Título: Sem formalidades em Brasília
Autor: Pariz, Tiago
Fonte: Correio Braziliense, 03/07/2011, Política, p. 2

Quando presidente, Itamar deixava a escolta de lado para dirigir pelas ruas da cidade. Ao assumir o mandato de senador, em 2010, frequentava shoppings e gostava de ler no apartamento da 109 Sul

Nos últimos meses, o senador Itamar Franco (PPS-MG) saía pouco de casa, onde ficava vendo televisão, principalmente partidas de futebol, ou lendo. Poucas vezes deixava seu apartamento, na 109 Sul para passear em shoppings da cidade. Isso ocorreu logo nos primeiros dias de mandato, quando foi a uma loja comprar uma televisão, como contou em uma entrevista ao Correio, em fevereiro passado. Mas sua relação com Brasília sempre foi mais intensa, inclusive quando exerceu a Presidência da República, a ponto de andar sem seguranças e dirigindo seu próprio carro pelas ruas da cidade.

"Ele tinha afinidades com Brasília desde que foi senador pela primeira vez (1982-1990). Ele conhecia muito a cidade", relata o senador Pedro Simon (PMDB-RS), que foi líder do governo no Congresso, quando Itamar ocupou o Palácio do Planalto. "Já na Presidência da República existia muita cobrança e ele não podia passear muito", acrescenta Simon, na época um dos políticos mais próximos de Itamar. A amizade dos dois nasceu ainda na década de 1970. Depois de vários anos, os dois voltaram a se encontrar este ano no plenário do Senado.

Em uma entrevista exclusiva concedida ao Correio em 21 de fevereiro passado, Itamar contou que tinha ido ao Conjunto Nacional para comprar uma televisão para seu apartamento, localizado na 109 Sul. Sua presença na loja atraiu a atenção de todos e até foi um motivo de aposta entre os vendedores. Um achava que era o ex-presidente, enquanto que o outro achava o contrário. Ao ser indagado, o senador respondeu que sim, era ele o ex-presidente. O interlocutor ganhara a aposta, de R$ 20. "Você ganhou. Então vai lá, pega o seu dinheiro e me dá R$ 10 de desconto", brincou Itamar com o trabalhador.

Itamar deixou o cargo com aproximadamente 80% de popularidade, um dos motivos que fez com que uma pequena multidão se reunisse ao seu redor para tirar fotografias, durante sua passagem pelo shopping. Mas não foi o único local por onde ele passou ao chegar novamente ao Senado. Poucos dias depois da posse, foi à Feira dos Importados, onde também provocou um grande movimento de admiradores e curiosos. Amigos afirmaram que o senador estava animado com a volta à Brasília, onde passou a parte mais importante de sua vida política.

Quando presidente, Itamar muitas vezes andava sem ou com poucos seguranças. "Eu tinha pouca segurança. Veja quanta segurança os presidentes da República têm e quanta eu tive", afirmou o senador no programa Roda Viva, da TV Cultura, em 8 de maio de 2006. Na época, o político recordou que ia a cinemas, por exemplo. Mas não era só. Algumas vezes, ele fazia passeios em um Fusca branco, pertencente a uma namorada da época.

Como chefe da Nação, além de cinemas, chegou a ir em feiras de livros, shoppings e a visitar amigos, sempre acompanhado por poucos assessores próximos. Aos domingos, o então presidente costuma deixar o Palácio da Alvorada à tarde para cruzar para o Lago Sul, onde tomava café com a assessora, a professora Ruth Hargreaves, irmã de Henrique Hargreaves, seu então chefe da Casa Civil.

Cidadão comum Ele sempre se manteve distante das formalidades obrigatórias da maior autoridade brasileira e algumas vezes se comportava como cidadão comum, conduzindo o rito do exercício do cargo sem grandes formalidades. Certa vez, já como chefe da Nação, foi a um dos cinemas de Brasília, entrou na fila e comprou seu próprio ingresso, para desespero dos seguranças. "O presidente da República não pode se acostumar com seus palácios, porque ele vai sofrer. É o que eu sempre me permiti dizer: eu fiquei no Alvorada, no Jaburu, no Mangabeiras ¿ sede do governo de Minas Gerais ¿, e eu saí de lá como um cidadão comum", disse. Além dos palácios, em Brasília o político mineiro teve como endereço ¿ ainda como senador ¿ a mesma quadra em que mora hoje.

Nem mesmo nos palácios em que morou e trabalhava em Brasília ele tinha formalidades. O contato com os jornalistas era quase diário, nem que fosse para conversar sobre amenidades em seu gabinete, no terceiro andar do Palácio do Planalto. Uma das primeiras providências ao chegar ao local foi abrir as cortinas das janelas, de onde podia ver grande parte de Brasília, a cidade em que gostava de morar.