannuzzi, secretário de avaliação e gestão da informação do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), o desafio é atuar junto aos grupos mais vulneráveis:

- O MDS tem tido uma ação de busca ativa. Procuramos identificar a população quilombola, os ribeirinhos, os povos da floresta, cadastrando essa população. É uma estratégia que tem que persistir.